Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Não matarás

Quarta, 3 de abril de 2013
                                        Imagem da internet
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Por Ivan de Carvalho
Ao Quinto Mandamento, dado a Moisés no Monte Sinai, a humanidade carregada de imperfeições, males, egoísmo tem feito exceções. Nas guerras, nos assassinatos ilegais, nas penas de morte, nos abortos.

É este último tipo de exceção, legal ou ilegal, ao Quinto Mandamento – que não permeia somente a fé israelita e a fé cristã, mas outras, a exemplo da budista, da espírita – que pretendo abordar hoje neste espaço. Mais uma vez de quantas forem necessárias.

Não é novo que, na subcomissão do Senado Federal que discute mudanças no Código Penal Brasileiro, tramita uma proposta que, entre outras coisas, tenta instituir a permissão legal para que seja praticado o aborto até a 12ª semana de gravidez.

Convém lembrar que no Congresso já tramitou uma proposta com esse conteúdo, da autorização do aborto até a 12ª semana de gravidez. Então, na 25ª hora, um parlamentar menos desatento descobriu que, com mão de gato, se havia retirado a expressão “até a 12ª semana de gravidez”. A consequência disso seria que não haveria limite de tempo de gestação para o aborto, que poderia ser praticado, portanto, até, digamos, uns minutos antes do parto. Então, aquela criancinha que minutos depois estaria no berçário acabaria indo... pense você mesmo.

A descoberta, em cima da hora da votação, do dispositivo mortal abortou (perdoem o trocadilho) a proposta assassina. Ela foi retirada de pauta e não mais reposta. Mas foi uma vergonha e – convém que a verdade seja dita – petistas estavam mergulhados nela até o pescoço. Vale assinalar, para maior evidência, que o 3º Congresso Nacional do PT incluiu entre as diretrizes programáticas da legenda a descriminalização do aborto. E o partido não para de trabalhar para isto.

Alega-se que a mulher tem o direito de fazer o que quiser com o seu próprio corpo. Até certo ponto. Se uma mulher que não sabe nadar estiver na amurada da Ponte João Ubaldo Ribeiro (aquela que liga Salvador a Itaparica) pronta para lançar-se ao mar e, ainda por cima, com uma pedra de bom tamanho amarrada ao pescoço, você, tendo chance, tentará impedi-la, mesmo que à força, contra o “direito” dela de se matar.

Como, então, você poderia reconhecer-lhe o direito de matar, não a ela própria, mas a outra pessoa que temporariamente se abriga no ventre dela, inocente e indefesa, e sem responsabilidade alguma por estar ali? Está cientificamente provado, especialmente após a genética, que, a partir da fecundação, há um novo ser humano em desenvolvimento. Em qual grau de desenvolvimento, não importa.

Incrível que a maioria dos integrantes do Conselho Federal de Medicina e dos presidentes dos Conselhos Regionais de Medicina haja ignorado tudo isto e optado pelo crime do aborto “até a 12ª semana de gravidez”, sob o argumento de que muitas mulheres (eles apresentaram umas contas, que vi na Tribuna da Bahia) morrem por fazerem abortos clandestinos.

Julguei que ao CFM e aos Conselhos Regionais de Medicina cumprisse sugerir uma intensa campanha permanente de conscientização das mulheres e dos pais e outras medidas para evitar abortos, clandestinos ou não – inclusive com o Estado assumindo responsabilidade ampla por apoio psicológico e de outras naturezas às gestantes em situação difícil e assumindo total responsabilidade pelas crianças, se indesejadas por haverem sido geradas em consequência de estupro.

Mas o CFM e os presidentes dos Conselhos Regionais renegam o esforço que justifica a existência da medicina, que é o de preservar a vida. Traem expressamente o juramento de Hipócrates, inspiram-se talvez em Herodes, e optam pela recomendação da morte dos pequeninos, do massacre dos inocentes.

Dificilmente estarão falando em nome da maioria da categoria. Mas a esta cumpre, se for o caso, desautorizar seus detratores, como já o fez, pelo menos – e em termos vexatórios para o CFM – a Associação Médico-Espírita do Brasil.
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Este artigo foi publicado originariamente na Tribuna da Bahia desta quarta.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.