Sexta, 27 de maio de 2011
Por Ivan de Carvalho

O único
transtorno era uma certa malcriação da inflação, que teimava em se apresentar transitando
entre um pouco acima e um pouco abaixo do teto limite pré-fixado para ela pelo
governo.
Na verdade,
os que teriam condições, poderes para manter a inflação bem comportada não
seriam os economistas e financistas, nem os estatísticos de certas instituições
oficiais, com suas amostragens maravilhosas, mas os políticos. Estes, no
entanto, bagunçam a casa, como os que estavam no governo da União em 2010, ano
de eleição, diligentemente a bagunçaram, na presunção de que a chamada equipe
econômica ponha depois as coisas nos eixos, custe o que custar e doa a quem
doer, menos a uns, pois se todos os brasileiros são iguais, alguns são mais
iguais do que os outros.
Mas quando
parecia que era só isso e uma pneumonia já praticamente superada que levou a
presidente Dilma Rousseff a dar mais umas voltas na chave da porta que vinha
separando-a da nação, apesar de todas as boas vontades da parte desta, maio
resolveu mostrar a que veio.
Estourou o
arranca-rabo do Código Florestal, do qual o governo, pelo menos na opinião de
dez em cada dez ambientalistas brasileiros, se saiu muito mal. Os
ambientalistas estão tiririca com o governo e a presidente Dilma.
A comunidade
GLBT, idem – tenho a impressão que já incluíram na sigla mais uma ou duas
letras, mas prefiro não arriscar – também está tiririca com a presidente
(aliás, vale um parêntesis para esclarecer que Tiririca não tem nada com essa
história). Isto porque no grande debate nacional que se estabeleceu sobre o tal
“kit anti-homofobia” que o Ministério da Educação fez produzir para
distribuição às escolas públicas do ensino fundamental, o que venceu foi o “kit
antigay” lançado pelo deputado Jair Bolsonaro, do PR fluminense.
O debate
incendiado pela reação de Bolsonaro e seu “kit antigay” atiçou evangélicos e
católicos organizados (há muitos parlamentares que se dizem católicos, mas não
estão organizados) a ameaçarem ficar contra o governo em outras questões se o
“kit anti-homofobia” (dentro do projeto Escola sem Homofobia) fosse distribuído
pelo Ministério da Educação às crianças da rede pública de ensino. A presidente
Dilma deu ontem a ordem de cancelar e determinou que coisas relacionadas a
costumes e que interessem a setores da sociedade não sejam consumadas sem antes
um debate com esses setores e a sociedade em geral. Ela demorou a
descobrir a pólvora, mas, afinal, descobriu. E ontem deu declarações muito
sensatas sobre o Estado e a privacidade.
Engraçado é
que ela parece haver surpreendido o ex-presidente Lula, que saíra de suas
palestras de R$ 200 mil para articular a defesa do ministro-chefe da Casa
Civil, Antonio Palocci, outra “vítima” de maio. Lula conversava com senadores
aliados quando contou que, ante o debate sobre o “kit anti-homofobia”, ligara
para o ministro da Educação, Fernando Haddad, e, baseado em tal telefonema,
garantiu que não havia nada decidido no governo. Mas havia, o ministro é que ainda
não sabia. E os evangélicos, que souberam da interferência de Lula, não
gostaram disso. A AGBLT (Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Tansexuais)
foi convidada a conversar, na terça-feira, com Gilberto Carvalho, secretário
geral da Presidência.
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Este artigo
foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de
Carvalho é jornalista baiano.