Quinta, 19 de maio de 2011
Carta Aberta ao governador Jaques Wagner (PT-Ba)
Quando a educação transforma-se em mercadoria e perde o seu valor
Por *Prof. Dr. Reginaldo de Souza Silva
Prezado Senhor Governador Jaques Wagner,
No dia do lançamento do Pacto Pela Educação na Bahia, véspera do Dia do Trabalhador e Dia das Mães, recebemos de V. sa., intempestivamente, o corte de nossos salários, mesmo tendo cumprido todas as exigências legais. Com menos de 22 dias em greve em luta por melhores condições de trabalho, permanência estudantil e garantia da autonomia universitária, recebemos um “presente de grego” pelo também Dia Mundial da Educação. A democracia e o diálogo, outrora bandeira de luta do Partido dos Trabalhadores, foram substituídos pela ameaça explícita à aqueles que resolveram protestar publicamente contra os desmandos de Vossa administração.
Gostaríamos de lembrar a V.sa, que há
muito tempo não comparece a uma escola ou a uma universidade pública,
que nós professores temos como missão educar. Isso significa permitir
às novas gerações o acesso a diversos aspectos da vida humana às quais
elas não “veriam” se não estivessem nessas instituições de ensino.
Portanto, educar é ensinar a “ver”, é desenvolver habilidades, é,
principalmente, despertar sensibilidades, pois, segundo Rubens Alves,
sem elas “[...] todas as habilidades são tolas e sem sentido, pois os
conhecimentos nos dão os meios para viver e a sabedoria nos dá razões
para viver.” E esse tem sido o nosso papel.
Entrando em greve não paramos de
cumprir com a nossa missão, pois estamos, assim, despertando em nossos
alunos, e em toda a população baiana e brasileira, a sensibilidade para
“ver” e não mais se conformar com o caos político implantado na Bahia.
Para tanto, a palavra tem sido o nosso
mais significativo instrumento. Diuturnamente nós, professoras e
professores deste imenso Estado da Bahia, estaremos, pela palavra,
lembrando a todos que o Estado com o maior número de pessoas em extrema
pobreza é a Bahia com 2,4 milhões; que sua taxa de homicídios é de 36
por 100 mil habitantes (enquanto a ONU estabelece como suportável para
grandes cidades 12 por 100 mil); que mais de 12% do total de
analfabetos do Brasil (14,1 milhões) está na Bahia: que 1,8 milhão de
baianos com 15 anos ou mais (16,7% desta população) não sabem ler e
escrever. Estaremos também, caro Governador, alardeando as ações
tomadas por V.sa, através de suas diversas secretarias, que têm
contribuído para continuar o sucateamento da educação.
Não bastassem esses problemas,
lembraremos a todos os índices vergonhosos do IDEB, o número de evasão e
de reprovação, os números ainda baixos de matriculados na educação
básica (médio) e superior e a falta de ações e condições para
permanência e sucesso dos estudantes; os baixos salários e o
desrespeito aos servidores públicos, inclusive os da educação; o
abandono e as ingerências nas áreas de Segurança e de Saúde e o
desrespeito ao principio constitucional federal e estadual de Autonomia
das Universidades Estaduais.
Senhor Jaques Wagner, informar de forma
mentirosa um aumento de 87,6% no orçamento das universidades estaduais
(Uneb, Uefs, Uesc e Uesb), de R$ 386,8 milhões em 2006, para R$ 725,6
milhões em 2011, quando deveria ser utilizado o ano de 2007 para
comparação, omitindo a precariedade relacionada ao número de alunos,
cursos, docentes, estrutura física, interiorização etc. das
universidades estaduais da Bahia, não nos calará e não enganará a uma
população que pode enxergar.
Nós, professores, não nos silenciaremos
porque nos tirou os salários. E, em nossas salas de aulas, pela
palavra, continuaremos a nossa missão de sensibilizar, pois,
professores, alunos e funcionários, não podem e não devem ser tratados
como mercadoria, a qual se compra a mais barata ou de menor qualidade;
não somos moedas de troca, muito menos franquias e não podemos ser
adquiridos em “lotes”.
Senhor governador, “Ensinar é um
exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles
cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O
professor, assim, não morre jamais…” (Rubem Alves). Mas os governos
passam… e a educação, que não é mercadoria, ultrapassa o tempo de
mandato dos gestores públicos.
*Reginaldo de Souza Silva – Doutor em
Educação Brasileira, professor do Departamento de Filosofia e Ciências
Humanas da UESB. Email: reginaldoprof@yahoo.com.br
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