Terça, 8 de novembro de 2016
Camila Boehm – da Agência Brasil
De acordo com a Defensoria Pública do Estado de São Paulo, 43,2%
dos homens (4.064) e de 30,5% das mulheres (276) que entraram nos Centro
de Detenção Provisória (CDP) da Grande São Paulo durante o ano passado
disseram ter sofrido violência (verbal, ameaça ou agressão física) no
momento da prisão. Os dados são foram coletados nos CDPs da capital,
mais Guarulhos e Franco da Rocha.
“O que surpreende é o índice
muito elevado de maus-tratos, de violência no momento da prisão, isso é
um índice intolerável em um estado democrático e que todas as
instituições públicas têm que ter um olhar especial para isso”, disse a
defensora pública Juliana Belloque em audiência pública na noite de hoje
(7) que divulgou dados referentes aos presos provisórios.
Entre
janeiro e outubro de 2015, pelo menos 93 presos provisórios fizeram
menção explícita ao uso de choques elétricos no momento da prisão em
flagrante. Desses, 26 já tinham passado por audiência de custódia, mas
somente nove reportaram a tortura na ocasião. Esses nove casos foram
encaminhados para apuração e um teve conclusão até hoje, que foi o
arquivamento por falta de provas. Os outros seguem o processo de
apuração.
Subnotificado
De acordo com o
assessor jurídico da Pastoral Carcerária, Paulo Malfezzi, muitos dados
de violência e tortura deixam de ser notificados. “Achamos que esses
dados são subnotificados, porque, na verdade, na audiência de custódia,
alguns presos não dizem terem sido agredidos de alguma forma, eles
preferem não falar, afinal de contas eles estão em um lugar repleto de
policiais, juízes, promotores e é um ambiente pouco confortável para
realizar denúncias”, disse.
“Já teve casos que acompanhamos no
sistema prisional em que o preso também não relatou as agressões para o
defensor público por não entender aquela relação, quem era aquela
pessoa, o que ele poderia fazer por ela, é uma questão também do
atendimento. Então há casos de violência em que a pessoa sequer relata
para o defensor público”, disse Malfezzi.
Segundo o assessor da
Pastoral, muitos presos não acreditam que os agentes agressores serão
responsabilizados pelo Estado e esse é um dos motivos da falta de
denúncia. “É muito difícil que algum agente público seja
responsabilizado, então as pessoas preferem se calar. É provável que
esse número de mais de 40% de presos que relataram agressões seja muito
maior, mas de fato é um dado que mostra o que a Pastoral Carcerária tem
dito: o sistema penal é eminentemente violento, eminentemente
torturador”, disse.
Audiência de custódia
Em
média, 20,7% das pessoas atendidas pela defensoria obtém a liberdade.
“Em uma avaliação geral, percebemos que é um montante muito
significativo que permanece preso mesmo depois dos pedidos de liberdades
feitos pela Defensoria Pública. O juiz opta pela prisão preventiva como
uma regra nos casos que são do público-alvo da defensoria: pessoas
pobres, presas por crimes patrimoniais, às vezes sem violência, às vezes
crimes de roubo, mas sempre pessoas que não conseguiram recursos
financeiros para contratar um advogado”, disse Juliana. “Como conclusão,
estamos aumentando o encarceramento cada vez mais, entra mais gente do
que sai”.
No entanto, a defensora pública falou do benefício
trazido pelas audiências de custódia, em que o preso provisório passa
por um juiz em até 24 horas da prisão para avaliar se a prisão
preventiva é mesmo necessária. “Nessa perspectiva de futuro, a audiência
de custódia foi um mecanismo muito bom que, de fato, tem o potencial de
começar a produzir uma mudança dessa cultura judiciária da prisão
preventiva enquanto regra.”
Perfil do preso provisório
Mais
de 60% das pessoas presas provisoriamente têm até 29 anos de idade:
62,3% dos homens e 60,7% das mulheres. Em cerca de 80% dos casos, as
pessoas atendidas em CDPs não contam com advogados constituídos,
dependendo de um defensor público.
Pretos e pardos representam
65,1% dos homens presos em CDPs. No caso das mulheres, pretas e pardas
representam 64,5% das presas provisórias. 75,5% das mulheres e 54,8% dos
homens informaram ter filhos.