Quarta, 18 de setembro de 2019
O ENSINO RURAL NO DF*
Salin Siddartha
A escolaridade afeta
positivamente a renda dos agricultores familiares – tome-se como exemplo que,
na horticultura familiar do Distrito Federal, na qual 50% dos horticultores
possuem apenas 4 anos de escolaridade, cada ano adicional de estudo se reflete em
um aumento de 7,1% na renda média. A política educacional do Distrito Federal
não pode ignorar a necessidade de um projeto específico para a escola rural,
voltada para os valores e os anseios do campo, em que os jovens e as crianças
se reportem ao contexto deles, vinculando a educação escolar às questões
sociais inerentes à cultura do campo.
Uma escola do campo
é a que defende os interesses e a economia da agricultura, que constrói
conhecimentos na direção do desenvolvimento social e econômico dessa população.
Com tal objetivo, é preciso articular os sujeitos do campo e suas práticas
educativas, mas sem criar formas de relação que burocratizem a ação.
A educação do campo
deve defender a cultura camponesa, sem a visão determinista
histórico-geográfica de que a escola urbana seja superior à escola rural. A
educação básica do campo precisa ser um projeto pedagógico da sociedade civil
para intervir na educação do DF – um projeto vinculado aos sonhos da população
camponesa para cultivar a identidade do morador do campo. Destarte, deve
preocupar-se com as demandas provenientes do universo rural para atender
escolas rurais, que são isoladas com pedagogias que não respeitam o universo
simbólico dos camponeses. Nesse aspecto, o desrespeito à cultura local não é específico
do ensino rural praticado no DF: é generalizado também em todas as escolas
urbanas. Caso exemplar e nada à parte, a História do Planalto Central e do
Centro-Oeste brasileiro não é ensinada em nossas escolas porque não consta no
currículo delas e pelo simples motivo de que os livros didáticos, produzidos
que são, em sua maioria, no eixo Rio-São Paulo, também não a revelam, assim
como não abordam a Geografia, Arte, Literatura nem a Biologia da Região, em
razão de se submeterem às exigências do mercado e à economia de escala, embora
esses livros didáticos sejam aqui adotados.
Os livros de
Biologia que são utilizados pelos nossos alunos nas escolas rurais do Distrito
Federal e de todo Centro-Oeste não dedicam mais do que três ou quatro páginas a
respeito do Cerrado, apesar de este ser o segundo maior bioma da Nação. Os
livros de História discorrem sobre as pinturas rupestres de Lascaux, na França,
e Altamira, na Espanha, entrementes nada dizem sobre as pinturas e gravuras em
pedra encontradas no sítio arqueológico de Bisnau ou da Toca da Onça, no
Município de Formosa-GO. Ao discorrerem a respeito do Tratado de Tordesilhas,
os livros didáticos omitem que ele atravessava o Estado de Goiás por cima de
Cocalzinho, a menos de 100 quilômetros do Setor Comercial Sul. Narram a
economia açucareira de Pernambuco e da Bahia, porém não se referem à fabricação
de açúcar na Fazenda Babilônia, em Pirenópolis-GO (patrimônio histórico tombado
e aberto à visitação para as escolas, e que está a cerca de 150 quilômetros da Estação
Rodoviária do Plano Piloto).
Não citam as
técnicas de caça, pesca, da produção da cera, do mel, do plantio da mandioca e
outros cultivos a nós ensinados pelos indígenas que habitaram, e muitos ainda
habitam, nossas localidades. Narram sobre o Quilombo dos Palmares, contudo se
esquivam de falar do Povoado de Mesquita, remanescente histórico de escravos
rebelados, na Cidade Ocidental, ou sobre os Kalungas, de Cavalcante, na Chapada
dos Veadeiros – o primeiro, situado a menos de 50 quilômetros, o segundo, a
pouco mais de 300 quilômetros da Rodoviária.
Por sua vez, a
implantação do ensino a distância para o setor agropecuário, por intermédio de
parcerias do Governo do Distrito Federal com a Embrapa, o Sistema Nacional de
Aprendizagem Rural e a UnB, pode ensinar Administração Rural a donos de
propriedades em regime de economia familiar, e todo o processo de aprendizagem
pode ser realizado pela Internet, sem necessidade de encontros presenciais nem
remessa de material pelo correio. O GDF também pode desenvolver ferramentas de
ensino acompanhadas de “pen drive” ou CD-ROM interativo que contenham recursos
de textos, imagens, sons e vídeos referentes ao conteúdo e explicações dos
cursos.
É uma questão de
vontade política do Governo.
Cruzeiro-DF, 15 de setembro de 2019
SALIN SIDDARTHA
Matéria publicada originariamente na Jornal InfoCruzeiro