Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 30 de julho de 2018

A desproporção de uma política radical

Segunda, 30 de julho de 2018
Por
Pedro Augusto Pinho 
Certos eventos, algumas manifestações populares, tem o poder de despertar, fazer aflorar o que de mais primitivo, os mais arraigados preconceitos e a maior ignorância sobre fatos, possa existir nas pessoas.

O exemplo mais recente foi a realização, em Havana, da 24ª reunião do Foro de São Paulo, criado em julho de 1990.

Os anos 1980 foram de fundamental importância para a luta que o capital financeiro travava com o capital industrial. A designação de Margaret Thatcher – para Primeira Ministra do Reino Unido (UK), em 1979 (duraria até 1990) – e a eleição de Ronald Reagan – para Presidente (1981-1989) dos Estados Unidos da América (EUA) – levaram às desregulações de toda a atividade financeira – nestes importantes centros mundiais (Londres e Nova Iorque) – e proporcionaram a incontestável vitória da especulação sobre a produção.

Voltemos um pouco, neste século passado, para entender as estratégias do capital financeiro. As duas guerras mundiais, onde o industrializado EUA despontou como novo império, levaram o capitalismo financeiro, verdadeiro poder no UK, a desenvolver novas estratégias.

Uma foi se aliar aos movimentos ecológicos e preservacionistas, para elevar  custos ou reduzir, quando não inviabilizar, a obtenção de insumos minerais e agrícolas para a indústria. Outra foi patrocinar o debate e as manifestações sobre questões transversais. O capital financeiro esteve igualmente por trás, mesmo quando não desejado, das lutas pela igualdade de gênero, de raças, das opções sexuais. Obteve assim algum beneplácito e mesmo apoio das “esquerdas”. Não havia qualquer objetivo humanitário, simples questão de luta pelo poder.

Também estratégia da banca (como designo o capital ou sistema financeiro) foram as crises. O petróleo, produto fundamental da civilização do automóvel, começou a sofrer esta ação de empoderamento objetivando o déficit de oferta e aumento de preço. O capitalismo financeiro coloca recursos em guerras árabes-israelenses (1967 e 1973) que levam o preço do barril de petróleo de um dólar a USD 11,50. Brutal aumento em apenas seis anos, com reflexo na inflação e no consumo industrial.

E, como cereja no bolo da banca, em 1979, a instauração da República Islâmica do Irã consolida novo patamar do preço do petróleo, quase 20 vezes superior ao de 13 anos antes.

Todas estas modificações e suas consequências políticas levaram a se reunir, em 1990, os partidos de esquerda da América Latina, alguns saídos de ditaduras e outros com o governo conquistado pela banca, para uma reflexão conjunta sobre o mundo que surgia. O Foro de São Paulo é uma reunião aberta, que a imprensa participa, nada há de oculto ou sigiloso. Dele participam chefes de Estado e personalidades conhecidas em todo mundo.

Já a direita (aqui entendida como o sistema financeiro internacional, controlado por menos de uma centena de famílias) não se encontra de forma aberta e conhecida por todos, mas em reuniões secretas, fechadas, sigilosas, que, hoje, ainda pouco conhecemos.

Um dos trabalhos que procura desvendar a banca não se encontra em livrarias, nem em sites de busca ou em sebo. Refiro-me ao raríssimo “El Cerebro del Mundo – La cara oculta de la globalización”, de Adrian Salbuchi.

Nele ficamos sabendo dos verdadeiros propósitos e das ações do Council on Foreign Relations Inc., da Royal Institute of International Affairs, War&Peace Studies Project, The Trilateral Commission and Elite Planning for World Management (ambicioso título), do Grupo Bilderberg, da Sociedade de Mont Pèlerin e dos bastidores de reuniões abertas, como o Foro de Davos, na Suíça, e das ações dos serviços secretos dos EUA e UK.

Num e-mail que desanca o Foro de São Paulo, o missivista escreve que aquele encontro busca “subverter valores tradicionais de seus povos, acumulados por diversidades históricas e de seus espaços geográficos”.

Batman ouviria de Robin: Santa Ignorância!

Vejamos o Brasil, em princípio conhecido por todos nós. O processo colonial no Brasil se deu com o genocídio indígena e o escravismo negro. Devem ser estes valores que se pretenda cultivar, manter?

Uma das obras primas da literatura brasileira é, sem dúvida, “Macunaíma”, de Mário de Andrade. Nele se vê, claramente, que o trabalho foi desconstruído como valor pelos que se denominam “elite brasileira”, pelo império da “boa sociedade”. O maior sociólogo brasileiro vivo, Jessé Souza, conclui de suas pesquisas que resulta daí o ódio aos pobres, ódio aos trabalhadores, operários, domésticos que a classe média mais favorecida extravasa em passeatas pelo golpe, em manifestações de repúdio aos direitos sociais.

O aplauso com que a Associação Comercial do Rio de Janeiro acolheu Jair Bolsonaro e, dias depois, agride a presença de Ciro Gomes é a significativa confissão desta “elite”.

Nossa história é vergonhosa; de escravidão racial por mais de três séculos, de subserviência ao capital, ontem inglês, depois estadunidense, e, hoje, ao apátrida, dos paraísos fiscais. Da sempre corrupta elite, aliada ao estrangeiro, no modelo exportador dependente de produtos primários, fraudadora de impostos.

Nunca li, nestes ataques ao Foro de São Paulo, ao Partido dos Trabalhadores (PT), nenhum argumento, nada que não fosse slogan, aplicados indistintamente aos países socialistas ou comunistas ou a autores marxistas. Sempre adjetivos, palavras de ordem, nenhuma reflexão histórica, filosófica ou sociológica.
Ou será que “rolo compressor liderado pela corrupção deslavada, pelo aparelhamento do Estado, pelo carreirismo leniente e pela concessão de odiosos privilégios” com que o mesmo missivista se refere ao PT seja “argumento”? E, neste caso, como faltam conhecimentos da história do Brasil, como faltam informações sobre a forma de conduzir Estados Nacionais em regime de coligações políticas, das coabitações, do semipresidencialismo nas repúblicas de Weimer, da França, em várias oportunidades, e de outras democracias ocidentais.

Certamente o autor é adepto do partido único, da imposição unilateral de vontades, de um horror classista à democracia.

Na verdade ele me inspira alguns motes de campanha, ideais para seu candidato, seja o Geraldo Alckmin (continuador da Pinguela para o Passado) ou o Jair Bolsonaro (armas para todos; também para o MST?): “Escravidão Já, Chega de Folga”; “Ao Capital, tudo; ao trabalho, nada”; “A volta de um Brasil rentista e escravista” (que ficaria maravilhoso se o Orleans e Bragança viesse a ser o vice do Bolsonaro, pois o Império foi o tempo da escravidão e dos empréstimos ingleses).

Não me rotulem de petista, lulista, comunista, pois não estarão com a verdade. E com a independência que sempre busquei e me é suficiente, com a preocupação pelo Brasil, onde vivo e viverão meus descendentes, que me desgosta esta situação a qual o golpe de 2016 levou minha Pátria.

A mídia hegemônica, antinacional e corrupta, com um desmoralizado judiciário prendem o candidato, o único cuja manifestação de voto daria a vitória pela maioria absoluta da população, capaz – o que já demonstrou – de equilibrar interesses contraditórios do rentismo da banca, da produção do capitalismo industrial, das aspirações dos trabalhadores e da existência mais digna dos miseráveis.

E deixa em liberdade os envolvidos com o tráfico de drogas (PSDB, PP), com apartamento-cofre de dinheiro (MDB), com a exploração religiosa da ignorância popular (vide o bilionário Bispo Macedo do PRB) e com a entrega das riquezas e do patrimônio nacional às empresas estrangeiras e do território brasileiro para administração de outro país (PSDB, DEM, MDB, PP, PSD, PRB, PTB, PR, PSL, Solidariedade).

Mas a culpa é do Foro de São Paulo (!).

Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado