Quarta, 18 de maio de 2016
De http://zh.clicrbs.com.br
Além do petista, foram considerados culpados Renato Duque, João Vaccari Neto e outros nove envolvidos em esquema de corrupção
Por:
Dirceu está preso desde 3 de agosto do ano passado
Foto:
Heuler Andrey / AFP
José Dirceu de Oliveira e Silva, o Zé Dirceu,
um dos mais carismáticos líderes da história da esquerda brasileira,
corre o risco de passar a velhice atrás das grades. Aos 70 anos de
idade, ele acaba de ser condenado à prisão, a segunda vez em uma
década. Desta vez, uma pena altíssima para os padrões brasileiros: 23
anos, pelos crimes de corrupção passiva e ativa, lavagem de dinheiro e
organização criminosa.
Ex-líder
estudantil, ex-guerrilheiro com treinamento em Cuba (onde fez plástica
para evitar reconhecimento), ex-deputado federal, ex-ministro da Casa
Civil e ex-presidente do Partido dos Trabalhadores (que ele ajudou a
fundar, nos Anos 80), Dirceu está preso desde 3 de agosto do ano
passado. Ele cumpre prisão preventiva no Complexo Médico-Penal de
Pinhais, no Paraná, e lá deve permanecer, agora para cumprir a pena a
que foi sentenciado.
A condenação foi ordenada pelo juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, que julga casos da Operação Lava-Jato
(voltada para desvios de dinheiro na Petrobras). Dirceu foi preso após a
constatação de que movimentou, dentro da sua empresa JD Consultoria, R$
71,4 milhões desde 2007, quantia em parte não justificada. Naquele ano
ele já estava denunciado no processo do mensalão (pelo qual o governo
federal pagava parlamentares para ganhar apoio em determinadas
votações). As movimentações irregulares aconteceram mesmo após o
ex-ministro ter sido condenado naquele episódio, em 2012, fato
ressaltado como "grave" pelo juiz Moro.
Na sentença proferida
nesta quarta-feira, Moro diz que Dirceu usou laranjas para realizar
operações ilegais, inclusive após a realização das primeiras fases da
Lava-Jato. O Ministério Público Federal (MPF) responsabiliza José Dirceu
por 31 atos de corrupção passiva entre 2004 e 2011. Foram decretados
também o sequestro de imóveis e o bloqueio de contas bancárias dele.
A
condenação tem como base a delação do lobista Milton Pascowitch, que
afirma ter usado sua firma, a Jamp, para intermediar pagamentos à JD,
empresa de consultoria do ex-ministro Dirceu e do irmão dele, Luis
Eduardo. As transferências somaram quase R$ 1,5 milhão entre os anos
2011 e 2012. Parte desse dinheiro seria propina ao PT e ao ex-ministro,
conforme o delator. O processo aponta que Dirceu teria ficado rico
mediante irregularidades em contratos com empresas terceirizadas,
contratadas pela diretoria de Serviços da Petrobras, que pagavam uma
prestação mensal para Dirceu através de Pascowitch.
Dirceu é
acusado de receber propinas da Petrobrás em cinco diferentes projetos da
empreiteira Engevix com a estatal. O ex-ministro também teria recebido
propinas das empresas Hope e Personal, prestadoras de serviços da
Petrobras, além da empresa Multitek. Na denúncia, o procurador da
República Roberson Pozzobon afirmou que foi Dirceu quem efetivamente
apadrinhou o ex-diretor de Serviços da Petrobrás Renato Duque, dentro da
cota do PT, no esquema de cartel e corrupção na estatal.
Delcídio delatou esquema
Dirceu
também é investigado por outros episódios que ainda não viraram
processo judicial. Na colaboração premiada à Justiça Federal, o senador
Delcídio Amaral (PT) diz que partiu de Dirceu a pressão para que o
pecuarista José Carlos Bumlai (amigo do ex-presidente Luiz Inácio Lula
da Silva) fosse beneficiado com um empréstimo de R$ 12 milhões. O
financiamento foi feito pelo banco Schahin e teria sido usado por Bumlai
para quitar dívidas do PT.
Na versão de Delcídio, porém, os R$ 12
milhões teriam sido usados para pagar pelo silêncio de um empresário,
Ronan Maria Pinto. O executivo, ligado ao setor de transportes, estaria
chantageando a cúpula petista com a ameaça de delatar fatos relativos a
uma "caixinha" paga pelo empresariado para socorrer as finanças do
partido e também episódios envolvendo o assassinato do prefeito de Santo
André (SP), Celso Daniel. Ronan também está preso pela Lava-Jato.
Teria
partido de José Dirceu e de Delúbio Soares (então tesoureiro nacional
do PT) a ordem para a triangulação envolvendo os R$ 12 milhões
emprestados pelo Banco Schain a Bumlai. Em troca, o grupo Schahin banco e
empresas de engenharia, petróleo e gás) teria vencido concorrência para
administrar a sonda petrolífera Vitória 10.000, alugada pela Petrobras.
Investigação no Peru
Dirceu
é investigado, ainda, no Exterior. Para a Fiscalía Especializada
Anticorrupción do Peru, o equivalente naquele país à Procuradoria-Geral
da República no Brasil, Dirceu é suspeito de intermediar repasses de
dinheiro de empreiteiras brasileiras para integrantes do governo Alan
García, que presidiu o Peru entre 2006 e 2011. É também apurado se o
esquema teria se prolongado até o atual governo, de Ollanta Humala.
Conforme
a agenda do ex-presidente Alan García — à qual Zero Hora teve acesso — e
também rastreamento de voos, Dirceu realizou cinco viagens ao
território peruano entre 2007 e 2011. Em 23 de janeiro de 2007, início
do governo de García, o ex-ministro brasileiro foi recebido em palácio
pelo então presidente peruano.
Dirceu atuava como lobista das
empreiteiras Engevix e OAS, ambas envolvidas no desvio de dinheiro de
contratos da Petrobras. O interesse das empresas era conquistar projetos
no Peru e, para isso, firmou contrato com o ex-ministro. Ele, por sua
vez, fez repasses de dinheiro periódicos por meio da JD Consultoria
(empresa pertencente a Dirceu) para uma conhecida sua no Peru, a
brasileira Zaida Sisson, casada com um ex-ministro de Alan García.
Conforme declarações de um dos delatores da Lava-Jato, o lobista Milton
Pascowitch, Zaida trabalhava para Dirceu na tentativa de obter contratos
para a Engevix e para a Galvão Engenharia no Peru.
José Dirceu
foi ministro da Casa Civil no primeiro governo de Luiz Inácio Lula da
Silva (entre 2003-2006). Era, também, deputado federal eleito pelo PT em
São Paulo. Enfrentou longo processo por compra de votos no Congresso,
em ação para favorecer projetos governamentais, conhecida como mensalão.
Foi condenado como mentor do esquema de compra de parlamentares para
formar a base governista e preso no dia 15 de novembro de 2013. Após
trabalhar de dia em um escritório de advocacia e pernoitar no presídio,
foi liberado para cumprir o resto da pena em casa, em outubro de 2014.
Acabou preso novamente em agosto de 2015, dessa vez pela Lava-Jato.
Desde então, ocupa uma cela em prisão próxima a Curitiba.
Veja as penas atribuídas aos réus condenados na decisão de Moro:
Gerson de Mello Almada - condenado pelos crimes de corrupção e de lavagem. As penas somadas chegam a 15 anos e seis meses de reclusão
Renato de Souza Duque - condenado pelos cinco crimes de corrupção, a pena é de 10 anos de reclusão
Pedro José Barusco Filho - condenado por cinco crimes de corrupção, a pena de nove anos de reclusão fica suspensa pelo acordo de delação premiada
João Vaccari Neto - condenado por cinco crimes de corrupção, as penas somam nove anos de reclusão
Milton Pascowitch -
condenado pelos crimes de corrupção, lavagem e pertinência à
organização criminosa, há concurso material, as penas somadas de 20 anos
e 10 meses de reclusão fica suspensa pelo acordo de delação premiada
José Adolfo Pascowitch -
condenado pelos crimes de corrupção, lavagem e pertinência à
organização criminosa, as penas somadas chegam a 19 anos de reclusão,
mas ficam suspensas pelo acordo de delação premiada
José Dirceu
- condenado pelos crimes de corrupção, de lavagem e de pertinência à
organização criminosa, as penas somadas chegam a 23 anos e três meses de
reclusão
Fernando Antônio Hourneaux de Moura - condenado
pelos crimes de corrupção, lavagem e pertinência à organização
criminosa, as penas somadas chegam a 16 anos e dois meses de reclusão.
Luiz Eduardo de Oliveira e Silva
- irmão de José Dirceu, foi condenado pelos crimes de lavagem e de
pertinência à organização criminosa. As penas somadas chegam a oito anos
e nove meses de reclusão
Júlio Cesar dos Santos - ex-sócio
da JD Assessoria e Consultoria, empresa utilizada para recebimento das
propinas, foi condenado pelos crimes de lavagem e de pertinência à
organização criminosa. As penas somadas chegam a oito anos de reclusão
Roberto Marques
- apontado como espécie de secretário, motorista ou pessoa de confiança
de José Dirceu, foi condenado por cinco crimes de corrupção. A soma da
pena é de oito anos de reclusão