Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

COZINHA BAIANA —Conheça o arroz de hauçá: prato que carrega histórias, axé e pertencimento

Segunda, 21 de fevereiro de 2022

Angélica Moreira aprende as receitas nas pesquisas e ouvindo as mais velhas. - Angélica Moreira

Quem explica é a chef Angélica Moreira, autora do livro "Memórias da Cozinha Ancestral"

Gabriela Amorim
Brasil de Fato | Lençóis (BA)
11 de Fevereiro de 2022

A chef Angélica Moreira do restaurante Ajeum da Diáspora ensina a fazer o arroz de hauçá, comida da diáspora africana muito comum em Salvador. Angélica é pesquisadora da etnogastronomia da diáspora africana e autora do livro Memórias da Cozinha Ancestral. “Eu pesquiso muitas receitas, e também costumo ouvir muito as minhas mais velhas na hora de cozinhar”, conta.

Ela nos conta que o arroz de hauçá é um prato ligado à história das pessoas negras na Bahia. Os hauçás são uma etnia que habita até os dias de hoje a região da Nigéria, muitas pessoas desse grupo de negros islamizados foram trazidas escravizadas para cá. Os hauçás fizeram parte também da Revolta dos Malês, embora fossem de grupos islâmicos diferentes, estavam presentes no levante de escravizados que tomou as ruas de Salvador em 1835.

Em seu livro, Angélica traz as receitas como se conversasse conosco, contando uma história. E é assim que ela nos explica também como fazer o arroz de hauçá: “E esse prato leva arroz, é claro, um arroz de coco, feito empapado, com açúcar, um pouco adocicado. Aí vem uma carne seca frita no entorno. Depois vem cebolas também esbranquiçadas e, por cima, um camarão fresco ou seco. Eu faço geralmente com camarão fresco, tipo uma moqueca. Os hauçás geralmente não comiam azeite, porque eram islâmicos. Mas teve esse toque baiano, né?! O prato terminou ganhando esse azeite por cima”, explica a chef.

Angélica conta ainda que essa é uma receita que está presente em diversos livros históricos. “É um prato muito delicioso, cheio de história, de sabor, de beleza. Um prato que Manoel Quirino cita em seus livros. É um prato que Ana Maria Gonçalves cita em Um defeito de cor. Um prato das mulheres ganhadeiras do século XIX, citado pela professora Cecília Soares no livro dela. Então, é um prato cheio de histórias, memórias, axé, pertencimento!”. A chef e pesquisadora diz também que essa é uma comida que exemplifica bem diáspora de África, pois traz consigo memória, afeto e resistência.

Edição: Elen Carvalho