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(Millôr Fernandes)

terça-feira, 9 de abril de 2013

Margareth Thatcher

Terça, 9 de abril de 2013
Por Ivan de Carvalho
        Margareth Thatcher, que morreu ontem, aos 87 anos, de um acidente vascular cerebral, foi sem dúvida uma das mais importantes lideranças políticas mundiais do século XX e se consideradas apenas as mulheres, a mais importante e destacada. Como primeira-ministra britânica, em tempos de paz não teve concorrência no século passado. Se considerados também períodos de guerra é preciso reconhecer a enorme relevância do primeiro-ministro Winston Churchill, do mesmo partido que o dela, o Conservador. 

     Internamente, ela fez o que se pode chamar de uma revolução liberal na Inglaterra, que estava economicamente caindo aos pedaços, praticamente sob o domínio dos sindicatos, com um Partido Trabalhista atrelado e fortemente submisso a eles. Iniciou seus 11 anos ininterruptos de governo, que terminaram somente em 1990 com uma manobra interna em seu Partido Conservador, por causa de uma mudança tributária polêmica que ela pretendia fazer.


Mesmo assim, o Partido Conservador bateu o trabalhista nas eleições e conseguiu permanecer mais cinco anos no poder, sob a liderança do primeiro-ministro John Major. Thatcher, adotou internamente a economia política liberal e lançou a proposta global de recuperação econômica mediante a proposta da economia liberal de mercado.


Thatcher iniciou seus 11 anos de governo com uma traumática queda de braço, que durou um ano inteiro, entre o governo e o Sindicato dos Mineiros. O governo venceu e o sindicalismo britânico, que trava a economia do país, nunca mais voltou à posição dominante que assumira, controlando o Partido Trabalhista, que pouco mais à frente, com Tony Blair, mudou radicalmente de linha, abandonando de vez a ideologia dita “de esquerda” e adotando o pragmatismo com matizes social-democratas.


A ação política internacional de Margareth Thatcher foi simplesmente espetacular. Ela sozinha iniciou uma retórica e um jogo duro contra o império comunista representado pela União Soviética e seus satélites. Era uma luta desigual enquanto governava os Estados Unidos Jimmy Carter, um presidente correto e ético, mas fraco e colecionador de fracassos, como a captura da embaixada americana pela Guarda Revolucionária do Irã, com numerosos reféns que ficaram presos ali por meses e ainda a desastrada operação militar secreta para resgatá-los.


A maré virou com a eleição de Ronald Reagan para a Presidência dos Estados Unidos. Ele entrou disposto e conseguiu restaurar o que chamava de “majestade da Presidência”. Como que por milagre o governo do Irã libertou os reféns às vésperas de sua posse – “Se eu fosse presidente do Irã, eu libertaria os reféns antes que eu tomasse posse” – advertira Reagan, numa declaração um tanto irônica que os chefes iranianos instantaneamente entenderam.


Bem, a dupla Thatcher-Reagan logo tornou-se um trio no qual se integrou um aliado valioso, corajoso e estrategista de primeira linha, o papa João Paulo II. A ação conjunta e bem coordenada convenceu a liderança soviética de que não tinha como, condições econômicas e tecnológicas para fazer frente à corrida militar desencadeada por Ronald Reagan. Surgiu um líder lúcido e sensível, Mikhail Gorbachev, tentou uma grande reforma interna, mas as resistências reacionárias inviabilizaram uma liberalização política e econômica gradual e deram o empurrão final para a ocorrência de fatos que fizeram desmoronar o império soviético em toda a Europa Oriental e finalmente levaram à extinção da própria União Soviética.


Thatcher, ainda no governo, estimulou esse desmoronamento e, em 1989, pôde comemorar a histórica e emblemática queda do Muro de Berlim. Já fora do governo testemunhou a extinção da URSS, ação liderada por Yeltsin, já presidente eleito da Rússia. Difícil é saber se isto foi melhor para o mundo (especialmente ante a sucessão de Yeltsin por Vladimir Putin, o homem da KGB, a organização hoje no comando da Federação Russa) ou se seria melhor que Gorbachev se mantivesse no comando e a URSS se desfizesse suavemente. 

     Mas isso não dependia dela, Thatcher.

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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta terça.

Ivan de Carvalho é jornalista baiano.