Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O livro, a pressão, a cortina

Quarta, 14 de dezembro de 2011 
Por Ivan de Carvalho
Ontem à tarde, ao cumprimentar um colega que acabava de emergir da Internet, onde dera uma atenta olhada em sites e blogs, recebi como resposta uma observação neutra, mas enfática, no tom de certeza proporcionado pelas coisas óbvias: “Isso é cortina de fumaça. Cortina de fumaça, mesmo”.

            E logo explicou que se referia ao grande barulho que se está fazendo na Internet sobre o livro do jornalista Amaury Ribeiro Jr., A Privataria Tucana. Uma cortina de fumaça, segundo explicou o colega, “para encobrir as denúncias contra ministros, principalmente o Pimentel”. 

           Você acha?” – ainda perguntei eu, ingênua e experimentalmente, pois até aquela hora de ontem não acessara a Internet, nem lera jornais. Não acho, tenho certeza, veja você mesmo. Dei uma rápida olhada em três ou quatro sites ou blogs. Logo depois, peguei a Tribuna da Bahia, página 2, editada na noite de segunda-feira, e lá estava uma frase em destaque: “Patrulha – Impressionante a patrulha ideológica do PT sobre jornalistas que não querem ler ‘Privataria Tucana’, do jornalista Amaury Ribeiro Jr.”

            Não brigo com fatos. E outros encontrei com um olhar mais detido à Internet. Realmente o livro – sejam quais foram seus méritos ou deméritos, que não posso avaliar porque não li – está funcionando como uma densa cortina de fumaça para encobrir os escândalos envolvendo ministros (com destaque Fernando Pimentel, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior) e o governador do Distrito Federal, Agnelo Queiroz.

            Não é impressionante, como assinalou a Tribuna da Bahia, somente o esforço patrulheiro do PT sobre os jornalistas que “não querem ler” o badalado livro. É impressionante também o fato de que o livro haja sido lançado no exato momento em que o ministro Pimentel cai no gosto da maledicência da mídia nacional. Eu disse ontem e repito hoje que não creio em coincidências.

            Bem, será realmente muito confortável se os jornalistas, como se fossem um rebanho de trouxas, se lançassem sôfregos sobre o texto do maravilhoso livro A Privataria Tucana e passassem a escrever e falar sobre o que nele fossem lendo, deixando para futura oportunidade – que poderia nem se apresentar – a atenção, a cobertura, a opinião sobre o que ocorre agora no governo federal e no governo do DF, este chefiado, não por coincidência (não adianta, não acredito mesmo nelas, as coincidências), por um governador do PT.

            Não. Para que essa pressa toda? O jornalista Amaury Ribeiro Jr. teve o tempo que achou conveniente para fazer suas apurações e redigir o seu livro e se resolveu lançá-lo agora, é problema dele. Mas é problema dos jornalistas resolverem o que fazem primeiro, se cobrem os escândalos em curso, se param de fazer isso para lerem e repercutirem o livro (como quer a patrulha petista) ou se ignoram o alfarrábio pressurosamente editado.

            Até porque muitos, ou alguns, ou talvez somente eu, sei lá... talvez não haja motivo para ler o livro. Afinal ele fala da “privataria tucana” e o PT, que se dizia contra a privataria e é adversário dos tucanos, já está no comando do governo federal há nove anos e não é lógico – em verdade, é absurdo – que haja deixado de fazer o que não fez para que, eventualmente, algum jornalista inspirado o fizesse. Talvez seja melhor aguardar a versão oficial do governo do PT sobre a privataria tucana.

            Um lembrete, sobre notícia detalhada em toda a mídia: ontem, a maioria governista derrubou requerimento do senador tucano Álvaro Dias que convidava o ministro Pimentel para dar explicações, sobre as denúncias de que é alvo, na Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle do Senado.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.