Terça, 30 de novembro de 2010
Por Ivan de Carvalho
Já existe na Bahia uma organização da atividade criminosa, que pode ser considerada incipiente somente se comparada ao que acontece no Rio de Janeiro, exemplo máximo no Brasil.
A criminalidade na Bahia tem muitos segmentos, inclusive aquele mais ligado ao comércio de drogas ilegais, para o qual já existe uma estrutura razoável.
O cidadão dependente ou viciado (é a mesma coisa) simplesmente pode dar um telefonema de sua casa e minutos depois estará recebendo, devida e discretamente embalada, a encomenda estupefaciente. O avião-motoboy faz a entrega.
Já existe uma demanda considerável nas chamadas classes alta e média, sem contar o crack, que por ter preço tão vil quanto ele, é consumido amplamente por pessoas de quase nenhum ou mesmo nenhum poder aquisitivo.
O governo do Estado percebeu o potencial destrutivo do crack, seja por sua capacidade de viciar com apenas uma, duas ou três vezes de uso (depende um pouco da predisposição do usuário, mas não muito), seja por sua capacidade de detonar o cérebro do usuário, seja pela capacidade de levá-lo rapidamente à condição de criminoso violento.
Faz todo sentido aquela propaganda do governo de que “crack é cadeia ou caixão”, embora ela haja provocado algumas críticas de psicólogos e outros especialistas, no sentido de que extinguiria a esperança e a idéia de dependentes de abandonarem o vício. Daria antecipadamente como perdida a batalha de cada um dos vitimados por essa droga. Não vejo esse problema como um dado objetivo. No máximo, é uma manifestação de idealismo fantástico.
É que, em verdade, a população envolvida com o crack, em sua quase totalidade, não tem recursos financeiros para fazer um tratamento sério de desintoxicação, com assistência psicológica e essas coisas. E o Estado (União, Estados, Municípios, Sistema Único de Saúde) não tem clínicas de recuperação a oferecer aos dependentes.
Aliás, não tem sequer cadeia suficiente para acolher os traficantes, de modo que se poderia até (ressalvando as exceções, claro), reduzir a advertência estatal para “crack é caixão”. Assim, sem a animadora alternativa de cadeia.
Mas a organização criminosa na Bahia não se restringe à questão das drogas (sempre acompanhada, com intensidade crescente, na medida do desenvolvimento do negócio, pelo tráfico de armas). Quadrilhas de assalto a bancos, de furto ou roubo, receptação e/ou desmanche de carros, assaltos nas estradas, seqüestro, tudo isso vai ganhando progressiva e notoriamente em organização.
Chegamos a este ponto, mas não ao fim. Infelizmente. Há algumas décadas, quando o crime organizado montou suas bases no Rio de Janeiro e em São Paulo, as autoridades baianas calculavam que, se postos em grave desconforto naquelas duas cidades, a tendência dos criminosos seria a de deslocamento para a Bahia e, mais especificamente, Salvador.
Salvador, que tinha bem menos que as 3 milhões de pessoas de hoje (chegando perto de quatro quando se considera toda a região metropolitana), é a terceira cidade mais populosa do país. Metrópole com topografia semelhante à do Rio de Janeiro (partes baixas e altas alternadas), o que é um fator que favorece os bandidos, e distribuição demográfica parecida – o Rio tem favelas, Salvador tem “invasões”. Que são favelas. Para completar, Salvador e a Bahia, analisava-se – e creio que não há razão para alterar a análise, já que a geografia não mudou – situam-se no meio da costa brasileira, passagem entre Sul/Sudeste e Nordeste/Norte, com irradiação rodoviária para essas regiões e também para o Centro-Oeste, fronteira com amáveis países vizinhos que mandam ao Brasil drogas e armas. Só não temos, em relação às drogas, uma capacidade de consumo capaz de rivalizar com o Rio ou São Paulo. Mas podemos ser também um pólo distribuidor, tudo indica que temos vocação para isso.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta terça.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.
Ivan de Carvalho é jornalista baiano.