Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

domingo, 28 de abril de 2013

O Sustenido

Domingo, 28 de abril de 2013
Do Blog Contação
Martinho da Tuba, ou Martinho Barbeiro, atravessou toda a cidade carregando a velha espingarda. Vestia, ainda, a gloriosa farda da Banda Municipal. Segurava a arma com uma das mãos, pelo cano, e a arrastava como se quisesse desintegrá-la pouco a pouco. Olhava para baixo e do chão não desviou o olhar nem quando passou mulher bonita. Falar não falava e só se ouvia um burburinho oriundo do grupo de curiosos que o seguiam. 
 
Era domingo, meio-dia, tinha sono e não era por dormir tarde. Durante todo o sábado trabalhou muito, como sempre, munido de tesoura e navalha. E ouvido. Martinho perguntou ao filho, logo após o serviço: “Sabe qual a ferramenta principal de um barbeiro?”.  Acertou quem respondeu: “o ouvido”.  Martinho jantou e se recolheu ao quarto, queria dormir e entrar em um estado de não pensar. Errou: a cama parecia de madeira dura e o travesseiro era de pura pedra. Levantou-se muito cedo e enquanto saía o filho chegava: “Fui comemorar, pai. Eu e o padrinho”. Martinho da Tuba seguiu com seu instrumento rumo ao coreto e tocou como nunca. Depois de muitas marchas e dobrados, quando a última música terminava, um não-sei-quem gritou: “TEM GATO NA TUUUUUBA”. O músico acabou de tocar a peça, depositou o velho instrumento no chão e saiu sem se despedir. Os colegas de banda bem que estranharam, afinal o barbeiro nunca se separava da tuba, limpava e lustrava o instrumento todos os dias. A tuba brilhava, solitária, ao sol do meio dia...