Terça, 13 de dezembro de 2011
João Gilberto - Samba de uma nota só
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Do STJ
O cantor e compositor João Gilberto, ícone
da Bossa Nova, receberá indenização por violação ao direito moral do
autor, em razão do CD intitulado “O Mito”, lançado pela EMI sem a
autorização do músico. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) baseou-se em
provas periciais constantes dos autos, e reconhecidas pela Justiça
estadual, para entender que as canções originais de três discos gravados
em vinil sofreram modificação substancial de apresentação após terem
sido remasterizadas.
A Terceira Turma, por maioria, seguiu o
voto do relator, ministro Sidnei Beneti, que atendeu em parte o recurso
de João Gilberto interposto contra a EMI e uma empresa comercializadora
de CDs. As instâncias ordinárias da Justiça já haviam reconhecido o
direito do músico ao ressarcimento dos danos materiais – royalties de
18% sobre as vendas dos CDs referidos.
Com a decisão da Terceira
Turma de reconhecer a violação ao direito moral, esse percentual será
acrescido de um terço. Ficou mantido, também, o pagamento dos valores
recebidos pela gravadora pelo uso de obra de João Gilberto em campanha
publicitária sem a sua autorização. Os valores serão fixados em
liquidação de sentença.
O ministro Beneti observou que, quando reproduzidas as obras no CD, não havia mais contrato vigente entre o autor e a gravadora, e não houve autorização para uso das obras antes cedidas. “Os direitos morais do autor se comparam ao direito de paternidade da obra, criando-se vínculo indissolúvel entre ela e o criador”, afirmou.
Perícia técnica
O ministro Beneti observou que, quando reproduzidas as obras no CD, não havia mais contrato vigente entre o autor e a gravadora, e não houve autorização para uso das obras antes cedidas. “Os direitos morais do autor se comparam ao direito de paternidade da obra, criando-se vínculo indissolúvel entre ela e o criador”, afirmou.
Perícia técnica
A
remasterização constitui um processo eletrônico para conferir perfeição
ao áudio. Os novos equipamentos podem fazer correção, alteração e
complementação na música tratada. O efeito, em princípio, é de simples
reedição e, em geral, não causa violação da obra. No entanto, a
modificação pode ocorrer no processo.
O ministro Beneti, em um
extenso e detalhado voto, afirmou ser direito moral do autor,
inalienável e passível de indenização, recusar modificações em sua obra
independentemente de esta vir a receber láureas. A EMI alegava que o
dano não teria ocorrido porque o CD “O Mito” recebeu premiações
internacionais, o que atestaria sua qualidade.
No entanto, laudo
do perito que atuou no processo, o músico Paulo Jobim, filho do maestro
Antônio Carlos Jobim, detectou que, em razão da remasterização, “a obra
perdeu transparência nas frequências médias e as reverberações agudas
se tornam muito evidentes, atrapalhando a audição”. O acórdão do
Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) reconheceu a ocorrência das
mudanças na obra, mas não a caracterização do dano em decorrência
delas.
A partir disso, o ministro Beneti concluiu que não houve
dano moral comum, mas houve ofensa ao direito moral do autor. Para ele,
não importa que a obra tenha excelência aos olhos de muitos, inclusive
de parte da crítica especializada. “Houve alteração da obra e ofensa à
sua identidade”, observou. Se a reprodução foi diferente, o ser
reproduzido não foi idêntico nos discos originais e no remasterizado,
afirmou o ministro.
O ministro Massami Uyeda foi o único a
discordar. Para ele, embora haja nos autos prova pericial que comprove a
alteração na qualidade musical, apenas quem é expert capta a
mudança. A população não é suscetível às falhas, daí porque não haveria
dano a ser reparado. A ministra Nancy Andrighi e os ministros Paulo de
Tarso Sanseverino e Villas Bôas Cueva acompanharam o relator.
Em
outro ponto reivindicado por João Gilberto, a Turma concluiu que seria
inviável recolher os exemplares de CDs já produzidos e comercializados
com ofensa ao direito de autor, porque esses teriam sido objeto de ampla
circulação. Igualmente, não foi reconhecida a responsabilidade
solidária da empresa que comercializou os CDs com violação ao direito do
autor, por falta de indicação suficiente de fatos e fundamentos
jurídicos contra ela.
Histórico
O
recurso foi movido por João Gilberto contra a EMI Music Ltda. e a loja
Gramophone Discos, Vídeo e Computador Ltda. por utilização e
comercialização indevida, respectivamente, de parte da sua obra.
Inicialmente,
João Gilberto ajuizou uma ação ordinária porque, a partir do ano de
1988, a EMI lançou CDs com a obra do músico sem sua autorização. Essa
obra se compõe de três LPs e um compacto de vinil gravados entre os anos
de 1958 e 1962, período em que o músico manteve contratos de locação de
serviços com a empresa.
Em 1963, o artista notificou a EMI de
que não haveria renovação do contrato, e a empresa manifestou-se
informando que o contrato tinha vigência até 1964. Apesar da
comunicação, a gravadora continuou a lançar suas obras e realizar os
pagamentos até o ano de 1988, data em que houve a rescisão do ajuste de
forma verbal e bilateral.
A defesa do músico alegou, ainda, que a
empresa, de forma indevida, autorizou a utilização da obra musical
“Coisa Mais Linda” em uma propaganda comercial.
O juízo de
primeiro grau julgou a ação improcedente em relação à Gramophone, mera
comercializadora, e parcialmente procedente em relação à EMI,
condenando-a ao pagamento dos valores recebidos com a utilização da obra
musical em uma propaganda, bem como royalties (compensação ou parte do
lucro pago ao detentor de um direito qualquer) de 18% sobre as vendas
dos CDs.
As partes apelaram ao TJRJ, que negou provimento aos
recursos e manteve a sentença de primeiro grau. Apenas o autor recorreu
ao STJ.