Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

A fase dos adiamentos

Segunda, 7de fevereiro de 2011 
Por Ivan de Carvalho
A política brasileira está, nesta fase, cheia de adiamentos. Eles podem até ser considerados uma marca do início do mandato da presidente Dilma Rousseff, embora nem todos os adiamentos sejam de iniciativa dela. Um desses casos é o evidente adiamento do começo da ação oposicionista pelos dois principais partidos de oposição, o PSDB e o DEM, que se perdem em desgastantes, às vezes ridículas, disputas internas.
 
    Dois adiamentos são de iniciativa da presidente. Um deles, já ultrapassado, a suspensão das escolhas para o segundo e terceiro escalões da administração federal até que se realizasse a eleição secreta para a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.
   A preocupação era a de evitar que as escolhas na administração ampliassem insatisfações de parlamentares de partidos aliados ao governo, criando ambiente propício a rebeldias na eleição do novo presidente da Câmara.
 
    O receio maior referia-se a insatisfações no PMDB, o grande partido aliado que está sendo literalmente espancado nas decisões sobre a composição do governo. No fim da história, houve rebeldias, mas o principal rebelde – o único com densidade eleitoral no plenário da Câmara – foi o deputado Sandro Mabel, do PR, que teve mais de 100 votos, mas nem contou com o apoio do seu partido, que se dispõe a aplicar-lhe alguma punição.
 
   Reaberta a temporada de escolhas e nomeações, parte do PMDB tomou logo outra cacetada relacionada com a escolha para o setor elétrico, mais especificamente o comando de Furnas. Houve logo em seguida o apagão no Nordeste – o que seguramente não tem relação com a escolha para Furnas, salvo para os supersticiosos.
 
   E aí, novo adiamento. A presidente da República suspendeu outra vez as escolhas para os segundo e terceiro escalões (talvez até para o quarto e, quem sabe, o quinto) de seu governo até que o Congresso vote a medida provisória do salário mínimo.
 
   A MP editada por Lula fixa o salário em R$ 540,00, o governo já propõe uma elevação para R$ 545,00, mas, segundo políticos experientes, está pronto para aceitar R$ 550,00, pois sabe que o Congresso sempre gosta, para ser simpático, de dar algo além do que o governo sugere.
 
   Duas coisas o governo não quer: 1) muito barulho, com a oposição, até aqui auto-amordaçada a respeito de todos os assuntos, e até os aliados fazendo média com os assalariados e aposentados à custa da avareza do Executivo; 2) uma decisão do Congresso que ponha o valor do salário mínimo além daqueles R$ 550,00 admissíveis, mesmo que não chegue aos R$ 580,00 que as centrais sindicais fingem que exigem ou ao R$ 600,00 que a oposição, na campanha eleitoral, prometeu dar se conquistasse a presidência da República, valor que agora anuncia que defenderá no Congresso.
 
   Sair nomeando gente para os segundo e terceiro e até outros mais modestos escalões do governo antes dessa batalha no Congresso pode aumentar o número de insatisfeitos no Legislativo, criando inconvenientes adicionais para o governo, ainda que sem risco de uma complicação realmente séria – se algum dia os insatisfeitos da base parlamentar governamental em aliança com as fragilizadas oposições impuserem derrotas políticas relevantes ao governo de Dilma Rousseff e/ou ao PT, isso não será agora, não a curto prazo, mas bem lá adiante. E tudo dependendo da avaliação que a população e o eleitorado estiverem fazendo da gestão Dilma Rousseff e da situação da economia nacional.
 
   De qualquer modo, essa fase de adiamentos na composição do governo deixa muita coisa indefinida, em suspenso, retarda muita coisa que deveria ser feita logo e fica, por enquanto, sem fazer.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta segunda.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.