Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Na Bahia de Jaques Wagner, militância em partido político vale muitos pontos em concurso público.

Quinta, 23 de fevereiro de 2012
Octávio Mangabeira, político que viveu na Bahia, já dizia: Pense num absurdo. Na Bahia tem precedente.

Veja a carta abaixo, que está correndo na internet, e conclua como um governo pode ficar sem rumo, como é o caso do governo baiano.
= = = = = = = = = = = = = == = = = = = = =
CARTA ABERTA AO SECRETÁRIO DE CULTURA DA BAHIA, Exmº Sr. ANTÔNIO ALBINO CANELAS RUBIM

A Bahia vivencia um absurdo período de desrespeito aos princípios constitucionais que regem o concurso público, com a predominância da contratação temporária para atividades de caráter permanente, inclusive naquelas onde há concurso com o prazo de validade em andamento, e candidatos aprovados. Não bastasse a contratação sem concurso, fora das hipóteses do artigo 37º, inciso IX, da Constituição Federal, os órgãos têm agora realizado seleções sem provas escritas, mas apenas por meio de análise de currículo e entrevista.


Tal cenário, porém, recebeu nesta semana, com a chancela da assinatura de V. Exª, uma novidade assustadora, consistente na inclusão, no edital nº 001/2012, que regula o processo seletivo simplificado para contratação de representante territorial de cultura, de um critério no mínimo estranho. Os pretendentes à vaga que tenham militado em partidos políticos poderão ter dez pontos acrescidos em sua análise de currículo (2,5 por ano de atuação). Para coroar a incrível situação, o item 11 do edital permite, no caso de não preenchimento da vaga, “a contratação direta, com aplicação de entrevista” apenas.


Efetivamente muitos ficarão indignados e impressionados com a alusão a partido político, por si só já inaceitável, haja vista a verdadeira ojeriza que boa parte da população tem em relação à militância partidária, o que deixa claro que a regra tem o escancarado propósito de beneficiar algumas pessoas. Chamo, porém, a atenção de V. Exª para um aspecto que, espero, sinceramente, apesar de parecer irônico, não tenha sido percebido quando da assinatura do edital. É que o item V exige, de forma oculta ao leitor menos atento, e por linhas transversas, apesar de inquestionáveis, a obtenção de 42 pontos para que o candidato não seja eliminado da seleção. Somente para se ter uma ideia do que esse último adorno jurídico nos oferece, vou criar um exemplo perfeitamente possível. Se um candidato com doutorado (12 pontos), seis meses de estágio na área cultural (4 pontos), dois anos de pesquisa ou monitoria na área cultural (3 pontos), dois anos de atividades em entidade cultural (10), uma obra literária publicada (5), uma obra cinematográfica publicada (5) e participação em dois cursos de extensão universitária relacionados à cultura (2 pontos), apesar de ter um invejável e mais que suficiente currículo, ele estará eliminado, por não ter alcançado os 42 pontos exigidos, deixando a escolha para ser feita livremente pelo Secretário. A pontuação exigida leva em conta a hipótese de o melhor qualificado alcançar 70 pontos, mas o número real é imprevisível e pode ser bem maior. Enquanto os concursos em geral exigem 50 pontos de 100 possíveis, o edital da seleção da Secretaria de Cultura exige 70% de um total desconhecido.


O edital, porém, não aponta o fundamento jurídico para que se deixe de lado a regra do Decreto Estadual nº 8.112/2002. Simplesmente diz que se a elevada pontuação não for alcançada ocorrerá a contratação direta. Ora, se entre os inscritos/interessados não houve gente com a alta qualificação exigida, onde serão eles encontrados? Por que se desprezar o interesse dos que ficaram com pontuação menor, se a vaga existe? Quais qualidades estranhas ao edital os que serão alvo da “contratação direta” possuem? Por que instituir a possibilidade de contratação de pessoas com menos pontos que as que ficaram perto de serem selecionadas? Onde fica o respeito ao caráter republicano do provimento dos cargos públicos em nosso País?


Conheço muitas pessoas que atuam na área cultural, certamente possíveis interessados, e que não sabiam dessa seleção simplificada. Certamente ampliando-se a divulgação para além do site, não haverá perigo de falta de candidatos com as qualificações exigidas.


Esta carta, porém, não tem por objetivo pedir apenas que as absurdas regras do edital sejam corrigidas, mas sim que a Secretaria de Cultura se empenhe em mostrar à Secretaria de Administração que, não somente na pasta, mas em vários outros setores do governo é escandalosa a situação de falta de concurso ou de respeito aos já realizados, em áreas cruciais e críticas, como na saúde, na educação e para os cargos de agente penitenciário.


O decreto do REDA [terceirização, de fato], tão criticado em palanque em 2002, quando se disse que o concursos voltariam a ocorrer, sequer ele está sendo respeitado. Mesmo o agravamento de suas inconstitucionalidades, feito através do Decreto Estadual 11.571/2009, não foi suficiente. O executivo não está cumprindo a própria “lei” que, livremente, faz.


Não se trata apenas de respeitar quem estuda e quer ter compromisso com o serviço público, mas principalmente de buscar a prestação de serviço com mais qualidade para o povo baiano, selecionando-se os servidores públicos pelo caminho do mérito, como manda a Constituição Federal.


Salvador, 19 de fevereiro de 2012

Waldir Santos
www.concurseiros.com.br
Advogado da União, palestrante, professor, autor do livro “Concurso público – estratégias e atitudes”, apresentador do programa de rádio “A hora dos concursos”, colunista semanal de concursos do Jornal A Tarde e colunista diário de concursos da rádio CBN. Twitter: 
@bahiaconcurso  / E-mail: waldir@concurseiros.com.br. Facebook.com/waldirconcursos