Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 14 de dezembro de 2014

O Bolsa Família, o Bolsa Empresário e o Bolsa Banqueiro

Domingo, 14 de dezembro de 2014
Em 2013, gastamos em torno de R$24,5 bilhões com o Bolsa Família; R$24 bilhões com o Bolsa Empresário; R$55 bilhões com o Bolsa Banqueiro — Reserva; e R$712 bilhões com o Bolsa Banqueiro — Serviço da Dívida.


A seguir trechos do excelente artigo 'O Bolsa Família, o Bolsa Empresário e o Bolsa Banqueiro', texto por Aldemário Araujo Castro*
 O “Bolsa Família”, considerado o maior programa de transferência de renda com condicionalidades em operação no mundo, ganhou enorme destaque nas eleições presidenciais de 2014. O programa foi alvo de discussão em praticamente todos os aspectos relevantes. Entre outros, foram abordados os seguintes temas, invariavelmente de forma apaixonada ou incisiva: a) quantidade de beneficiários; b) volume de recursos empregados; c) evolução ou crescimento dos beneficiários; d) distribuição geográfica dos beneficiários; e) condicionalidades envolvidas e f) relação entre o programa e os resultados eleitorais.

Qual a razão para tanto “barulho” em torno do “Bolsa Família”? Acredito que consciente, ou inconscientemente, as classes médias tradicionais reconhecem que são os principais financiadores, pelo caminho da tributação, dos escândalos de corrupção e dos vários mecanismos de transferência de renda para os segmentos mais necessitados (“Bolsa Família”, programas habitacionais, aposentadoria rural, etc). A "conta" deveria ser paga pelas abonadas elites socioeconômicas. Entretanto, esses segmentos privilegiados da sociedade sabem defender seus interesses e o aumento das suas rendas e de suas “bolsas” (de sua "fatia no bolo"). Sobra, literalmente sobra, para as classes médias tradicionais e para o conjunto dos assalariados/consumidores.

Qual, por outro lado, a razão para a ocultação midiática (quase total) das outras “bolsas”? Creio que a grande mídia, com nível de concentração econômica praticamente sem paralelo no mundo, deliberadamente esconde as “bolsas” dos ricos e explora de forma vil a “bolsa” dos pobres. Assim, a iníqua estrutura de mídia em vigor no Brasil contribui, como é sua “missão”, para sustentar uma das sociedades mais desiguais e excludentes do planeta.

Portanto, para além do modelo socioeconômico vigente no Brasil e no mundo, de produção coletiva e apropriação privada de riquezas, com níveis maiores ou menores de selvageria, convivemos com a “captura” de “espaços” públicos e governamentais para garantir os interesses mais mesquinhos de determinados setores dominantes e privilegiados pela via de mecanismos institucionais em várias áreas (economia, tributação, finanças públicas, prestação de serviços públicos, ocupação do espaço urbano, etc) (8). As três últimas “bolsas” aludidas (“empresário” e “banqueiro”, em suas duas modalidades) estão claramente inseridas nesse perverso contexto.

Somente a educação política em larga escala e a mobilização crescente da juventude, dos trabalhadores e das classes populares e médias consequentes poderão construir um ambiente propício ao desmonte dessas aberrações institucionais. A concretização de uma sociedade livre, justa e solidária, preconizada até no texto da Constituição de 1988 (9), não cairá do céu e nem será uma concessão simples e fácil das elites socioeconômicas. Transformações profundas de nossa perversa realidade social serão resultados de muito esforço e muita luta. Nessa caminhada, será preciso arregaçar as mangas e “apurar” os neurônios.
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*Aldemário Araujo Castro é Mestre em Direito, Procurador da Fazenda Nacional, Professor da Universidade Católica de Brasília e Conselheiro Federal da Ordem dos Advogados do Brasil