Da Tribuna da Imprensa
Sebastião Nery
Palácio das
Laranjeiras, Rio, meia-noite de 31 de março de 1964. De Minas continuavam
chegando as notícias das tropas do general Mourão Filho para derrubar o
presidente João Goulart. Cercado de ministros e amigos, Jango dava telefonemas,
conferenciava com militares e civis. E o nervosismo, de minuto a minuto, ia
tomando conta do palácio.
De repente, o
indefectível general Assis Brasil, chefe da Casa Militar, que até há pouco
dizia ser invencível o esquema militar do governo, aconselhou o Presidente a
abandonar o palácio, por não oferecer segurança. A resistência devia ser
dirigida de um local mais garantido.
TENÓRIO
Tenório Cavalcanti,
que estava lá em solidariedade a Jango, soube do conselho de Assis Brasil,
correu a seu gabinete:
– General, o senhor
não disse há pouco ao senador Barros de Carvalho que o esquema militar do
governo está tinindo?
– Disse, sim,
deputado. E está.
– Por que então o
senhor sugeriu que o Presidente saia daqui do Laranjeiras?
– Porque aqui ele não
terá muita segurança.
– Nada disso,
general, o que o senhor está dizendo é uma loucura. Não há lugar mais seguro do
que este. O palácio é uma verdadeira fortaleza, dominando a colina, acessível
apenas por um dos flancos, através de uma estreita garganta inexpugnável. O
Presidente não deve sair daqui.
Parecia que o general
era Tenório, que logo passou a dar ordens, aos gritos, como se estivesse em sua
fortaleza de Caxias:
– Sargento, coloque
um grupo ali. Capitão, instale um ninho de metralhadoras ali embaixo. E os
fuzis, onde estão os fuzis? Tragam fuzis!
Ao meio-dia do dia
seguinte, Jango abandonou o palácio. Não acreditava nem nas teorias de Assis
Brasil nem na prática de Tenório.
DILMA
História puxa
historia. Em 1974, o escândalo Watergate (escuta ilegal na sede do
oposicionista Partido Democrata, em Washington) levou o presidente dos EUA,
Richard Nixon, a renunciar. O seu vice, Spiro Agnew, já havia sido afastado por
envolvimento com a corrupção. Constitucionalmente coube ao deputado Gerald
Ford, presidente da Câmara, assumir a Casa Branca, no pleno exercício do poder.
Sua administração de
dois anos foi marcada por incompetência e tempos tempestuosos. Foi quando o
jornal “New York Times” reabilitou expressão popular em desuso há muitos anos,
na realidade política e administrativa dos norte-americanos: “lame duck”. O
presidente Ford seria um “pato manco”, à frente de um governo impotente e
ineficaz.
Na manhã deste
domingo, no palácio da Alvorada, a presidente Dilma começou zombando das
manifestações. Pensou que iriam ficar restritas à matinal e domingueira praia
de Copacabana:
– Não há foco. Falta
foco.
Daí a pouco, a
arrogante e desastrada Presidente percebeu que havia foco, sim. E no pais
inteiro. Milhões nas ruas, de Manaus a Porto Alegre. O foco era ela, o foco
dela, o governo dela, o PT dela, o Lula dela, o desastre.
Só em São Paulo muito
mais de um milhão. O povo já fez o impeachment dela. Com que cara a pata manca
vai aparecer para governar?
MARTA
O lúcido professor
Milton Lahuerta, coordenador do Laboratório de Política e Governo da
Universidade Estadual Paulista, adverte:
– “Em grande parte
isso se deve ao ex-presidente Lula, que incentivou essa polarização do se
apresentar como aquele que estava inaugurando uma nova era, uma transformação
social que, em quatro séculos não havia ocorrido. Como se fosse possível
traduzir toda a luta pela democracia no País a um personagem e a um partido
político. Agora estamos vivendo algo muito grave”.
Outra voz sabia é a
da brilhante e brava ex-ministra Marta Suplicy:
– “O que está em jogo
é a governabilidade, a sobrevivência do pais. Não há como continuar com uma
equipe de governo que se distanciou, quase rompeu com o Congresso e que, por
seus vícios sectários e métodos excludentes, estabeleceu verdadeira ruptura com
a vida nacional. Se não podemos trocar de comandante em pleno voo de
turbulências, o mínimo que podemos exigir é a troca imediata da equipe de
comando. A começar pelo copiloto, responsável maior pela desastrada rota de
voo”.