Segunda, 17 de março de 2014
[Carmen Bressane*] É
inegável a insatisfação do povo brasileiro. As manifestações que se
iniciaram em julho de 2013 parecem ter sido a brecha para o cidadão
manifestar, cada um a seu modo, o desconforto, a decepção e a revolta
com a situação do país.
Por um lado, todos sentem no bolso a
pesada carga tributária. Os funcionários públicos e assalariados já
recebem o salário líquido com o significativo desconto para o leão, nada
manso, do Imposto de Renda. A venda de um imóvel, a compra de um bem,
desde o cafezinho no bar até os eletroeletrônicos e os automóveis, tudo
está regiamente tributado. Alguns serviços essenciais trazem destacado
na nota fiscal a significativa parcela de imposto, é só observar na
conta de luz, de água, etc.
Por outro lado, qual a contrapartida? Para onde vai tanto dinheiro arrecadado?
Os serviços públicos são precaríssimos.
Saúde pública, um verdadeiro caos: não faltam apenas médicos, faltam
leitos, remédios, aparelhagem. Educação Pública? Aqui então falta tudo,
desde vagas nas creches até a segurança para o professor, mal
remunerado, exercer a profissão. Transportes? A rodovia só é boa quando
privatizada e o cidadão ainda tem que desembolsar mais uma boa quantia
para percorrer uns quilômetros asfaltados e com alguma sinalização. E o
que dizer da violência? Certamente o descaso social de muitos anos é uma
fábrica cada vez mais produtiva da criminalidade colocando em pânico a
população.
Mas então, repetimos a pergunta que, em
última análise, representa a insatisfação da população: para onde vai o
seu, o meu, o nosso dinheiro recolhido pelos muitos tributos vigentes no
pais? O que é feito de tanto dinheiro?
A primeira resposta possível que vem ao
pensamento imediatamente é a corrupção. De fato, o Brasil é um país onde
especialmente os desvios são muitíssimo significativos. Todavia, o
grande ralo por onde escorre a maior parte dos recursos chama-se DÍVIDA
PÚBLICA. Essa questão essencial para o país é pouco abordada e, quando é
discutida, é mal analisada, principalmente pela grande mídia.
Muitos sequer têm idéia de que o nosso
país possui uma enorme dívida pública e que para ela é destinada quase a
metade do Orçamento Público Federal. Sim, isso mesmo, quase metade de
todos os recursos da União vai para pagamento de dívida, ano após ano, e
a dívida só cresce.
Veja no gráfico abaixo que o Orçamento
para 2014 prevê recursos no montante de R$ 2,383 TRILHÕES. Desse valor,
estão destinados para o serviço da dívida 42,42%, isto significa que
estão previstos gastos com a dívida em 2014 de R$ 1,002 TRILHÃO!!
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Enquanto isso, para Saúde 3,91%, Educação 3,44%, Transporte 1,03%, Segurança Pública 0,35%, Energia 0,08% – e tome apagão!
Como é possível dar certo um país que gasta assim as suas receitas?
E que dívida é essa que consome tantos
recursos do país? Tivemos em 2009/2010 uma CPI da Dívida Pública, no
Senado Federal, ocasião em que a coordenadora nacional da Auditoria
Cidadã, Maria Lucia Fattorelli, esteve presente para coordenar os
trabalhos técnicos. Ficou comprovado que na maioria dos casos essa
dívida é meramente contábil, ou seja, apenas um jogo de juros sobre
juros, eivado de inúmeras irregularidades e ilegalidades, com o
agravante de pagarmos os maiores juros do planeta ! O relatório da CPI
foi enviado ao Ministério Público Federal e aguardamos o encaminhamento
desse procedimento. Acesso a esses documentos podem obtidos no site www.auditoriacidada.org.br.
É urgente uma auditoria dessa dívida,
auditoria aliás prevista no art. 26, das Disposições Transitórias, da
Constituição Federal de 1988, e que permanece letra morta, até hoje não
cumprida. Não se trata de calote da dívida, trata-se de apurar o que
realmente temos a pagar, o que já pagamos, e porque pagamos. Pagar, sim,
mas só o que efetivamente devemos.
A auditoria da dívida pública certamente
trará ao Brasil uma economia de recursos que poderá ser destinada à
outra dívida muito maior e urgente, que a população reivindica: a grande
dívida social!
* Carmen Bressane é advogada
formada pela USP, no Largo São Francisco. Trabalhou na Receita Federal
como auditora entre 1983 a 2012, e atualmente é aposentada. Foi diretora
administrativa da Fundação Assefaz (Fundação dos Servidores do
Ministério da Fazenda), presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais da
Receita Federal e é coordenadora do núcleo de Auditoria Cidadã da
Dívida – núcleo de São Paulo. Fale com ela: auditoriacidadasp@gmail.com