Terça, 1º de julho de 2014
*Por Petrônio Souza
Nosso
arraigado patriotismo é tão profundo que dura menos que um mês. É pré-datado. A
culpa é da cor de nossa bandeira, verde e amarela, tão condizente com nossa
história. Tudo nela nos foi dado pela natureza, não construído por nossas
honras e glórias. O amarelo traduz mais a vergonha histórica de todos os
‘grandes homens’ da Inconfidência terem abandonado à própria sorte o ‘soldado
raso’ Tiradentes, que o ouro que representaria nossa memória em momento síntese
da nação. Representa mais a vergonha de ter feito Teófilo Otoni, o aclamado
Ministro do Povo, um dos maiores mineiros em todos os tempos, depois de rendido
e vencido pelo Exército Nacional, ser levado, prisioneiro, a pé, puxado por cavalo,
da revoltosa Santa Luzia a Ouro Preto, capital da Província.
Nosso
amarelo não é pelo ouro garimpado e agente construtor de uma nova nação. Mas
sim o ouro saqueado com a aquiescência e subserviência dos mineiros e de
Portugal. Mais ou menos o que acontece nos dias de hoje com a floresta
amazônica e com o mineiro de ferro de Minas e do Pará, tudo doado, trezentos
anos depois, sem nenhuma inconfidência. Essa é a nossa orgulhosa Estrada Real,
que para nós era o caminho do saque, a estrada pavimentada pela exploração e
pelo servilismo.
Sem
revoluções e sem heróis, o majestoso Hino Nacional evoca e traduz a verdade que
não vivemos, o Brasil que dividimos, todos nós, todos os dias, deitados
eternamente em berço esplendido. Por isso o entoamos tão alto, com a
confortável justificativa de não repeti-lo mais durante todo o ano. Quando
andamos pelas ruas de nosso imenso país, vemos nossa verdade estampada em
tapumes, nossa vergonha exposta e emoldurada.
De norte a sul é assim: é preciso nos protegermos de nós mesmos. Temos mais a
esconder que mostrar. Por isso maquiamos tão bem os caminhos tortos por onde
irão passar as seleções e os turistas, deixando-os bem policiado, limpos e
sinalizados, bem diferentes de nossa pobre vida diária. Em campo, os heróis
nacionais, tão distantes da realidade de seu país que foram cooptados a viver
bem longe dele. Fazem sua história fora, assim como todas as nossas riquezas,
desde sempre. Talvez por isso nos identificamos tão pouco com nossa Seleção.
Servilmente,
clamando por um naco da atenção do mundo, vamos construindo estádios no lugar
de construirmos uma nação, vamos construindo aeroportos, no lugar de
construirmos um povo, vamos fazendo a batucada da festa enquanto os
estrangeiros e o povo que vive de circo e de muito pouco pão, dançam,
alegremente. A ignorância é sempre protetora. É tão fácil aquinhoarmos gente e
produzirmos uma festa, impossível é reunirmos pessoas e erguemos uma nação.
Daqui a algumas horas, enrolaremos nossas bandeiras, esqueceremos nossa fé,
guardaremos a nossa esperança. Peço, apenas, como bem sintetizou o poeta, que
“se temos a febre da festa, tenhamos também a lucidez da ressaca”.
*Petrônio
Souza Gonçalves é jornalista e escritor
Fonte:
Correio Popular de Rondônia