Sexta, 1 de outubro de 2010
Por Ivan de Carvalho

Caetano Veloso tem suas próprias razões, das quais, aliás, não discordo. Muito pelo contrário. “Eu torço para que tenha segundo turno. Porque o tom que Lula e Dilma estavam na campanha, ela insuflada por ele, era um pouco desmedido. E até irrealista. Eufórico demais. Não era bom. Não era bom que fosse uma eleição no primeiro turno, e uma presidente fosse empossada nesse tom”, disse o compositor.
E explica com absoluta clareza seu raciocínio. Em sua opinião, a realização de segundo turno daria “uma sensação de que há críticas, há gente de olho, há dúvidas na sociedade, que a vida é mais complexa. Aquele negócio de Lula pensar que pode dizer tudo quando chega no comício não é bom. Se a eleição se definisse nesse tom, seria um sintoma de que o Brasil realmente estaria em uma regressão populista primária, que eu suponho que o Brasil não tenha mais idade para estar”.
Creio que é exatamente isto e mais alguma coisa. A vitória em primeiro turno de uma candidatura simplesmente inventada pelo presidente Lula – beneficiados ambos pela imensa popularidade deste último e pela boa avaliação que a grande maioria do eleitorado faz do governo – daria ou dará a impressão de que não existe nem existirá barreira, oposição a qualquer coisa que venha a fazer, se vencedor em primeiro turno, o futuro governo do PT e aliados – estes, talvez, com o tempo, tornando-se perfeitamente descartáveis.
O segundo turno, como observou Caetano Veloso – que, pelo que tem dito ocasionalmente, parece ter consciência política mais bem formada e acurada do que a grande maioria dos políticos brasileiros – será ou seria capaz de mostrar, se vitoriosos, como quase certamente seriam, os atuais governistas na segunda fase do pleito, que há oposição, há resistência, há divergência democrática, há barreiras e diques contra eventuais malfeitorias, a exemplo de algum populismo autoritário.
Até porque populismo autoritário é coisa muito em moda na América do Sul e ligeiramente ensaiada em alguns recentes momentos da campanha eleitoral no Brasil, sob a regência do presidente da República, como diz ele, fora da “hora do expediente”, como se presidente da República tivesse dispensa do expediente em algum momento sem passar o cargo ao vice.
2. O presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro César Peluzo, disse tudo em poucas palavras, ao votar pela manutenção legal da exigência de dois documentos (o título eleitoral e um documento oficial com fotografia) para votar. Ao decretar, por ampla maioria (oito votos contra dois) que, apesar de obrigatório o título, o eleitor pode votar sem ele, apenas com um documento com foto, o STF estava determinando “a extinção do título de eleitor”.
O título de eleitor ainda não foi sepultado. Mas já está morto. Você não precisa se preocupar em procurá-lo no fundo do baú. Pegue sua cédula de identidade, vá e vote.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.
Ivan de Carvalho é jornalista político baiano.