Quinta, 19 de fevereiro de 2015
De ESQUERDA.NET
A Grécia entregou o pedido ao
Eurogrupo para prolongar por mais seis meses o empréstimo, de forma a
poder negociar um novo acordo sem o fantasma da chantagem. Em entrevista
à revista alemã Stern, Alexis Tsipras diz que não se pode ignorar o
apoio de 80% da população ao seu governo.
19 de Fevereiro, 2015 - 11:55h
O
primeiro-ministro grego escolheu a imprensa alemã para a sua primeira
entrevista desde a tomada de posse. Foto Alexis Tsipras/Facebook
Jeroen
Dijsselbloem confirmou ter recebido a proposta grega esta quinta-feira e
deverá convocar os ministros das Finanças da zona euro para uma reunião
na sexta-feira. Em cima da mesa estarão condições associadas ao
prolongamento do empréstimo que nada terão a ver com as do memorando da
troika, que o governo grego considera extinto pela vontade popular
expressa nas eleições de janeiro.
Os gregos entendem este prolongamento do acordo de empréstimo como
uma “guarda-chuva” para o sistema financeiro no próximo período, durante
o qual o governo de Alexis Tsipras irá negociar com os parceiros da UE
um novo acordo com regras bem diferentes dos memorandos de austeridade.
Neste “acordo-ponte” para os próximos seis meses, a prioridade do
governo grego é debelar a crise humanitária e ao mesmo tempo assumir
compromissos firmes no combate à corrupção e à fraude fiscal.
“Apresentámos uma proposta que respeita o veredito popular e a dignidade
da sociedade grega”, disseram fontes do governo citadas no diário Avgi.
Ao mesmo tempo que permite à equipa de Tsipras “respirar” nos próximos
meses para começar a pôr em prática as medidas do seu programa, Atenas
acredita que este prolongamento de seis meses dará o tempo necessário
para uma negociação “serena e sem chantagens” acerca de um novo contrato
para a recuperação e crescimento na Europa para os próximos quatro
anos.
Tsipras: “Receber Merkel em Atenas? As portas estão sempre abertas!”
Na primeira entrevista à imprensa estrangeira após a eleição, Tsipras
escolheu a revista alemã Stern para declarar a morte do memorando de
austeridade e recusar o seu prolongamento por mais seis meses, como lhe
propôs o presidente do Eurogrupo na última reunião.
“Ninguém nos pode vir mandar que prossigamos o trabalho do governo
Samaras, como se não tivesse havido eleições”, declarou Tsipras,
lembrando que hoje o Syriza tem uma taxa de aprovação de 80% nas
sondagens. “Se ignorássemos essa realidade, a frustração colocaria as
pessoas nas mãos dos fascistas da Aurora Dourada”, acrescentou.
O combate à corrupção e à fuga ao fisco é a chave do financiamento dessas propostas, prosseguiu Alexis Tsipras, apostando com o jornalista que daqui a seis meses a Grécia será um país diferente graças às medidas que irá pôr em prática e que os anteriores governos não puseram, “por falta de vontade política”. “A razão para isso é que estavam intimamente ligados aos grandes negócios, enquanto a nossa vantagem é que temos obrigações para com o povo”, explicou.
Repetindo que não deseja receber mais resgates, mas apenas tempo para
promover as reformas do seu programa, Tsipras recordou que para além
dos fundos de apoio comunitários para enfrentar a crise humanitária, o
seu governo pretende dispor da parte grega dos lucros do BCE e dos 11
mil milhões destinados ao fundo de recapitalização da banca.
O primeiro-ministro grego falou sobre a brevíssima troca de
impressões com a chanceler alemã na cimeira europeia, dizendo não ter
tido tempo para perceber se Merkel conhece a fundo as preocupações dos
cidadãos gregos. E quando o entrevistador lhe sugere que convide Merkel
para uma visita, recebe como resposta um “E porque não? Somos conhecidos
pela nossa hospitalidade. As portas estão sempre abertas”.
Confrontado com as suas promessas eleitorais de subir o salário
mínimo, recontratar os funcionários despedidos, oferecer eletricidade a
300 mil lares de baixos rendimentos, Tsipras considerou-as “uma resposta
humana aos problemas que enfrentamos, quer se seja de esquerda ou de
direita”. Afirmando que os gregos foram atingidos mais duramente pela
crise do que outros países, Tsipras reconhece que não devem agora
repetir os erros do passado.
O combate à corrupção e à fuga ao fisco é a chave do financiamento
dessas propostas, prosseguiu Alexis Tsipras, apostando com o jornalista
que daqui a seis meses a Grécia será um país diferente graças às medidas
que irá pôr em prática e que os anteriores governos não puseram, “por
falta de vontade política”. “A razão para isso é que estavam intimamente
ligados aos grandes negócios, enquanto a nossa vantagem é que temos
obrigações para com o povo”, explicou.
Reagindo à oferta de Schäuble de mandar 500 cobradores de impostos
para ajudar o governo grego, Tsipras diz que até aceitaria 5000, mas “já
que o governo alemão se oferece, pode começar por ajudar-nos a fazer
alguma luz sobre o escândalo de corrupção da Siemens”, que pagou
subornos a políticos e funcionários gregos para ganhar concursos nas
últimas décadas, tendo parte do dinheiro sido entregue a testas de ferro
da empresa e regressado à Alemanha.
Quando perguntado se quer obter financiamento da Rússia e da China, o
primeiro-ministro grego diz estar empenhado “apenas numa solução
europeia, enquanto país da zona euro, já que seria incorreto pôr em
perigo esta união política”. Mas acrescenta estar bem consciente do
papel geopolítico da Grécia no mundo, prometendo continuar a ser uma
âncora estável numa área frágil entre três regiões”.
Sobre as sanções à Rússia, Tsipras diz não estar sozinho na UE, já
que os governos da Áustria e da Finlândia também expressaram reservas.
“Não nos esqueçamos que há muitos gregos a viver na cidade de Mariupol,
transformada em campo de batalha”, prosseguiu Tsipras, acusando as
sanções a Moscovo de serem “hipócritas”. “Se vamos punir a Rússia, então
também devíamos punir todos os países onde os multimilionários russos
têm colocado as suas fortunas”, defendeu.
A exigência de reparações pelos empréstimos forçados da Grécia à
Alemanha nazi também esteve presente nesta entrevista, com Tsipras a
reafirmar que mais do que uma questão financeira, se trata de “uma
obrigação moral”.