Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Sobre medo e coragem

Segunda, 18 de julho de 2011
 Ivan de Carvalho

Há nos meios políticos em geral um quase consenso de que o principal candidato das oposições à Presidência da República em 2014 será o senador Aécio Neves, tucano mineiro. Dentro do próprio PSDB, o sobrinho de Tancredo Neves e ex-governador de Minas Gerais é atualmente o nome considerado mais provável para representar o partido nas eleições presidenciais de 2014.

Reforçando essa percepção dos meios políticos e do tucanato em especial, a recente convenção nacional do PSDB deu as principais posições de comando e destaque na estrutura do partido a adeptos da candidatura de Aécio Neves a presidente da República. Serra, completamente batido por Aécio e seus aliados, teve de se contentar com a presidência de um Conselho Político do PSDB, posto que lhe dá uma visibilidade quase somente eventual.

Foi tudo que o ex-bi-candidato a presidente da República, ex-prefeito da cidade de São Paulo, ex-governador paulista, ex-senador, ex-ministro do Planejamento e da Saúde, além de ex-presidente da União Nacional dos Estudantes conseguiu, depois de, nas negociações que precederam a convenção, pleitear posições mais vistosas em seu partido.

Mas Serra é teimoso e não perdeu a fé. Em 2002, ele enfrentou Lula na disputa pela Presidência da República e perdeu. Em 2006, ameaçou repetir a tentativa de vencer Lula, mas viu que não dava e em cima da hora deixou o abacaxi para o então governador paulista Geraldo Alckmin, enquanto ele, Serra, candidatava-se com êxito antecipadamente assegurado ao cargo que Alckmin ocupava.

Mas, em 2010, José Serra apareceu de novo como candidato a presidente, alegando nos bastidores tucanos – como já o fizera em 2002 – que sua idade fazia do enfrentamento com Dilma Rousseff sua “última chance” de ser presidente. Bem, Serra perdeu a chance, mas imediatamente depois deixou claro que já não considera que fosse ela a última. Quer mais uma. A terceira.

E até já está, segundo informa o jornalista Josias de Souza em seu blog, na Folha de S. Paulo digital, com raciocínios e argumentos engatilhados. O raciocínio principal esclarece o país sobre uma questão que está obscura para praticamente todas as outras pessoas, excetuadas videntes – Serra parece não ter dúvidas de que o candidato do PT a presidente em 2014 será Lula e não a presidente Dilma Rousseff.

Razão disso: o governo de Dilma será um fracasso (no momento, a coisa está mesmo feia, cada vez mais lama vaza do Ministério dos Transportes, a presidente ainda tem alguns anos pela frente para recompor a imagem de seu governo e, se isto for possível, mostrar que o escândalo seriado nos Transportes é pontual e não uma amostragem). Estas linhas não abordarão hoje questões relacionadas à ingenuidade de quem quer que seja.

Ora, na base do raciocínio de Serra estaria o seguinte. Se o candidato vai ser Lula, Aécio não vai querer se arriscar a enfrentar o ex-presidente, cuja popularidade ao deixar o governo era altíssima e ainda é. E se Aécio fugir da raia, estará aberta, goste quem gostar, uma avenida para a candidatura de Serra. Ele está convencido, também, de que o PSDB não poderá ignorar os mais de 43 milhões de votos que obteve no ano passado, no segundo turno das eleições presidenciais, enfrentando Dilma, sustentada esta pelo prestígio pessoal do então presidente Lula, por seu governo e por uma coligação partidária extremamente ampla.

E o clímax da análise de Serra seria muito simples: Aécio, sempre cauteloso e esperto, não vai ter coragem de enfrentar Lula, mas ele, Serra, vai. Coração valente. Simples assim.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano