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(Millôr Fernandes)

quinta-feira, 31 de julho de 2014

O mal-estar nas metrópoles continua. Entrevista especial com Marcelo Castañeda


Quinta, 31 de julho de 2014
 Do IHU
 Instituto Humanitas Unisinos
“As razões do mal-estar continuam, o que sinaliza que a qualquer momento a multidão pode tomar as ruas novamente”, frisa o sociólogo.


As manifestações que ocorreram em junho de 2013 em várias cidades brasileiras, e que ocorrem de modo mais espaçado nos últimos meses, expressam “uma insatisfação na forma como as metrópoles vêm sendo geridas e como os serviços públicos vêm sendo prestados como um dos fatores para esse mal-estar”, avalia Marcelo Castañeda na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail.
Para ele, em nível nacional, as manifestações iniciadas em junho do ano passado evidenciam “a ausência de participação nas decisões públicas”. E critica: “O que a presidência entendeu como oportunidade para uma reforma política que, no fundo, da forma como foi apresentada, era nada mais que uma reforma do sistema eleitoral, rechaçada no Congresso pelo PMDB, seu principal aliado. O mal-estar remete à construção da democracia brasileira, com seu fechamento institucional que não abre espaço para formas de participação que vão além da mera representação”.
Castañeda esclarece que o termo massa, amplamente utilizado pelos movimentos sociais dos anos 1980, não explica as manifestações. Nesse sentido, o conceito “multidão” é “interessante para pensar o que aconteceu e pode acontecer na medida em que remete a uma cooperação de singularidades que pode estabelecer um comum, que não é público nem privado e envolve todo um trabalho na sua constituição, um trabalho de longo prazo”. E acrescenta: “Foi uma multidão selvagem que se formou em junho de 2013, e aí me baseio muito no que aconteceu no Rio de Janeiro, trazendo uma pluralidade de pautas que coloca em xeque os que disseram que não havia pauta nas ruas. Havia muitas pautas e elas continuam se fazendo nas diferentes lutas que persistem apesar da repressão desmedida”.
De acordo com o sociólogo, “antes de junho de 2013 existia um consenso fabricado sobre o ‘neodesenvolvimentismo’ e a ascensão de uma ‘nova classemédia’. Um consenso arbitrário que foi rompido pela multidão em junho de 2013, apontando caminhos para a constituição de uma democracia a partir do dissenso dos insurgentes que não concordavam com o consenso estabelecido pelo poder constituído. Esse processo está em curso, aberto, graças à manutenção dos protestos”. Depois da Copa do Mundo, com o esvaziamento de parte dos protestos, Castañeda reitera que ainda “existem brechas para ações coletivas que tentem pautar as eleições por fora dos partidos que participam das eleições com suas pautas limitadas e comprometidas com os interesses que as financiam”. Contudo, “qualquer previsão” em relação a novas manifestações durante as campanhas eleitorais à Presidência da República “é arriscada”, na medida em que “as manifestações colocaram em xeque todo o sistema de representação e não tiveram qualquer retorno por parte deste sistema neste sentido. Uma questão que pode sinalizar um impacto seria a quantidade de votos nulos e em branco, que podem apresentar um aumento”, conclui.
MarceloCastañeda é doutor em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ) e graduado em Ciências Sociais pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro.
Confira a íntegra da entrevista aqui