Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

O Conselho Estadual de Comunicação


Sexta, 26 de novembro de 2010 
Por Ivan de Carvalho
    Uma sessão especial na Assembléia Legislativa, na tarde de ontem, debateu o anteprojeto que o Poder Executivo deverá mandar à Assembléia Legislativa, propondo a criação de um Conselho Estadual de Comunicação, “vinculado à Assessoria Geral de Comunicação Social da Casa Civil do Estado da Bahia”. É, portanto, um órgão do Estado, não da sociedade. O Conselho, segundo o anteprojeto, tem “caráter consultivo e deliberativo sobre sua finalidade de formular a Política Estadual de Comunicação Social”, observadas as Constituições estadual e federal, “reconhecida a comunicação social como um serviço público e um direito humano e fundamental”.

            A sessão especial foi convocada a requerimento do deputado Gaban, democrata e ex-presidente da Assembléia Legislativa, preocupado em abrir o debate sobre o assunto, uma vez que está nele envolvida a liberdade de expressão, mais especificamente a liberdade de imprensa. Um dos convidados que participaram da sessão, o presidente da OAB, secção da Bahia, Saul Quadros, disse, em breve pronunciamento, que, numa leitura rápida, não via inconstitucionalidade ou censura à imprensa no anteprojeto.

Quadros pareceu aliviado por não ter identificado na proposta problemas como os de lei similar (não igual) que está levando a mídia privada do Ceará a sentir-se sob pressão e censura. O próprio deputado Gaban, que presidiu a sessão especial, também avaliou como aceitável o anteprojeto, desde que sejam corrigidas “algumas falhas”. Serão corrigidas se o Executivo quiser, dado que a bancada governista será ampla maioria no ano que vem, quando o projeto vai tramitar.

Eu diria que, em verdade, é como se aqui na Bahia houvessem retirado o bode da sala – daí o alívio, pela comparação com o caso do Ceará. Mas o projeto do governo baiano, embora feito com bem mais cuidados, tem problemas graves, sim. E são vários. Em alguns casos, sequer parecem problemas – mas algumas de suas normas, quando levadas à prática continuada, vão seguramente criar distorções.

Pode-se até imaginar que isto não aconteça no atual governo, tendo-se em conta as convicções não só “republicanas” como democráticas do governador (pois dele, em última análise, vai depender o que fará o Conselho e o que não fará). Mas o mandato do governador Wagner não é eterno. E depois? E depois de depois?

Vamos, no entanto, evitar o detalhamento, que não caberia neste espaço de uma só vez. Tomemos apenas como exemplos de riscos maiores dois pontos:

1. A proposta prevê que o Conselho terá 25 membros. Sete deles serão representantes de órgãos estaduais. Mais um das universidades públicas com atuação na Bahia. Dos 17 restantes, aí nas contas do deputado Gaban, a imprensa tradicional (empresas de jornais, revistas, emissoras de rádio e televisão e a “entidade profissional de classe”, juntas, têm apenas quatro representantes. Se essa entidade é o sindicato dos jornalistas, parece – salvo exame mais detido da proposta – que não está sendo aberto espaço sequer à Associação Bahiana de Imprensa. Mas há uma plêiade de representantes de outros setores.

2. O outro ponto “quente” é o inciso VII do artigo 2º, que dá ao Conselho a função de “receber e reencaminhar denúncias sobre abusos e violações de direitos humanos nos veículos de comunicação do Estado da Bahia, aos órgãos competentes, para adoção de providências nos seus respectivos âmbitos de atuação”. É o jabuti em cima da árvore. Ora, tem o Ministério Público, tem a polícia, tem a vítima dando noticia criminis, tem os advogados, tem a Defensoria Pública, tem os códigos Penal e Civil, tem o Poder Judiciário.
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Este artigo foi publicado originalmente na Tribuna da Bahia desta sexta.

Ivan de Carvalho é jornalista baiano.