Terça, 9 de junho de 2015
Do Jornal do
Brasil
Desembargador
saiu da coordenação da Comissão da Infância e Juventude. Ato acontece na quinta
O afastamento do desembargador Siro Darlan do cargo de
coordenador da Comissão Judiciária de Articulação das Varas da Infância e
Juventude e Idoso pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), anunciado
no dia 4 de junho, repercutiu negativamente entre
autoridades do setor e políticos. Nas redes sociais, circula uma convocação
para um ato público marcado para esta quinta-feira (11), em frente ao TJ-RJ.
Vários organismos sociais já confirmaram participação no "Somos todos Siro
Darlan".
O desembargador foi afastado através de uma carta, enviada
pelo presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), Luiz Fernando
de Carvalho. Na carta, o presidente alegou incompatibilidade com a
administração do TJ e abordou as críticas feitas por Darlan em seu Facebook
pessoal a respeito do auxílio-educação para magistrados.
Em sua página no Facebook, o deputado federal Chico Alencar
(Psol-RJ) escreveu um texto dizendo que o desligamento do desembargador
"parece estar orientado por visão corporativista, do ponto de vista da categoria, e penalista, na
linha conceitual". "Além disso", prosseguiu,
"'recomendação' está longe de ser 'interferência no trabalho dos juízes'.
O Judiciário continua a ser um poder fortemente verticalizado. A propalada
'incompatibilidade com a orientação, pensamento e filosofia de trabalho da
administração do TJ' deveria ser mais bem explicitada". O texto termina
com uma frase expressando solidariedade a Siro.
O deputado federal Jean Wyllys (Psol-RJ) destacou o prestígio e reconhecimento
"por decisões e ações justas, pautadas nos direitos humanos, em casos
em que a dignidade humana de crianças e adolescentes estava ou esteve ameaçada
ou violada. Sua atuação nesse sentido é incontestável. E é isso que esperamos
de um juiz".
Wyllys comentou também as críticas ao auxílio-educação para
filhos de magistrados feitas pelo desembargador em sua página pessoal no
Facebook: "Lamento que o Tribunal de Justiça do Rio Janeiro tenha deixado
de lado todo esse trabalho e decidido afastar o desembargador por razões
políticas e por ele ter publicado uma crítica justa a um excesso do poder
judiciário".
A deputada federal Jandira Feghali (PCdoB-RJ) lamentou o
afastamento. "Ele tem um posicionamento muito claro contra a redução da
maioridade penal", comentou. "Lamento muito a saída de Siro
Darlan. Ele se posicionou publicamente, se expôs. O Tribunal de justiça alegou
divergências administrativas mas acredito que haja outros motivos por trás".
Na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), parlamentares já
manifestaram indignação e buscam caminho para tentar reverter o quadro. Para o
deputado Marcelo Freixo (Psol), Siro Darlan não foi afastado em função de
alguma atitude frente à coordenação. Para ele, o magistrado é referência
nacional em relação a este trabalho. "Quem perde é a sociedade, espero que
a gente consiga reverter esta situação. Siro apoiou o próprio presidente do
Tribunal de Justiça, que me parece uma pessoa sensata. As divergências acontecem,
entendo, cada Casa tem a sua dinâmica política, sua personalidade. Sei que as
divergências foram públicas, mas acho que o papel que o Siro desenvolve ali
deveria gerar um diálogo maior", destaca Freixo. O parlamentar já procurou
a presidência do TJ? e agendou um encontro para o final deste mês para tratar
do assunto. "Vou conversar com ele [presidente do TJ] sobre uma
reconsideração, o diálogo sempre pode reverter qualquer quadro. Tive no contato
com o presidente do TJ uma impressão de uma pessoa muito sensata. Ele foi
apoiado por várias pessoas que tenho como referência na Justiça, inclusive pelo
Siro Darlan", disse.
Desembargador Siro Darlan
Wadih Damous, presidente da Comissão da Verdade do Rio
e da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal da OAB, encara a
situação como uma perda para a causa em que atua: "Tenho uma profunda
admiração pelo desembargador. Acho que perdem, com o afastamento dele das
funções que vinha desempenhando, os segmentos de Direitos Humanos, os quais ele
sempre prestigiou, como no caso desses garotos adolescentes, que hoje são alvo
de uma ira de segmentos da sociedade brasileira. Se perde muito com o
afastamento dele."
O vereador Leonel Brizola Neto (PDT), membro da
Comissão dos Direitos da Criança e Juventude da Câmara, está articulando na
Câmara Municipal um movimento em favor ao desembargador, na intenção de chamar
a atenção do TJ para rever a decisão. "Vamos entregar [o documento ao
Tribunal de Justiça] ainda antes do ato popular que está marcado para a
quinta-feira. Pelo menos no campo progressista, devemos ter mais apoio",
adiantou o vereador. Para Brizola, quem mais perde com a decisão do TJ é a
sociedade.
"Quem perde mais é quem perde um defensor da criança e
do adolescente, justamente a cidade do Rio de Janeiro e, principalmente, a
criança e o adolescente. O histórico de serviço prestado por Siro Darlan à
nação em prol da luta pela melhoria da qualidade de vida destes adolescente é
uma coisa maravilhosa. Acho um descalabro, uma falta de sensibilidade da
Justiça o promover este ato que, para mim, é político. No momento em que o país
está discutindo esta questão da redução da maioridade penal, ele é uma pessoa
importantíssima para esclarecer a população que não precisamos punir, mas
educar. Era a figura chave para comunicar à população, através da Justiça, que
o ECA [Estatuto da Criança e do Adolescente] já prevê restrições de liberdade.
A pessoa não conhece o que é o ECA. É um dos estatuto mais evoluídos no mundo,
de proteção, direito e até de restrições da liberdade da criança e
adolescente", diz Brizola.
Outras iniciativas na Casa tomaram força desde a semana
passada. O vereador Jefferson Moura (Psol), da Comissão de Direitos Humanos,
foi o autor de uma Moção de Solidariedade votada em sessão e que deve ser
entregue ao desembargador em um ato organizado por várias entidades do
setor, agendado para o dia 13 de junho.
"Todos nós ficamos negativamente surpresos [com o
afastamento do desembargador do cargo no TJ]. O desembargador Siro Darlan tem
uma trajetória de vida no judiciário brasileiro em defesa da criança e do
adolescente. Como magistrado, no serviço publico, é exemplar. Como
militantes na área dos direitos humanos, nos preocupa que esse afastamento
possa prejudicar um trabalho tão necessário neste momento, que se discute a
redução da maioridade penal. Foi uma surpresa desagradável o afastamento dele.
Inclusive, na semana passada nós votamos aqui na Câmara, por iniciativa da
Comissão de Direitos Humanos, uma Moção de Solidariedade, que vai ser entregue
a ele em um ato com a participação de várias entidades do setor, no próximo dia
13. Ele é um aliado e um exemplo, não só na defesa das crianças e adolescentes,
mas também dos direitos humanos. No que depender da gente, o tribunal deve
rever esta decisão. Se não é uma perseguição política, o tribunal, a presidência
poderiam rever esta decisão, independentemente de ter uma visão ou mesmo de
criticar o desembargador. Não se pode penalizar a sua atividade profissional.
Isso é ruim para a cidade, para o estado do Rio, para a Justiça", afirma o
parlamentar.
A notícia foi recebida com surpresa pelo Instituto de
Defensores de Direitos Humanos (DDH), associação civil que desenvolve programas
de promoção e defesa dos direitos humanos, econômicos, sociais e culturais, e
que tem atuado, por exemplo, no caso dos manifestantes presos no Rio de
Janeiro. Italo Pires Aguiar, advogado do DDH, destacou a trajetória
profissional de Siro Darlan, chamando a atenção para a dificuldade que o
Tribunal de Justiça deve enfrentar agora, para encontrar jurista de igual
dedicação e bagagem intelectual acerca dos direitos da criança e do
adolescente.
"Quando ele foi colocado nessa função pelo atual
presidente, não só o Instituto de Defensores de Direitos Humanos, mas toda a
sociedade civil envolvida com a defesa dos direitos de crianças e adolescentes
comemorou bastante. Então, a gente vê com surpresa e com lamento esse
afastamento, ainda mais porque ele tem um histórico intelectual importante,
defende posições super progressistas, contrárias à internação massiva de
adolescentes, por exemplo, e vinha externalizando isso", disse o advogado.
"Perde o sistema socioeducativo e perde a sociedade fluminense."
No campo das políticas sociais, entidades importantes já se
manifestaram a favor do retorno de Darlan para a coordenadoria. "O Doutor
Siro Darlan é a pessoa mais preparada e capaz para tratar temas tão delicados e
tão sensíveis. A forma como ele foi afastado chocou a todos nós",
ressaltou o coordenador-executivo do AfroReggae,José Junior?
O Cofundador e Diretor Executivo do Crescer e Viver, escola
especializada em arte circense e transformação social, Junior Perim, também
lamenta o afastamento do desembargador. "Como alguém que vem atuando
na perspectiva dos direitos da criança e do adolescente no Rio de Janeiro, na
trajetória da organização que eu tenho origem, a gente tem no Siro Darlan uma
referência e uma inspiração do magistrado que sempre buscou reconhecer a ação
social empreendida pelo sujeito na sociedade na promoção e garantia dos
direitos da criança e adolescente. Tem impressa na trajetória dele um
compromisso com a aplicação do estatuto, com o princípio do melhor interesse
para a criança, para a juventude brasileira. É sem dúvida um magistrado
brasileiro mais respeitado neste campo do Direito. É uma perda simbólica para
todo mundo que atua na perspectiva de promover espaços, portas e programas para
assegurar a condição da infância no papel de depositária do futuro do Brasil. A
gente lamenta muito e deseja que o presidente do Tribunal de Justiça possa
reconsiderar esta decisão e quem sabe até promover um diálogo com quem faz
ações para a infância. Ele vai entender a importância do Dr. Siro e a sua
significação para o nosso trabalho. É chato ver uma noticia como esta para a
sociedade brasileira, um passo atrás antes de garantir tudo aquilo que está
proposto no estatuto da criança, um passo atrás para encarcerar a infância e a
adolescência brasileira. Então, para nós, é uma derrota muito grande, mas a
esperança não morre. Quem sabe se o presidente do Tribunal de Justiça, lá do
seu elevado do espírito público, possa considerar para o bem da sociedade
brasileira a volta do Dr. Siro e anular esta decisão. Quando era juiz da
Infância, Siro Darlan foi o grande incentivador que a gente levantasse o Circo
Viver em uma área pública e produtiva. Dez anos depois de desenvolver ali um
programa social, a gente consolidou esta metodologia e se converteu em uma das
mais importantes escolas de circo brasileiro, que tem desde o primeiro passo o
apoio e carinho do Dr. Siro Darlan", diz Perim.
Membros de uma entidade que trabalha com grande sintonia com
as Varas da Infância e Juventude, o Conselho Tutelar, interpretam a saída de
Darlan da coordenadoria como um "retrocesso". O conselheiro Edmilson
Ventura, da unidade de São Gonçalo, ainda tem esperança de a Justiça rever a
decisão, o que para ele vai beneficiar toda a sociedade.
"Mais uma vez a gente retrocede. Nós temos o estatuto
da criança e do adolescente. E é unânime dizer que é uma das leis mais
avançadas do mundo. E o desembargador, podemos dizer, é um capítulo dentro
desta história, porque ele ajudou nesta confecção, desta lei, ele participou
disto de uma forma bem ativa. E ele, por um acaso, é um militante destes
direitos humanos, crianças e adolescentes, dentro do judiciário, não desmerecendo
os outros. Além de militante, ele é um especialista, um profundo conhecedor.
Levar esta matéria para lá é tudo que a gente queria, ter um representante no
judiciário. Para entender melhor o problema da sociedade brasileira, vamos
colocar que temos, historicamente, com relação à criança, mulher e idoso, a
consciência de que temos furos adequados a cada um destes segmentos, exatamente
porque a nossa cultura é contrária a estes segmentos. Criamos a Vara da Criança
e Adolescente, do idoso, e a Vara da Mulher, em função disso. Você tem lá um
desembargador que tem a coragem e experiência, que dentro de um ambiente
diferenciado, se destaca dos demais. O desembargador Siro Darlan é sensível ao
avaliar que a rua não produz adolescente, quando eles estão em estado de
vulnerabilidade nas ruas, é porque falhou a família, está falhando o estado e
vai falhar a sociedade, porque vai assumir um papel que é o seu, que é o de
julgar e condenar". avalia o conselheiro.
O delegado Orlando Zaconne, da Polícia Civil do Rio de
Janeiro, doutor em Ciência Política e autor do livro ‘Indignos de vida: a forma
jurídica da política de extermínio de inimigos na cidade do Rio de
Janeiro’ destaca que Siro Darlan tem um carreira diretamente ligada à Vara
da Infância e Juventude e sempre se dedicou a estas causas. "Ele tem um
acúmulo de conhecimento e de comprometimento. A sua saída desta função de
coordenador, com este histórico, por todos que conhecem o trabalho que há
décadas vem sendo desenvolvido pelo desembargador junto às Varas da Infância e
Juventude, é uma grande perda. Uma perda para a sociedade", considera
Zaconne.
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