Domingo, 26 de fevereiro de 2012
Da IstoÉPrivatização da gestão das vistorias veiculares no País é considerada irregular pelo Ministério Público. O negócio que movimenta R$ 5 bilhões foi articulado pelo senador Ciro Nogueira
Claudio Dantas SequeiraPADRINHO
O senador Ciro Nogueira foi quem indicou o diretor do Denatran, Júlio Arcoverde
Há sete anos, o PP controla o Ministério
das Cidades. Mas o partido não é homogêneo. Na lógica partidária de
loteamento da pasta, o Denatran tornou-se feudo do senador piauiense
Ciro Nogueira. Toda resolução emitida pelo órgão é antes discutida a
portas fechadas num escritório de advocacia em Brasília. No fim do ano
passado, o senador teve um encontro com o diretor do Denatran, Júlio
Arcoverde, o ex-deputado Inaldo Leitão, o coordenador-geral de
informatização Roberto Craveiro e o lobista Gil Pierre Herck, afastado
em dezembro, após ISTOÉ denunciar que ele trabalhava em benefício de
ex-sócios e integrantes da Associação Nacional das Empresas de Perícias e
Inspeção Veicular (Anpevi). O objetivo da reunião era discutir a
evolução do processo de privatização das vistorias no País. Foram
debatidas estratégias para tornar a vistoria veicular também obrigatória
para a emissão do licenciamento anual dos veículos e maneiras de
garantir o controle sobre a administração de um negócio de legalidade
suspeita e que movimenta R$ 5 bilhões por ano, as chamadas UGCs,
Unidades de Gestão do Cadastro Veicular.
O negócio, questionado pelo Ministério Público e alvo de investigação da
Polícia Federal, foi idealizado no início da gestão do PP nas Cidades e
posto em prática a partir da publicação da resolução 282, de 2008, que
passou à iniciativa privada a competência para a realização de vistorias
– antes exclusivas dos Detrans. Para a gestão dos laudos de vistoria,
foi criado um sistema operado pelas UGCs, que passaram a agir como
intermediárias entre as empresas de vistoria e o Denatran. Hoje, para a
empresa de vistoria operar ela precisa estar credenciada à UGC, que
cobra uma taxa pelo acesso ao banco de dados do Renavam. O problema é
que, ao criar as UGCs, a turma de Ciro Nogueira, além de não ter
recorrido à licitação, como previsto em lei, numa canetada concedeu a um
grupo seleto de cinco empresas o direito de comercializar informações
do poder público.
Os atos administrativos que criaram as UGCs são questionados na Justiça
Federal em vários processos movidos pelo Ministério Público, Detrans e
sindicatos de despachantes. Numa ação acolhida pela Justiça Federal em
Minas Gerais, por exemplo, o procurador Tarcísio Henriques Filho exige a
suspensão das vistorias em território nacional e a intimação da cúpula
do Denatran. Alega que vistoria é “exercício do poder policial” e
deveria continuar sendo prestado pelos Detrans. O Tribunal de Justiça do
DF, em decisão da Quarta Turma Cível, questiona também a concessão do
serviço às UGCs sem licitação. Em outra ação que corre na Justiça
Federal do DF, o advogado Everton Calamucci, presidente da Federação
Nacional dos Despachantes, denuncia que haveria uma única UGC vendendo o
acesso a outras quatro. As suspeitas recaem sobre a Oxxy.Net, conhecida
no mercado pelo nome AutoConsulta. Ela foi credenciada no ano passado
junto com as empresas Compuletra, Praxis, Otimiza e TAN.