Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

O dia seguinte

Quinta, 16 de setembro de 2010 
Por Ivan de Carvalho
    Vale a pena juntar em um mesmo espaço e em uma mesma ocasião três notícias ou acontecimentos diversos, mas que parecem levar água para o mesmo moinho.

1. Em entrevista ao portal de internet Terra, o ex-governador paulista Cláudio Lembo, do DEM, faz sombrias previsões para o que poderíamos chamar de “o dia seguinte” – “The After Day”, lembram do filme? –, no caso, o 4 de outubro.  Ele supõe que a partir desse dia não haverá mais partidos políticos no Brasil, mas somente (na prática, é claro, não formalmente) “um movimento social coordenado por Lula”.

     Esta seria, se concretizada, uma situação extremamente grave e não existe, na realidade, uma garantia de que não ocorrerá algo na linha prevista por Lembo. Mas o ponto que quero destacar na entrevista dele é o da sua previsão para as condições em que a oposição sairá da eleição: “A oposição terá um resultado mau, muito ruim no pleito, e sai sem voz, sem maior possibilidade de apontar os erros do governo, de ser e fazer oposição. Também por erros da própria oposição”.

     Em síntese: uma oposição incapaz de cumprir mesmo minimamente sua função.

    2. O assessor especial da Presidência da República para Assuntos de Política Externa, Marco Aurélio Garcia (aquele do top, top, top do caso Francenildo) é o coordenador do programa de governo de Dilma Rousseff. Ontem ele disse que a campanha ainda não decidiu se esse programa será ou não divulgado antes das eleições. Deixou claro que não vê nenhum problema em não ser divulgado.

    Mas há problema, sim. Primeiro, a coligação de Dilma registrou no TSE o programa do PT. As reações foram intensas em setores da sociedade e em partidos aliados, sob alegação de que era um programa radical. Então disseram que fora entregue ao TSE somente para cumprir uma burocracia e que seria substituído, o que aconteceu, por outro. Acontece que este outro também foi considerado brabo, especialmente pelo maior aliado do PT e do governo, o PMDB, que exigiu participação na elaboração da “terceira versão”. A segunda manteve a defesa do “controle social da mídia”.

   Agora vem o Sargento Garcia (desculpem, isso de Sargento Garcia é lá com o Zorro) e diz que o programa pode não ser revelado aos eleitores antes da eleição. Piada pronta. E o PMDB, o que faz? Tudo indica que nada, o que parece dar certa razão à previsão de Lembo sobre o fim dos partidos.

    3. Agora, a palestra que José Dirceu, deputado cassado por causa do Mensalão, ex-presidente nacional do PT e ex-ministro-chefe da Casa Civil de Lula, fez para petroleiros na Bahia esta semana, julgando que não havia jornalistas no recinto. Mas havia. Disse ele: “Quem pode ter poder? Primeiro, o poder econômico. [...] As Forças Armadas estão, hoje, profissionalizadas. O poder econômico se aliou com qual poder? Com a mídia. E qual é o poder que pode se contrapor ao poder econômico e ao poder da mídia no Brasil? É o poder político...”. Note-se a preocupação constante com o “controle” da mídia, no programa de governo, ou a contraposição à mídia, na palestra de Dirceu.
    Tempestades à vista. Ou, talvez, a paz dos cemitérios.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta quinta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.