Segunda, 28
de julho de 2014
Por Siro
Darlan, desembargador do Tribunal de Justiça e Coordenador-Rio da Associação
Juízes para a Democracia.
O Brasil é
hoje o terceiro país que mais encarcerados possui, perdendo apenas para a China
e os Estado Unidos. Esse número não nos deixa em boa posição no cenário de uma
civilização que promoveu diversas revoluções na conquista das liberdades. Nossa
Pátria já traz tatuada em sua história a marca de ser o último país da América
a abolir a escravidão. Ainda não nos desapegamos dessa prática hedionda.
Trocamos o tronco e os castigos físicos, além da exclusão social em razão da
cor da pele pelo encarceramento como forma de manter acesa a chama do apartheid
social.
Apesar do
reconhecimento do fracasso do sistema penitenciário brasileiro como forma de
ressocialização, ainda é muito grande o número de encarcerados
desnecessariamente quando existem alternativas de reparação dos danos que a
criminalidade causa à sociedade e violência oriunda dos cárceres. O dispêndio
inútil de recursos para aprisionar poderia e deveria ser destinados para a
construção de uma sociedade mais justa, onde a educação e saúde de nosso povo.
Reformas legais têm sido feiras, mas não houve o desapego de juízes e membros do
Ministério Público ao sistema de privação de liberdade. Alternativas não faltam
às medidas privativas de liberdade tais como a medidas cautelares diversas da
privação de liberdade, a prisão domiciliar e as penas alternativas.
O custo
social e financeiro do encarceramento é muito elevado e retira do administrador
público a oportunidade de direcionar tais recursos para um combate mais eficaz
da criminalidade como a construção de escolas e universidades, o saneamento
básico de comunidades pobres e o implemento de políticas públicas que
privilegiem as pessoas mais vulneráveis como as crianças, os idosos e os
pobres.
Hoje o
sistema penitenciário tem sido habitado prioritariamente pela criminalidade
relacionada com o tráfico de drogas. Países há que estão experimentando
modalidades diversas de combate às drogas que não esse sistema proibicionista
que tem provocado tantas mortes de agentes de segurança pública, criminosos e,
sobretudo inocentes. A descriminalização do comércio de drogas e seu controle
pelo poder público, além de um sistema eficiente de tratamento de saúde dos
usuários e vítimas das drogas tem-se mostrado mais eficaz que o atual sistema,
responsável por quase 70% dos prisioneiros.
A
Constituição Federal preserva a liberdade como um bem fundamental a ser
preservado e a sua restrição apenas em casos excepcionais e devidamente
fundamentados pela autoridade judiciária competente. Enquanto houver
alternativas diversas da privação da liberdade essas devem prevalecer sobre o
encarceramento. Apesar dessa regra maior tem sido uma prática a internação de
jovens envolvidos com o tráfico de entorpecentes mesmo que não se trate de “ato
infracional cometido mediante grave ameaça ou violência à pessoa”, o que viola
expresso texto legal.
Nesse
contexto, a denúncia do Ministério Público, embora as mídias interessadas em
subtrair a verdade do público tenham noticiado incêndios, lesões corporais,
danos ao patrimônio público, porte de explosivos, dentre outros, é
exclusivamente pelo delito de quadrilha armada – artigo 288, parágrafo único do
Código Penal, cuja pena pode variar entre um e três anos de reclusão, podendo
ser dobrada. Ora, ainda que os acusados venham a ser condenados, na pior das
hipóteses a pena não ultrapassará dois anos por serem réus primários e de bons
antecedentes. Sabe-se que pela nossa legislação a condenação até quatro anos
pode e deve ser substituída por penas alternativas em liberdade.
Assim sendo
o que justifica manter presas pessoas que ainda que condenados, permanecerão em
liberdade? Prejuízo maior terá a sociedade se tais pessoas vierem
posteriormente acionar o Estado para que paguemos com os tributos que nos são
cobrados, indenizações por terem sido presos ilegalmente, apenas para saciar a
“fome de vingança” de setores raivosos, incapazes de raciocinar além do
noticiário indutivo.
No caso
concreto acrescente-se ainda que o próprio Ministério Público, fiscal da lei e
principal defensor da sociedade, afirmou expressamente nos autos de processo
contra dois dos acusados que “os indiciados não representam qualquer perigo
para a ordem pública, entende o Parquet que não se encontram presentes os
requisitos autorizadores da manutenção da custódia cautelar dos indiciados”…” o
Ministério Público é pelo deferimento do pleito libertário formulado em favor
dos indiciados CARJ e IPD`I.” Paulo José Sally – Promotor de Justiça.
Eis as
razões pelas quais, na hipótese as medidas cautelares aplicadas estão mais em
conformidade com a Constituição, as leis e a jurisprudência dos tribunais,
salvo melhor entendimento.
Fonte: Blog
do Siro Darlan