Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sábado, 23 de outubro de 2010

A recuperação de Dilma

Sábado, 23 de outubro de 2010 
Por Ivan de Carvalho
    As pesquisas divulgadas nesta semana pelos quatro principais institutos de sondagem de opinião pública que atuam no ramo eleitoral (o Gallup, o mais renomado do mundo, há anos desistiu de operar em pesquisas eleitorais no Brasil) dão a impressão, quase convicção, de que foi reduzida severamente a expectativa de se ter uma eleição presidencial de resultado incerto no dia 31.
    Claro que não dá para dizer que a candidata do PT, Dilma Rousseff, já ganhou. Afinal, muita gente andou dizendo isso sobre à eleição dela já no primeiro turno e o que se viu foi ela, com o PT e o governo, caírem do cavalo e terem que prosseguir na corrida para a votação em segundo turno.
    Convém, por isto, fazer sempre as devidas ressalvas. O incidente (agressão pela militância do PT) ocorrido com o candidato da oposição, José Serra, em Campo Grande, cidade do Rio de Janeiro, é o tipo de fato que, não isoladamente, mas somado a outros, poderia ter o potencial de equilibrar a balança.
     Mas o fato é que, depois de ficar quase equilibrada nos dias que sucederam à votação em primeiro turno, a balança está no momento desequilibrada em favor da candidata petista e não existem fatos previstos ou previsíveis capazes de restabelecer o equilíbrio. Hoje, Dilma é favorita e José Serra é o azarão. Se ganhar, é zebra.
    Uma breve tentativa de entender o que ocorre. A petista Dilma, apesar das opiniões em contrário dos institutos que fizeram pesquisas eleitorais, passou a segunda quinzena de setembro perdendo votos. Principalmente por causa de quatro fatores:
1) o caso de corrupção (tráfico de influência, propina) que atingiu a própria Casa Civil da presidência da República e envolveu a então ministra-chefe Erenice Guerra, “braço direito” de Dilma Rousseff.
2) a questão religiosa, que mobilizou setores católicos e evangélicos, envolvendo questões como a descriminalização do aborto, a criminalização da “homofobia” – gerando aqui o temor de cerceamento da liberdade religiosa –, entre outros temas.
3) a descoberta dos eleitores de que a candidatura de Marina Silva poderia ser a opção para os votos dos eleitores que não tinham entusiasmo nem por Dilma nem por Serra.
4) a linguagem e a postura agressivas e autoritárias do presidente Lula nos palanques, agredindo principalmente a imprensa – cuja avaliação,k segundo as pesquisas de opinião pública, rivaliza com a sua – e reavivando o temor de que o PT venha a por em prática sua diretriz programática de censura à imprensa (sob o nome “controle social da mídia”, lobo vestido em pele de cordeiro).
   Bem, no momento quase não se fala no Caso Erenice, que a Polícia Federal engavetou, o PT e o governo fizeram e continuam fazendo uma grande ofensiva para contornar a questão religiosa (a ponto de o bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus, que apóia Dilma, defender literal e abertamente o aborto – vídeo na Internet), os eleitores de Marina já se acomodaram e Lula mudou a linguagem, parou de ameaçar, como vinha fazendo quando, na campanha do primeiro turno, imaginava que ninguém poderia tirar a vitória de sua candidata.
   Daí, Dilma consegue se recuperar.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia deste sábado.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.