Terça,
13 de janeiro de 2014
Dois trechos da carta (íntegra na parte final da postagem) do senador Lauro Campos quando de sua saída/expulsão do PT, em abril de 2001:
"A este partido menor devo minha expulsão, que recebo de pé."
"Por outro lado, recebe dinheiro das empreiteiras, vendendo o silêncio e a complacência para com os assaltantes do erário, comprometendo-se implicitamente com a não apuração das maracutaias e tranquibérnias. O PT, infelizmente, levou a luta dos trabalhadores para os tapetes do Congresso, campo em que sempre vencem os ácaros e o mofo."
Dois trechos da carta (íntegra na parte final da postagem) do senador Lauro Campos quando de sua saída/expulsão do PT, em abril de 2001:
"A este partido menor devo minha expulsão, que recebo de pé."
"Por outro lado, recebe dinheiro das empreiteiras, vendendo o silêncio e a complacência para com os assaltantes do erário, comprometendo-se implicitamente com a não apuração das maracutaias e tranquibérnias. O PT, infelizmente, levou a luta dos trabalhadores para os tapetes do Congresso, campo em que sempre vencem os ácaros e o mofo."
"A dualidade que
divide o Partido é a de uma moralidade esotérica, intramuros, de uso interno e
limitado, e uma moral exotérica, com a qual se apresenta à imprensa..."
Textos extraídos da Fundação Lauro Campos
Quem foi Lauro Campos
Lauro Alvares da Silva Campos, casado, quatro filhos, nasceu em 14 de dezembro de 1928, em Belo Horizonte, Minas Gerais. Filho de Carlos Álvarez da Silva Campos e Maria das Dores Brochado Campos. Faleceu em 13 de janeiro de 2003.
Em 1953, concluiu o Curso de Ciências Jurídicas e Sociais na
Universidade Federal de Minas Gerais. Terminou em 1958 pós-graduação em
Economia do Desenvolvimento, na Universidade Pro DEO, em Roma, na Itália. O
título de Doutor em Ciências Jurídicas obteve em 1963, em concurso para
catedrático em Economia Política na Universidade Federal de Goiás, onde
lecionou também História do Pensamento Econômico.
Moeda, Crédito e Banco e Análise dos Problemas Sociais são
algumas das disciplina que ministrou na Faculdade de Ciências Econômicas da
Universidade Federal de Minas Gerais, entre 1954 e 1976. Proferiu aulas, como
visitante, na Universidade de Sussex, na Inglaterra, em 1976. Integrou o
Departamento de Economia da Universidade de Brasília, de 1966 a 1991, tendo passado
em 1971 ao corpo docente do Curso de Mestrado. Elaborou o projeto de criação e
a estrutura do Curso de Relações Internacionais da UnB.
Eleito, pelo Distrito Federal, Senador da República para o
período de 1995 a 2003, integrou como membro titular no Senado Federal a
Comissão de Assuntos Econômicos (desde 1995) e a Comissão de Relações Exteriores
e Defesa Nacional (a partir de 1999). Foi também titular da Comissão de
Educação (1995-1998) , na qual depois foi suplente, condição em que atuou na
Comissão de Assuntos Sociais (a partir de 1997). Participou também, como
suplente, das Comissões de Fiscalização e Controle (1995 – 1996) e de Serviços
de Infra-estrutura (1995 – 1998).
Crítico implacável
Formado em Direito e Economia, Campos sempre marcou seus
discursos com críticas implacáveis ao neoliberalismo e ao Fundo Monetário
Internacional (FMI). Em 2001, quando rompeu com o PT, não poupou munição ao
estilo light de Luiz Inácio Lula da Silva, então pré-candidato à presidência da
República.
Ruptura com o PT
Marxista, Lauro Campos filiou-se ao Partido dos
Trabalhadores (PT) em 1981. Pertenceu à ala esquerda do partido e foi por ele
que conseguiu eleger-se senador, em 1994, com 352.165 votos. Iniciou o mandato
no mesmo ano em que o então aliado Cristovam Buarque assumiu o Governo do
Distrito Federal. Oito anos depois, a atuação combativa no Senado e a
rivalidade adquirida com Cristovam levaram Lauro Campos a uma ruptura radical
com o PT.
O estopim foi a declaração do então presidente de honra do
partido, Luiz Inácio Lula da Silva, de que o ex-governador Cristovam Buarque
seria o ‘‘melhor candidato’’ petista ao Senado em 2002. Campos avaliou o
posicionamento de Lula como uma intervenção. ‘‘O que o Lula veio fazer aqui foi
me expulsar. Eu me considero expulso. Quem está expulso, não discute’’, disse
na época.
Ele queria concorrer à reeleição, mas tinha Cristovam como
adversário dentro do partido. Criou-se um racha interno. No auge da crise,
Lauro Campos chegou a declarar que o governo de Cristovam tinha sido pior do
que o de Roriz e admitiu que não havia votado no colega petista para a
reeleição ao GDF, em 1998.
Em 16 de abril de 2001, Lauro Campos deixou o PT e foi
acolhido na legenda do PDT de Leonel Brizola.
Decepção
‘‘Sob certo aspecto, o governo do Cristovam foi mais nefasto
(do que o de Roriz). Porque muita gente pensava que Cristovam fosse socialista,
petista, no sentido radical do termo. Para elas, a desmoralização e a decepção
com o Cristovam significam decepção com o socialismo. Mas ninguém pode se
decepcionar com o socialismo diante de um governo de Roriz. A desmoralização do
governo Roriz é muito menos grave que a desmoralização do governo do professor
Cristovam’’, criticou Lauro, em entrevista à imprensa em dezembro de 2001.
Obra
:: Controle econômico e controle social. (Tese)
:: A crise brasileira: dois séculos de permanência,
Humanidades, v. 3, n. 10, p. 15-32, ago./out. 1986.
:: A Crise da Ideologia Keynesiana. Rio de Janeiro: Campus,
1980. 335 p.
:: A crise de sobreacumulação e o imposto de renda negativo.
Folha de São Paulo, São Paulo, 6 de dez. 1991. Caderno Dinheiro, Seção Opinião
Econômica, p. 3-2.
:: A crise e a crise da previdência. Correio Braziliense,
Brasília, 28 de maio 1996. p. 17.
:: Darcy Ribeiro, o mágico. Folha de São Paulo, 2 mar. 1995.
p. 1-3.
:: Do parlamentarismo feudal ao burguês-aristocrático.
Momento Político, Brasília, v. 1, n. 5, p. 10, 30 abril 1992.
:: Do parlamentarismo feudal ao burguês-aristocrático-II.
Momento Político, Brasília, v. 1, n. 6, p. 6, 07 maio 1992.
:: Do parlamentarismo feudal ao burguês-aristocrático.
Momento Político, Brasília, v. 1, n. 11, 14 maio 1992.
:: Do parlamentarismo feudal ao burguês-aristocrático.
Momento Político, Brasília, v. 1, n. 8, p. 10, 21 maio 1992.
:: Do parlamentarismo feudal ao burguês-aristocrático.
Momento Político, Brasília, v. 1, n. 10, p. 4, 4 junho 1992.
:: Errando também acerta. Jornal de Brasília, Brasília, 17
março 1996. p.2.
:: “Inflação: ideologia e realidade”. Discursos.
:: FHC: a fome, o desemprego, a concentração da renda e o
sucateamento das estatais como soluções falsas para uma crise que se aprofunda.
Brasília: Senado Federal, Centro Gráfico, 1996. 56 p.
:: FHC e a reforma administrativa. Correio Braziliense,
Brasília, 20 maio 1996. p.9
:: Globalização e sobreacumulação. Correio Braziliense,
Brasília, 13 maio 1996. p.9
:: A inflação disfarçada de FHC. Jornal de Brasília,
Brasília, 21 fev. 1995. p. 2.
:: Inflação, ideologia e realidade. Tese.
:: Malthus e Keynes: duas almas gêmeas, irmanadas na defesa
do capitalismo. Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1980. 61 p. (texto
para discursão, n. 65).
:: Mecanismos de sustentação do crescimento: o terciário.
Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1973. (texto para discussão, n.
13).
:: Mecanismos de sustentação do crescimento II: as agendas.
Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1974. 52 f. (texto para discussão,
n. 13).
:: Moeda e produção. Brasília: Fundação Universidade de Brasília,
1991.
:: O mundo dos tijolos. Jornal de Brasília, 29 maio 1995. p.
2.
:: Narciso e o espelho político. Momento Político, Brasília,
v. 1., n. 17, p. 10, 26 ago. 1992.
:: Narciso e o espelho político II. Momento Político,
Brasília, v. 1., n. 21, p. 6, 8 out. 1992.
:: Palavras certeiras. Brasília: Senado Federal, Centro
Gráfico, 1995. 144p.
:: O PT frente a crise do capitalismo. Brasília: [s. n.],
[199-].
:: Saúde: diagnóstico do diagnóstico. Brasília: Senado
Federal, Centro Gráfico, 1996. 13 p.
:: Uma apresentação da economia política do não. Brasília:
Fundação Universidade de Brasília, 1983. 48 f. (texto para discussão, n. 111).
:: Uma crise e vários diagnósticos: o caos brasileiro.
Brasília: Fundação Universidade de Brasília, 1982. 61 f. (texto para discussão,
n. 96).
Obituário
Morre o senador Lauro Campos
Crítico ferrenho da política neoliberal e do Fundo Monetário
Internacional(FMI), o senador foi velado, a partir das 10h de 14 de janeiro de
2003, no Salão Negro do Congresso Nacional. O enterro foi à tarde na ala dos
pioneiros no Campo da Esperança.
Discursos inflamados e uma crítica feroz ao capitalismo
foram características marcantes da carreira do senador Lauro Campos (PDT).
Derrotado nas urnas em 6 de outubro de 2002 e debilitado por causa de um
infarto sofrido quatro dias depois das eleições, Lauro Campos morreu às
14h30min de 13 de janeiro de 2003, no Instituto do Coração (Incor), em São
Paulo. A assessoria de imprensa de Campos informou que ele morreu em decorrência
de uma infecção hospitalar.
O senador sofreu um infarto no dia 10 de outubro de 2002, no
plenário do Senado. Levado às pressas para o Hospital Santa Lúcia, não precisou
ser operado. Mas teve várias complicações em seu estado de saúde durante o
tratamento. Os remédios provocaram comprometimento das funções renais e
hepáticas de Lauro Campos e o levaram a outras internações. No dia 10 de
dezembro, a família decidiu transferi-lo para o Incor. Campos passou o
aniversário de 74 anos, comemorado no dia 14 de dezembro, internado.
Na véspera do Natal, a equipe médica do Incor deu alta ao
senador, mas ele nem chegou a ir para casa. Uma febre levantou a suspeita de
infecção e obrigou-o a permanecer internado. A partir daí, seu estado de saúde
só piorou. A febre não cedeu com medicação. Ele teve de ir para a UTI e
permaneceu em coma induzido por vários dias até morrer.
O advogado Ulisses Riedel de Resende assumiu a vaga de Lauro
Campos no Senado por 17 dias, até a posse dos senadores eleitos em 2002.
Repercussão
‘‘O cenário político brasileiro e o PDT perderam um de seus
maiores expoentes: o senador Lauro Campos. É com muito pesar que recebo a
notícia de seu falecimento.”
Miro Teixeira (PDT), Ministro das Comunicações
Miro Teixeira (PDT), Ministro das Comunicações
‘‘Lauro Campos sempre lutou por seus ideais. Mesmo
divergindo de suas idéias, aprendi a respeitá-lo e a admirar sua postura
intransigente na defesa de suas idéias. É uma perda para o Distrito Federal.’
Joaquim Roriz, Governador do DF
Joaquim Roriz, Governador do DF
‘‘Estou convocando todos os militantes do partido para
participar das últimas homenagens ao senador, um homem sério, competente e
lutador. É uma liderança nacional do DF que sempre foi motivo de orgulho para o
PT.’’
Wilmar Lacerda, presidente do PT-DF
Wilmar Lacerda, presidente do PT-DF
‘‘Era uma pessoa íntegra, ligada aos princípios
democráticos. Com um comportamento claro e decidido, manteve o discurso de
oposição ao governo passado. A oposição perdeu um ferrenho defensor’’
Lindberg Cury (PFL-DF), Senador
Lindberg Cury (PFL-DF), Senador
‘‘Ele foi um homem muito correto, que prestou um grande
serviço a Brasília e ao Brasil’’
Paulo Octávio (PFL-DF), Senador
Paulo Octávio (PFL-DF), Senador
Fonte: Correio Braziliense, 14/01/2003
LAURO CAMPOS (1928-2003)
A homenagem que a mídia não fez
Ivo Lucchesi (*) — Observatório da Imprensa
Corretíssimo está o jornalista Alberto Dines quando defende
radicalmente a inexistência de qualquer censura à imprensa. Não menos certo, ao
afirmar que, em lugar da censura, há de vigorar o permanente estágio de vigília
crítica sobre os passos dados pela mídia, sendo, aliás, esta a função do OI. É,
portanto, perseguindo tal propósito que não se pode deixar de registrar omissão
recente.
É sabido de longa data que, resguardadas as exceções de
sempre, a parceria entre mídia e intelectual é, no mínimo, tensa ou conflitiva,
principalmente no Brasil das últimas três décadas. É possível que a
responsabilidade caiba a ambas as partes. A apuração mais criteriosa acerca
desse fato requereria escrita de outra ordem. No caso, pretende-se apenas
assinalar o melancólico tratamento jornalístico que a “grande imprensa”
destinou ao falecimento, em 13 de janeiro deste ano, de um dos mais ilustres,
talvez o mais completo, membro do Senado: refiro-me ao senador Lauro Campos
(PDT-DF). Nele se harmonizavam a envergadura intelectual, a retidão do caráter
e a combatividade, cuja origem provinha de alentados estudos e de não menos
enraizadas convicções. A cada participação na tribuna, correspondia uma
riquíssima aula para uma platéia nem sempre à altura. Enfim, o senador
permitia, com sua retórica, que outros absorvessem um pouco mais de
conhecimento, ainda que, para a maioria, o fosse desnecessário. A “grande
imprensa” nada lhe dedicou fora de burocráticos e habituais obituários.
Perdeu-se oportunidade, como poucas, para enaltecer-se a figura de um político
destituído de qualquer sombra inoportuna capaz de acinzentar-lhe a luminosa
trajetória de décadas.
Pobre jornalismo aquele que não desenvolve a sensibilidade
para perceber quando, de maneira efetiva, pode tornar-se um instrumento de
ativa contribuição para o caráter nacional. Sabendo-se que, para a maioria da
população, a figura do político não goza da mais plena credibilidade (e não
faltam razões para isso), essa era a hora de oferecer-se a essa mesma população
o contraponto, evitando a corrosão progressiva e de efeitos perigosos a todos.
É óbvio que propinas desviadas para a Suíça devam merecer diligente
acompanhamento e intensa investigação. Todavia, esse foco não exclui o
reconhecimento de quem, na vida pública, exerceu sua função com mais plena
dignidade. Infelizmente, a morte do senador passou ao largo, em simplórias e
marginais matérias informativas. Que pena.
Mídia e o político intelectual
O negligenciamento com o qual a mídia tratou o falecimento
do senador não difere daquele que ela lhe conferiu em vida. Afora episódicas
aparições, por conta de livros publicados, Lauro Campos, ao longo de seus
mandatos, jamais foi escolhido para ser exposto a refletores ou a gravadores.
Em outras palavras, não era o político palatável ao tempero midiático,
diferentemente de outros que sempre estão na vitrina. Por outro lado, nenhum
fato ao redor da vida do senador oferecia enredo interessante para uma novela
lacrimejante ou de perfil detetivesco. Ou seja, por ser correto e intelectual,
não poderia ser contemplado com o benefício do suporte midiático, sempre à
espreita do próximo escândalo ou desvio de conduta. Volto a frisar: nada contra,
mas que se realce a outra face, sob pena de sucatear a ainda frágil democracia
brasileira.
Outro ponto merece comentário. O descaso da mídia já fora
antecipado pelo alto escalão do PT, partido do qual, desde a fundação, Lauro
Campos fora signatário – elo que teve de ser desfeito quando, em abril de 2001,
a cúpula do PT achou mais oportuno optar pelo nome de Cristovam Buarque. Ao
então senador Lauro Campos não restou outra opção além da saída. Triste do
partido que para preservar um perde outro. Feliz do partido que pode escolher
entre dois belos nomes. A realidade, por vezes, cria injustas injunções… O
emérito professor de Economia Política da UnB acabou ingressando no PDT. Com a
nova legenda, o senador conheceu a amarga recusa do eleitorado do Distrito Federal,
que preferiu, além da merecida vaga obtida por Buarque, dar a outra ao senhor
Paulo Otávio (PFL). Lauro Campos foi relegado à humilhante quarta votação nas
eleições de outubro passado. Enfim, desvios do jogo eleitoral produzem
distorções que exigem acatamento. Tomara que os eleitores brasilienses não se
arrependam tardiamente. Afinal, eles poderão consolar-se com os eleitores
cariocas que levaram ao Senado o “amado pastor”, deixando de fora nomes como o
de Leonel Brizola e Artur da Távola (Paulo Alberto Monteiro de Barros). É
curioso que, entre os três excluídos, algo de comum haja: história e
conhecimento.
Entre o casamento e o divórcio
O que efetivamente aqui se está tentando pontuar é o
divórcio entre a mídia e o intelectual. Que razão obscura insiste em lançar ao
ostracismo aquele que criticamente se posiciona? Que mal profundo a voz
independente pode produzir à rede corporativista? Quais concessões são exigidas
pela mídia para, em troca, dar visibilidade? Nesse momento da vida brasileira
em que se mobiliza o sentimento de “esperança” e de “transformação” (será?),
talvez se faça oportuna uma revisão profunda quanto a certos procedimentos e
compromissos.
Em clima de injetada esperança – e que não seja traída por
enganosas mudanças –, não será papel da mídia, ao invés de diariamente
focalizar abraços e beijinhos, casar-se com o refortalecimento da inteligência,
como valor com o qual uma nação possa aspirar à efetiva autonomia? Será, por
outra, que a mídia (ou, pelo menos, a “grande imprensa”) insistirá em joguinhos
de “disse-me-disse” e outras picuinhas mais? Está aí. A hora para mudança é
agora. Recusada, vingará, como sentença, a afirmação de Lauro Campos, quando de
seu desligamento do PT: “Não há mais uma consciência crítica”.
Ainda que a mídia não venha a fazer a sua parte no “pacto da
mudança”, poderá o (e)leitor colaborar consigo mesmo lendo três primorosas
obras desse mais que senador – um intelectual dedicado ao aprimoramento do
pensamento crítico. Em 1980, Lauro Campos publicou A crise da ideologia
keynesiana; em 1991, O PT frente do capitalismo. Por fim, em 2001, em obra à
qual o senador intelectual dedicou mais de década de estudos e revisões, foi
lançado A crise completa: a economia política do não. Sem dúvida é sua obra
mais completa e madura, na qual sinaliza horizontes preocupantes com base em
criteriosa análise sobre os rumos econômicos e políticos da contemporaneidade,
destacando o “império das não-mercadorias”.
No mais, fique o agradecimento por uma vida exemplar, como
intelectual e político. Lauro Campos era o símbolo que melhor encarnava a
relação entre o conhecimento e sua destinação pública. O lamento profundo é o
de saber que os espaços da política brasileira não foram justos quanto ao
potencial de uma figura pública tão preparada quanto – da maioria –
desconhecida. Que mais poderá haver a lamentar, sob a atmosfera dos alegres
“Tristes Trópicos”?
(*) Ensaísta, doutorando em Teoria
Literária pela UFRJ, professor-titular da Facha, co-editor e participante do
programa Letras & Mídias (Universidade Estácio de Sá), exibido mensalmente
pela UTV/RJ
Fonte: Observatório da Imprensa
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Leia adiante a íntegra da carta de Lauro Campos ao sair (ser expulso) do PT.
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Leia adiante a íntegra da carta de Lauro Campos ao sair (ser expulso) do PT.
Brasília, 15 de abril
de 2001
Exmo. Sr.
Deputado José Dirceu
Presidente do Partido
dos Trabalhadores
Com sofrimentos e
decepções crescentes, padecidos por mais de vinte anos de militância no Partido
dos Trabalhadores, venho, pela presente, declarar que aceito a expulsão que
V.Sª e o presidente "de honra" (sic) do PT fizeram recair sobre minha
modesta pessoa.
Esquadrinhando a
memória, concluí que a intervenção executada pela segunda vez no PT - DF, pela
cúpula nacional - por meio das declarações de Luis Ignácio em matéria do dia 12
no Correio Braziliense - e que teve por objetivo coarctar o processo de livre
escolha dos candidatos aos cargos majoritários, evidencia que a ditadura pelega
e intelectualóide que se instaurou no PT venceu arrasadoramente. "Aos vencedores,
as batatas", repito, machadianamente.
Reconheço que a crise
completa do capitalismo desfoca, confunde e "coloca o mundo de cabeça para
baixo", na conhecida e feliz determinação de Marx, aquele que foi expulso
das estantes e da prática petistas. A crise do capital revela a natureza
oculta, latente e real do sistema, como ocorre quando o chão lamacento e
acomodado de um lago tranqüilo e límpido é revolvido pela agitação externa.
Mário Covas disse que
o "PSDB é, hoje, o anti-PSDB". O PT, desejando vencer ou vencer,
sequioso por se tornar confiável às "elites bandidas" (Rubem
Ricúpero), confiável aos credores internacionais, aos latifundiários, aos
militares e aos banqueiros caboclos sobreviventes, proerizados, adota novas e
amareladas bandeiras, plagiadas do PSDB ou empunhadas pelo PFL.
Apóia, por um lado, o
salário mísero de 180 reais por mês, acinte aos trabalhadores da base aos quais
o PT cupulista e elitizado adere com paixão traiçoeira e acrítica. Por outro
lado, recebe dinheiro das empreiteiras, vendendo o silêncio e a complacência
para com os assaltantes do erário, comprometendo-se implicitamente com a não
apuração das maracutaias e tranquibérnias. O PT, infelizmente, levou a luta dos
trabalhadores para os tapetes do Congresso, campo em que sempre vencem os
ácaros e o mofo.
O PT é obrigado a
adotar uma dupla e falsa ética ao desconhecer as diferenças entre a moral do
capital e a ética dos trabalhadores. A dualidade que divide o Partido é a de
uma moralidade esotérica, intramuros, de uso interno e limitado, e uma moral
exotérica, com a qual se apresenta à imprensa e que o obriga a pedir CPIs e
defender uma certa assepsia administrativa e política, cada vez mais rala na
prática.
O Partido dos
Trabalhadores, ao se neoliberalizar, adotou o enxugamento e a desestruturação:
a partir de 1988 desmanchou sua estrutura democrática e arejada, baseada em
núcleos, comitês e em ligação com os sindicatos - embrião dos sovietes
democráticos e da socialização do exercício do poder político. A despetização
do Partido e o medo da proximidade com a CUT enfraqueceram o movimento e a
organização dos trabalhadores, no momento em que todas as forças da crise e da
dita modernização se abatiam sobre a classe espoliada.
Várias versões
mentirosas e que visam justificar a globalização da espoliação - como a que
afirma a possibilidade de "globalização sem exclusão", tão verdadeira
quanto a existência de um fogo que não queima ou de uma chuva que não molha -
são oficializadas pela cúpula. Entre as desculpas covardes, destaca-se a de que
os trabalhadores brasileiros merecem o desemprego porque não conseguiram se
modernizar, pôr-se à altura das novas tecnologias. Culminam com a necessidade
de enxugar o custo Brasil em nome do aumento da competitividade e das
exportações. Prefere-se ignorar que estas foram bloqueadas pela política
cambial de FHC que sobrevalorizou o real, trancando as exportações e abrindo o
mercado interno para a onda de mercadorias subsidiadas que arrasaram os
empregos e sucatearam o parque industrial nacional.
Em
vez de criticar a política do governo federal, o PT acrítico freqüentava o
Alvorada na figura do dócil Cristovam Buarque, que, até a última hora, esperou o
apoio de FHC à sua recandidatura a governador do DF. Quando o dito PT da
bolsa-escola e dos vales compensatórios governava o DF, pela primeira vez na
história política do Distrito Federal Lula deixou de ser o mais votado na
Capital, para amargar um último lugar, menos votado do que Ciro Gomes.
Minha expulsão do PT
começou com as desgovernanças do neoliberal Cristovam Buarque, contra as quais
protestei em desgraça. Sei que fui expulso pelo que fiz e defendi a favor dos
trabalhadores, dos aposentados e dos marginalizados, contra os interesses
eleitoreiros de um partido que deseja tornar-se confiável às classes e forças
burguesas perdidas e ainda bem pagas.
É com orgulho de quem
tem a consciência do dever cumprido que me apresentei como pré candidato ao
sacrifício de uma disputa desigual, pobre, sem acesso à mídia, luta que se
travará no campo de batalha desacreditado pela derrota recente de Cristovam
Buarque e pela benevolência de seu governo neoliberal, preocupado em tornar-se
confiável e aliar-se a FHC, adversário de Lula. A este partido menor devo minha
expulsão, que recebo de pé.
Lauro Campos
Senador da República