Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Vacinado contra escândalos

Sexta, 17 de setembro de 2010 
Por Ivan de Carvalho
    Não se pode dizer que este final de campanha eleitoral não está movimentado. O que não faltam são fatos e notícias que quebram notoriamente a rotina. A única rotina que, até agora, pelo menos, não tem sido quebrada é a dos resultados das pesquisas eleitorais recentes, que teimam em manter um quadro estável, com a persistência de números que favorecem largamente a candidata petista Dilma Rousseff.
    Até aqui, depois que tomou a dianteira nas pesquisas e abriu larga vantagem, a Mãe do PAC se mantém firme nas intenções de votos dos eleitores. Isso pode ser creditado a uma soma de numerosos fatores, mas os principais são facilmente identificáveis.
1. O país experimenta uma situação econômica com a qual o eleitorado está satisfeito.
2. Por conta dessa satisfação popular com os aspectos mais visíveis da economia (os problemas existentes têm por enquanto pouca visibilidade) e o carisma do presidente Lula, o governo conseguiu uma avaliação popular excelente e o presidente uma popularidade espantosa.
3. O governo lançou programas ou mudou o nome e ampliou programas existentes de grande apelo social, como o Bolsa Família, o Minha Casa e outros. E fez uma imensa propaganda a respeito, inclusive exagerando e fazendo parecer coisas feitas algumas que ainda estão por fazer. Isso levou mais água ao moinho da aprovação do governo e do presidente.
4. Ante o que está descrito nos itens anteriores, a oposição – ressalvadas as isoladas e honrosas exceções de sempre – resolveu há bastante tempo não se opor. Oposição que não cumpre sua função não vale nada. Essa estratégia de avestruz potencializou e facilitou a consolidação dos ganhos populares do governo.
    Então, nesta fase final da campanha eleitoral, aconteceram coisas. As duas mais importantes: as denúncias (comprovadas) de violação de sigilo fiscal na Receita Federal – numa espionagem que atingiu, inclusive, familiares e outras pessoas ligadas ao principal candidato da oposição a presidente, José Serra e a seu partido, o PSDB; e a explosão do escândalo de tráfico de influência e propina envolvendo, entre outros setores governamentais, a Casa Civil da Presidência da República e especialmente a ministra Erenice Guerra, deixada no cargo por Dilma Rousseff quando se desincompatilizou para disputar a presidência da República.
    São dois escândalos que, em qualquer país democrática e culturalmente desenvolvido, seriam capazes de virar uma eleição. Mas aqui no Brasil sequer produzem variação apreciável nos resultados de pesquisas eleitorais. Talvez porque aqui os escândalos são tantos e em sucessão tão intensa que a sociedade já os assimila como parte da rotina. O país pode estar, sim, vacinado contra escândalos.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.