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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 15 de dezembro de 2021

“Brasil é doente terminal por culpa de decisões políticas”, avalia Pinho

Quarta, 15 de dezembro de 2021


“Brasil é doente terminal por culpa de decisões políticas”, avalia [Pedro Augusto Pinho] Pinho

Da AEPET —Associação dos Engenheiros da Petrobrás
Pedro Augusto Pinho
15 Dezembro

Para presidente da AEPET, "balanço do petróleo no Brasil de Bolsonaro é uma peça fúnebre"

Na entrevista concedida ao Programa Faixa Livre nesta quarta-feira (15), o presidente da AEPET, Pedro Augusto Pinho, questionou as iniciativas de diferentes gestões que levaram o Brasil ao quadro que se encontra na atualidade. Pinho condenou o projeto de entrega da Petrobras, conduzido atualmente pelo presidente Jair Bolsonaro, e lamentou a prioridade dada aos lucros dos acionistas da Companhia, em detrimento dos interesses do povo brasileiro.

Clique aqui para ouvir a entrevista

A seguir, a transcrição da fala do presidente da AEPET, na íntegra

Bom dia Anderson, bom dia ouvintes do Faixa Livre.

Fazer um balanço da área do petróleo e da energia no Brasil é relatar o estado de um doente terminal. Não por falta de recursos naturais, não por indisponibilidade de recursos financeiros, não por ausência de tecnologia e de mão de obra preparada. O doente energia assim se encontra por decisão política. Adotada desde a promulgação da Lei nº 9.478, de 06/08/1997, por Fernando Henrique Cardoso e continuada pelos governos Temer e Bolsonaro, mas cujas bases já se encontravam no governo Collor.

A justificativa para retirar o monopólio da Petrobrás foi estabelecer a competitividade em um setor que é, em todo mundo, monopolista ou oligopolista. E foram vendidos ativos da Petrobrás em todos os segmentos: campos produtores, refinarias, dutos para movimentação de óleo, gás e derivados, áreas e instalações para tancagens, terminais marítimos e a distribuidora e postos de venda a varejo. Melhorou a qualidade do produto? O preço dos derivados? Em absoluto. Apenas dois exemplos, o gás encanado, que atende domicílios, teve o preço do m³ elevado em 20,59% neste ano, e o GNV (gás para veículos) 37,78%. Para a inflação do IPCA de 9,26%. É esta competitividade?

No que consiste então esta decisão política? Na submissão do interesse nacional, na solução das demandas brasileiras aos ganhos astronômicos do sistema financeiro internacional, na sujeição da política brasileira ao decálogo do Consenso de Washington. E para isso tem o apoio de toda mídia comercial, hegemônica, que penetra principalmente pelos canais de televisão em todos os lares, impedindo a justa revolta popular. E elegendo estes governos e aplicando golpe, como o de 2016.

Vamos aos números. Em 2020, o consumo de energia no Planeta foi 13,3 bilhões de toneladas de petróleo equivalente (tpe), das quais 56% tinham origem no petróleo líquido e na forma de gás (óleo e gás). As reservas de petróleo, incluindo a área venezuelana do Orenoco, eram, em 31/12/2020, 286,4 bilhões de tpe. Logo há petróleo no mundo para garantir 40 anos de consumo.

Mas isso não é tudo. Cada reservatório de petróleo tem um fator de recuperação, ou seja, quanto do petróleo lá existente é possível extrair com as tecnologias disponíveis. Para que se tenha uma ideia da relevância deste fator, nos campos brasileiros, existentes em 1970, o fator médio era inferior a 30 e hoje, com o pré-sal, já se aproxima de 60, ou seja, dobrou em 50 anos.

Mesmo que não se progrida na mesma razão, sem dúvida, com o avanço tecnológico, poderemos extrair talvez 80% de um reservatório nestes 40 anos de petróleo já conhecido, ou seja, elevaremos em um terço a disponibilidade de petróleo.

Isso que acabo de dizer desmente a fala irresponsável do ministro da economia quando diz que em 30 anos a Petrobrás nada valerá.

Mas há outro fator, além das técnicas de recuperação. A tecnologia de exploração e de produção de petróleo. Colocando a mesma data de meio século atrás, a Petrobrás não poderia ter descoberto o pré-sal, nem se o descobrisse teria como dele produzir. E como os bem informados ouvintes do Faixa Livre sabem, o pré-sal já responde por metade do petróleo produzido no Brasil.

Uma descoberta de apenas 15 anos.

Este fato também mostra o elevado nível tecnológico da Petrobrás.

Igualmente significativo é outro fato, ocorrido em outubro deste ano, e marcante a respeito desta capacitação tecnológica da Petrobrás, não bastassem os sucessivos prêmios internacionais que a empresa vem colecionando neste século, como detentora da maior tecnologia em águas profundas e ultra profundas.

Em 7 de outubro passado, realizou-se a 17ª rodada de leilões para a exploração de petróleo promovido pela ANP - Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis. Foram oferecidas 92 áreas e apenas 5 foram arrematadas. Um fracasso estamparam todas as mídias. Apenas não explicaram a razão do fracasso.

Nove empresas participaram do leilão, entre elas, as internacionais Shell holandesa, Chevron estadunidense, Total francesa, e Ecopetrol colombiana, que embora estatal tem diversos gestores de ativos, sediados em paraísos fiscais, detentores de cerca de 15% das ações da companhia. Apenas a Shell, sozinha em três blocos, e em parceria com a Ecopetrol em duas áreas licitaram, e na conhecida Bacia de Santos, onde a Petrobrás e até contratantes de risco, no período dos governos Geisel, Figueiredo e Sarney, já trabalharam e hoje também trabalham. Todas as áreas onde a exploração seria inovadora, não tiveram oferta. E por que? Porque a Petrobrás, por decisão de sua atual administração não autorizou efetuar qualquer lance neste leilão. E sem a Petrobrás, única detentora de tecnologia, nenhuma empresa, nem a vetusta Shell, nem a Chevron, nascida da Standard Oil do século XIX, poderiam se aventurar. Esperavam a Petrobrás para serem sócias nos lucros, não nos riscos que não sabiam como enfrentar. Mas a desculpa foi de áreas com risco ambiental. Ridículo.

Nenhum órgão de imprensa quis mostrar a realidade da nossa empresa que sofre a desestruturação e o desmembramento neste desgoverno em energia. E, efetivamente, o fim da Petrobrás é também um dos projetos destes dois últimos governantes.

Como todos sabem, a indústria de petróleo é integrada, do poço ao posto. Vai da exploração, a atividade de maior risco, à venda de derivados, onde tem a possibilidade do maior lucro.

O que faz o Bolsonaro? Vai ao posto, vendendo a Petrobrás Distribuidora, a segunda maior empresa brasileira, a primeira era a própria Petrobrás, por um preço tão ridículo que nem levou em consideração a marca BR, um símbolo da empresa e do País. Não consideramos um negócio, consideramos um crime. Então tirou da empresa o posto.

Agora está tirando a parte industrial com a venda das refinarias e da industrialização do xisto.
Tão absurda foi a venda da Unidade de Industrialização do Xisto (SIX) que mereceu no jornal Monitor Mercantil a seguinte manchete no fim de semana prolongado do 15 de novembro passado: "Petrobrás quer pagar R$ 361 milhões para vender usina de xisto a canadenses". E é isto mesmo, caros ouvintes, ao invés de receber do banco canadense que comprou a SIX, por R$ 178,8 milhões, a Petrobrás assumiu dívidas passadas e futuras daquela unidade industrial que superam o que recebeu.

Também a venda da primeira refinaria brasileira, a Refinaria Landulfo Alves Mataripe, RLAM, que homenageia o ex-governador e senador baiano que lutou pela criação da Petrobrás, logo de início se procura apagar a nossa história, transformando a RLAM em Refinaria Mataripe, propriedade de um fundo financeiro do Emirado Árabe de Abu Dhabi. E não por simples acaso, onde Bolsonaro, filhos e amigos foram passar recentemente férias. O principal acionista do fundo Mubadala é o herdeiro do dono daquele Emirado. Muito estranho, para não pensarmos o pior.

Mas a área da produção também tem sido vítima do assalto dos interesses financeiros estrangeiros nesta riqueza insubstituível do Brasil. Praticamente não temos mais campos terrestres. Os que ainda restam já tem programada a entrega nos próximos leilões.

Avança o desfazer dos campos marítimos, inclusive do pré-sal.

A Associação dos Engenheiros da Petrobrás - AEPET, em sua coluna semanal ENERGIA BRASIL, noticiou, em 9 de dezembro passado, a entrega de 70% dos importantes campos de Sépia e Atapu, no pré-sal da Bacia de Santos.

O campo de Atapu com a produção de junho do corrente ano já se colocava como o sexto maior do País e o quarto maior campo produtor do pré-sal. O campo de Sépia está recebendo a unidade denominada FPSO Carioca e pode elevar a produção nacional em 180 mil barris de óleo e 6 milhões de m³ de gás por dia.

É muito importante atentar que uma única unidade de produção em um único dos campos produtores do pré-sal, irá produzir o mesmo que todos os campos produziam em 1970. Isto, se outros dados não bastassem, mostra o que a Petrobrás construiu com seu próprio esforço, com o desenvolvimento tecnológico que produziu, com a dedicação de seus empregados e dirigentes por 45 anos.

Este é um patrimônio nacional que está sendo entregue, sem mesmo recuperar minimamente o esforço dos brasileiros, por governos golpistas e entreguistas.

O mais grave é a verdadeira lambança de toda estrutura governante do Brasil nesta área da energia.
A começar pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que em estranhíssima decisão permite a venda dos ativos da Petrobrás sem passar pelo Congresso Nacional, como está na Constituição e na própria lei de FHC, a Lei nº 9.478, de 6 de agosto de 1997. Depois pelo silêncio e conivência dos órgão do Poder Executivo, como o Ministério de Minas e Energia e a Agência dita reguladora, a ANP, além da própria presidência da República que mais de uma vez já afirmou desejar ficar livre da Petrobrás. E pelo Congresso que fica disputando benesses a custa de nossos impostos e não age como fiscal do Executivo, o que está em suas atribuições.

Concluirei com poucas palavras sobre o lucro da Petrobrás. Em tempos anteriores a FHC, o lucro da Petrobrás era repartido entre alguns poucos brasileiros que detinham ações da Empresa e a maior parcela ia para o Governo Federal. Hoje, com a abertura em Bolsa estrangeira, os acionistas se dividem nestas percentagens: 41,63% com estrangeiros, 36,75% com o governo brasileiro, 21,62 % com acionistas brasileiros e 10,23% que estão em permanente movimentação nas bolsas de valores. Considerando que entre estes estrangeiros estão os gestores de ativos, empresas apátridas, com capitais em paraísos fiscais que usam as ações, principalmente, para especulação, não é absurdo imaginar que boa parcela do que fica em jogo nas bolsas seja de ações destes gestores, o que eleva para muito perto de 50% a participação estrangeira.

Entre estes gestores de ativos estavam, em 13/12/2021, o Capital Research & Management Co., com 2,80%, o American Funds EuroPacific Growth Fund Class A, com 2,58%, e mais de 11 fundos e gestores com menos de 1% cada. Ou seja, o Brasil é quem menos lucra com a Petrobrás por decisão política dos maus governantes em quem temos votado desde a promulgação da Constituição de 1988, já emendada 111 vezes até setembro passado.

Portanto, caro Anderson, prezados ouvintes, o balanço do petróleo no Brasil de Bolsonaro é uma peça fúnebre para nossa soberania, para nossa energia e para todo povo brasileiro.