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(Millôr Fernandes)

sábado, 4 de junho de 2016

Rede de Médicas e Médicos Populares/DF adverte: Organizações Sociais na gestão fazem mal à saúde!!!

Sábado, 4 de junho de 2016
A Rede de Médicas e Médicos Populares - DF vê com preocupação a proposta de terceirização da administração dos serviços de saúde no DF por meio de organizações sociais (OSs), apresentada pelo governo Rollemberg de forma intempestiva e simplificadora como a ponte para “resolução” dos problemas organizativos, gerenciais e assistenciais que atrapalham o Sistema Único de Saúde no Distrito Federal.

A situação da saúde pública no DF vem em franca degradação ao longo dos últimos 18 anos, numa percepção visível e sentida no dia a dia da população das diversas cidades e regiões desta unidade da federação. Essa situação é causada por claros problemas:

- a má utilização de recursos do Fundo Constitucional para o financiamento da saúde;

- a indefinição de um modelo de atenção que valorize as pessoas e suas necessidades de saúde;

- a frágil integração do sistema de saúde do DF ao que é preconizado pelo texto constitucional brasileiro, onde “A Saúde é Direito de Todos e Todas e Dever do Estado”;

- o modelo de gestão historicamente constituído no DF que valoriza uma visão de negócio (e quem ganha neste negócio ???) para lidar com a saúde, o que cria distorções gerenciais, corporativas, de financiamento e compensatórias, e que colocam em segundo plano o direito de saúde das pessoas – especialmente daquelas que mais precisam.

No Distrito Federal, criou-se um modelo de atenção onde barreiras de acesso às pessoas foram construídas pela má distribuição e diversificação de serviços; e pela insuficiência na implantação de unidades de saúde - em acompanhamento ao ritmo em que se deu o crescimento demográfico e a migração dos setores médios da sociedade e das classes populares, que foram morar em novos e distantes lugares em seu território. Os problemas se avolumaram em mais de uma década, e o poder público foi incapaz de dar respostas a estas demandas. O resultado disso é a sensação de que os cidadãos não são acolhidos pelo sistema de saúde da cidade. Em compensação, o empresariado da saúde, as empresas de insumos, equipamentos, hospitais e serviços privados de saúde expandiram seus lucros em ritmo incrível, aproveitando-se do potencial do DF como mercado consumidor, através de subsídios ou de compra direta de serviços privados de saúde por parte do poder público.

Diversas experiências pelo país demonstram que a implantação de OSs como substitutas da administração direta traz vários impasses a médio e longo prazo, como:

MAIORES GASTOS COM SERVIÇOS – de todo recurso captado pelas OSs, cerca de 10 a 20 % o são como “taxas administrativas” para estas organizações. Estes recursos gozam de pouca transparência, e consomem parte dos aumentos orçamentários voltados à saúde, não sendo convertidos em investimentos, que continuam na conta do poder público;

APROFUNDAMENTO DAS BARREIRAS DE ACESSO A SERVIÇOS DE SAÚDE – para justificarem uma imagem de “mais com menos” e agregar parte dos recursos em “taxas administrativas”, as OSs criam artifícios para reduzirem o acesso das pessoas aos serviços, em relação ao que era esperado pela dimensão do investimento. Ou seja, programam uma quantidade de atendimentos/mês. Para não ultrapassar esta estimativa, regulam o acesso das pessoas aos serviços, como se a questão do adoecimento, de saúde e da necessidade das pessoas fosse mero “cálculo matemático”. Atendem em “conta-gotas”, e tentam vender a imagem de que acabaram com as filas. Mas, na verdade, acabam por jogar a “pressão assistencial” para serviços que não são administrados pelas OSs. E se incorporam todos os serviços de uma cidade ou estado, jogam parte considerável da demanda de atendimentos “para debaixo do tapete”. As OSs aprofundam o modelo de negócio enquanto gestão de saúde, e assim aprimoram as barreiras de acesso, mesmo quando se implantam novos serviços;

PRECARIZAÇÃO DO TRABALHADOR DA SAÚDE : as OSs fragilizam a aquisição de uma força de trabalho mais qualificada para os serviços de saúde, e impõem um ritmo de trabalho que geralmente leva ao adoecimento de muitos trabalhadores de saúde. Em outras experiências pelo país, muitos são os relatos de profissionais que duram somente dois anos à frente dos seus postos de trabalho, o que fragiliza o processo de ganho de expertise por parte dos serviços, e a incorporação de um corpo profissional permanente que possa fortalecer a assistência, com dedicação.

NÃO CONSTITUI ALTERNATIVA À LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL E DE COMPRAS E LICITAÇÕES NA ESFERA PÚBLICA- muitos gestores passam a falsa informação de que o regime de OSs seria mais eficaz por permitir o gasto de mais de 60% do orçamento da saúde com contratação de pessoal e dispensar regimes de licitação em compras. Esta compreensão é incorreta, conforme argumento já apresentado pelo próprio Ministério Público do DF, que é contra a implantação desta proposta e que deixa claro que os recursos, procedimentos e contratação das OSs devem seguir as legislações da esfera pública. Ou seja, a superação desta problemática transcende à implantação destas organizações. A superação da Lei de Responsabilidade Fiscal pelas OSs é uma falácia utilizada para ludibriar o cidadão e o Poder Legislativo, por parte de governantes que querem outorgar estas medidas.

CAIXA 2 EM CAMPANHAS ELEITORAIS – diante das limitações impostas pela legislação eleitoral, que impede o financiamento de campanhas eleitorais por parte de empresas, mas não de organizações “sem fins lucrativos” (como é o caso das OSs), estas estariam livres para doação em campanhas. Assim, o sistema de OSs pode abrir brecha perigosa para legalização de desvios de dinheiro público destinados à saúde para campanhas eleitorais, ou mesmo de contratação com dinheiro público de “apadrinhados políticos” e “cabos eleitorais”, como ocorreu em um passado remoto, com o “Instituto Candango de Solidariedade”.

Por todos estes argumentos, convocamos os profissionais de saúde e a população a resistirem a estes processos que são falsamente apresentados como a “panacéia”, a solução de todos os problemas de saúde de uma cidade ou estado. Já tivemos em Brasília experiências de OSs, como a Real Sociedade Espanhola de Beneficência (no Hospital Regional de Santa Maria) e a Fundação Zerbini (no antigo Incor), que foram desastrosos. Mesmo casos “bem sucedidos”, como o Hospital da Criança e a Rede Sarah Kubitscheck, apesar da inquestionável qualidade de seus serviços, não têm livre demanda em atendimento – a Rede Sarah seleciona os casos a serem atendidos, não atendendo, por exemplo, as urgências médicas, ou a Fundação Zerbini ou o Hospital da Criança, que só atendem pacientes referenciados, empurrando o restante dos usuários para a Rede Pública não terceirizada, como o Hospital de Base ou hospitais regionais, como o HMIB, agravando a dificuldade desses estabelecimentos. Esta distorção permite uma propaganda de “eficácia”, quando na verdade o que ocorre são restrições à utilização da capacidade estrutural dos serviços administrados pelas O.S.

Não vamos aceitar mais este Golpe !!!

OSs – ESTOU FORA DESTA !!!