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quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

Relator do Pacote do Veneno recebeu R$ 380 mil de 10 empresários do agro na campanha de 2018

Quinta, 10 de fevereiro de 2022

PL DOS AGROTÓXICOS
Relator do Pacote do Veneno recebeu R$ 380 mil de 10 empresários do agro na campanha de 2018

Um dos maiores entusiastas do projeto na Câmara, Luiz Nishimori teve todas as doações vindas de figuras do agronegócio

Paulo Motoryn
Brasil de Fato | Brasília (DF)
10 de Fevereiro de 2022

Luiz Nishimori, do mesmo partido de Jair Bolsonaro, foi “patrocinado” por ruralistas - Agência Câmara

O deputado federal Luiz Nishimori (PL-PR), relator do chamado “Pacote do Veneno” (Projeto de Lei 6299/2002), recebeu R$ 380 mil de empresários e executivos do agronegócio na campanha que o levou à Câmara dos Deputados, em 2018. O PL pretende flexibilizar ainda mais o uso de agrotóxicos no país.

Todas as dez doações individuais recebidas por Nishimori na campanha eleitoral foram realizadas por figuras ligadas ao setor. A informação foi extraída pelo Brasil de Fato no DivulgaCand Contas, plataforma do Tribunal Superior Eleitoral, sendo cruzada pela reportagem com informações públicas.


As doações ocorreram dentro da lei e foram registradas na Justiça Eleitoral. A maior delas, de R$ 80 mil, foi feita por Anildo Kurek, sócio da FTS Sementes e da Elaine Agropecuária. Outros cinco empresários do agro doaram R$ 50 mil, e quatro pagaram R$ 25 mil à campanha do deputado federal.

Nishimori ainda recebeu outros R$ 2 milhões da Direção Nacional de seu partido, o PR. Depois, a sigla mudou de nome para PL e passou a abrigar o presidente Jair Bolsonaro.

O Brasil de Fato enviou e-mail ao gabinete do deputado às 19h10 desta quarta (9) para verificar se o projeto de lei aprovado nesta quarta-feira na Câmara é apoiado por seus financiadores e se ele considera que existe algum conflito de interesses por ter sido relator da matéria.

A resposta indicou um número de telefone para contato com a assessoria de imprensa de Nishimori. O contato, no entanto, pertencia a outra pessoa. Indagado novamente na manhã desta quinta (10), o gabinete admitiu o erro e enviou novo telefone para contato. Às 10h, a reportagem fez novo contato e aguarda retorno da equipe do deputado. Assim que houver resposta, ela será adicionada à reportagem.

Doações para a campanha do relator do Pacote do Veneno, o deputado Luiz Nishimori (PL-PR) / Arte/Brasil de Fato - Fonte: Transparência.CC, DivulgaCand Contas (Tribunal Superior Eleitoral) e Receita Federal do Brasil • Consultado em 9 de fevereiro de 2021

Votação na Câmara

Um pedido de urgência, em que Nishimori é um dos signatários, e o texto-base do projeto foram aprovados na noite desta quarta-feira (9) na Câmara. Agora, a pauta vai ao Senado. O avanço da pauta se soma ao cenário preocupante em que mais de 2 mil agrotóxicos já foram liberados nos últimos quatro anos, durante a gestão de Jair Bolsonaro, um recorde negativo para a saúde humana e para o meio ambiente.

O projeto original foi apresentado em 2002 pelo então senador Blairo Maggi, que depois chegou a ser ministro da Agricultura do governo Michel Temer (MDB). Nishimori diz que a lei dos agrotóxicos está “ultrapassada”. O projeto é apoiado pela Frente Parlamentar Agropecuária, da qual ele é um dos membros.


Nishimori vendeu agrotóxicos no Paraná

No final da última legislatura da Câmara dos Deputados, em julho de 2018, o portal De Olho Nos Ruralistas mostrou que Nishimori vendeu durante anos pesticidas em Maringá, Marialva e Luiziana, no noroeste do Paraná. Na ocasião, ele já relatava o PL do Veneno.

A reportagem apontou que o deputado já foi presidente da Mariagro Agrícola Ltda. Outra empresa, a Nishimori Agrícola, está em nome de dois filhos seus. O Tribunal de Justiça do Paraná considerou, em 2015, que as empresas da família pertencem ao mesmo grupo.


Agricultor desde 1970

O próprio Nishimori informa, em seu perfil no Facebook, que é agricultor desde 1970. Ele conta ter constituído a Mariagro naquela época, com 21 anos. Depois, com a Sementes Nishimori, atou na produção de sementes de soja e trigo.

“Eu usei DDT, Parathion e BHC“, recordou-se, durante uma das audiências na comissão que avalia o PL do Veneno, em maio de 2016. “Eu sou dessa época, eu usava. Antigamente, passavam BCH para matar piolho!”

A Mariagro foi uma das fundadoras da Associação dos Distribuidores de Insumos e Tecnologia Agropecuária (Adita), em 1999. O objetivo do grupo de empresários do noroeste paranaense era recolher as embalagens vazias de agrotóxicos. Hoje está presente em 83 municípios.

O que propõe o Pacote do Veneno?

Confira as principais mudanças, caso o PL 6299, o Pacote do Veneno, seja aprovado também no Senado Federal:

- “Agrotóxico” passará a se chamar “pesticida”, na tentativa de mascarar e encobrir a nocividade amplamente conhecida dessas substâncias;

- A avaliação de novos agrotóxicos deixará de considerar os impactos à saúde e ao meio ambiente, ficando sujeita apenas ao Ministério da Agricultura e aos interesses econômicos do agronegócio;

- Será admitida a possibilidade de registro de substâncias comprovadamente cancerígenas; serão estabelecidos níveis aceitáveis para isso, embora não existam níveis seguros para substâncias que se demonstrem cancerígenas;

- A regulação específica sobre propaganda de agrotóxicos irá acabar;

- Será permitida a venda de alguns agrotóxicos sem receituário agronômico e de forma preventiva, favorecendo ainda mais o uso indiscriminado;

- Estados e municípios enfrentarão dificuldades para ter medidas mais restritivas, embora essas esferas tenham o dever de proteger seu patrimônio natural.

Edição: Rodrigo Durão Coelho