Do MPDF
Substitutivo
aprovado na Câmara permite que delegados decidam sobre o deferimento de
medidas protetivas de urgência após o registro de ocorrência, o que é
inconstitucional
Há dez anos o Brasil ganhou uma lei exemplar no combate à violência doméstica: a Lei Maria da Penha. A luta foi árdua para afirmar a sua constitucionalidade e, agora, na primeira proposta de alteração, o Ministério Público, o Judiciário e a Defensoria temem a inclusão de artigo que fere a Constituição Federal e que não constava no projeto original da Câmara dos Deputados – PL 36/2015. A proposta inicial, que é bem-vinda, dispõe sobre o direito da vítima de violência doméstica de ter atendimento policial e pericial especializado, ininterrupto e prestado, preferencialmente, por servidores do sexo feminino.
Em 29 de março, foi aprovado no plenário
da Câmara dos Deputados o substitutivo adotado pela Comissão de
Seguridade Social e Família daquela casa, que incluiu no projeto de lei a
permissão para que os delegados de polícia decidam sobre o deferimento
de medidas protetivas de urgência após o registro de ocorrência
policial. A justificativa seria a lentidão do Judiciário. Agora, a
proposta está na pauta de votação da Comissão de Constituição, Justiça e
Cidadania do Senado Federal.
“Pelo que se vê, há ofensa ao princípio
da tripartição dos Poderes, visto que se atribui à autoridade policial
poder decisório de apreciação de lesão ou ameaça de lesão a direito, com
relativização da estrutura constitucional do Estado Democrático de
Direito tripartite. Acresce-nos frisar que a autoridade policial está
condicionada à estrutura do Executivo. É o mesmo que atribuir, em casos
emergenciais, a iniciativa de legislar aos magistrados, de forma
irrestrita e ampla”, trecho de nota técnica publicada pela Associação
dos Magistrados Brasileiros (AMB) sobre a inconstitucionalidade do PL
36/2015.
A Associação Nacional dos Membros do
Ministério Público (Conamp) também se manifestou contrária à inclusão do
artigo 12-B na Lei Maria da Penha. Inclusive, na nota, reforça que a
mudança foi incluída no texto sem qualquer debate com as instituições do
sistema da Justiça quanto à juridicidade e à pertinência do tema.
“Não é constitucional que a restrição de
direitos fundamentais sensíveis seja transferida da esfera judicial
para a esfera policial, ao argumento simplório de que supostamente o
Poder Judiciário seria lento ou omisso em suas decisões. As medidas
protetivas de urgência são uma grave ingerência nos direitos
fundamentais do investigado. Implicam em restrição ao direito de
locomoção do investigado, como a proibição de aproximação dos familiares
da vítima e a proibição de frequentar determinados lugares. Inclusive,
pode importar na supressão do direito de visita regulamentado por
decisão judicial, criando a situação absurda de um despacho policial
revogar decisão judicial”, reforça a nota da Conamp.