Terça, 13 de
janeiro de 2015
Da Tribuna da
Imprensa
HELIO
FERNANDES
Circulam várias
versões e interpretações sobre os meus artigos (é importante que se saiba que
escrevi sobre a morte do ex “presidente”, 2 artigos assinados na primeira
página e uma coluna inteira com o pseudmino de João da Silva que a hipocrisia
do governo passado me obrigou a usar sabendo como sempre soube que João da
Silva e Helio Fernandes era a mesma pessoa, (coisa que também jamais escondi)
com as mais diversas conclusões, Mas nenhuma delas verdadeiras ou autorizada.
Meus artigos sobre o ex ”presidente” Humberto de Alencar Castelo Branco, não
são nem frios nem passionais. São lúcidos e coerentes. Foram escritos por um
homem que sabe sempre o que escreve e põe sinceridade em todas as suas
atitudes. Meus artigos tinham o objetivo de constituir advertência para o
futuro e não ajuste de contas com o passado.
Desde o momento em
que recebi a notícia da morte do ex ”presidente”, nem me passou pela cabeça a
ideia de deixar de escrever uma última vez sobre o seu governo que sempre
considerei catastrófico, e a marca pessoal que ele imprimiu a esse governo.
Durante os 3 anos em que o Sr. Castelo Branco foi o mais poderoso “presidente”
da República de toda História brasileira, combati o seu governo e a ele,
pessoalmente, da forma mais dura e implacável para milhões de pessoas
neste país. Ninguém atrasou mais o futuro e o desenvolvimento deste país do que
o governo do ex “presidente”.
Enfrentei o seu
governo arbitrário e violento, de peito aberto, sem pedir nada, sem acomodações
ou transigências. Tendo dito dele, enquanto ele era presidente e poderoso, tudo
que se pode dizer de pior de um governante (com a única ressalva, que também
fiz depois da sua morte, a respeito da sua rigorosa integridade pessoal em
matéria de dinheiro), não me pareceu de forma alguma despropositado que eu
afirmasse tudo isso no dia da sua morte.
Alguns, como
justificativa e como representação da mais autêntica hipocrisia, chegaram a
dizer publicamente: “10 ou 15 dias depois da morte do ex-presidente, vá lá que
se escrevesse contra ele; mas no dia mesmo da sua morte, foi demais”. Meus
artigos tinham e têm o sentido de advertência para futuros homens públicos,
para que não se desmandem e nem cometam todas as vilanias em vidas pensando que
a morte será capaz de acabar com tudo, de absolvê-los, de provocar o
esquecimento de todos os erros e de todos os prejuízos causados ao país.
Além do mais, para
mim a morte é um problema médico e não cívico. Os mortos particulares podem ser
chorados e velados no altar particular de cada família, sem a interferência ou
a intromissão de ninguém. Já os homens públicos, esses devem, ser julgados pelo
bem ou pelo mal que fizeram ao seu país, sem que a morte em si mesma constitua
uma absolvição. A morte é uma contingência fatal e irrecorrível, não é um
julgamento do Tribunal Federal de Recursos.
O último ato que um
médico pratica antes de declarar que um cidadão está morto, é verificar se o
seu coração deixou de bater. Ora, recuso-me a admitir, em quaisquer
circunstâncias, que o fato do coração de um homem ter deixado de bater, possa
ter qualquer significação cívica. Quem foi grande homem com o coração pulsando,
continuará a selo depois que ele parar; quem não foi antes, não poderá sê-lo de
forma alguma depois. Não é nem desconhecida nem original a afirmação famosa: “A
morte iguala os homens, a vida revela as eminências”. Não tendo considerado
o ex-“presidente” eminência em vida, não havia porque mudar de opinião depois
dele morto, ou porque silenciar, o que, ai sim, se constituiria num ato de
covardia e de acomodação.
Além do mais, os
homens públicos, ao exercerem os cargos políticos, perdem a condição de
cidadãos particulares, não só se sujeitam como aceitam tacitamente o julgamento
da opinião pública. E ninguém mais autorizado e mais obrigado a esse julgamento
diário do que os jornalistas.
Um ex-presidente da
República, morto ou vivo, é uma personalidade polêmica pela própria razão do
cargo que ocupa ou ocupou, tem que ter naturalmente os seus atos discutidos,
criticados, analisados, esmiuçados, desvendados, no todo ou em parte, no
conjunto e no detalhe. Considero que a política desnacionalizante que o
“presidente” Castelo Branco impôs a este país, trouxe prejuízos incalculáveis
aos seus 85 milhões de habitantes.
Durante três anos fiz
as mais violentas criticas a Castelo Branco. Durante esse tempo os seus
admiradores (os sinceros e ocasionais) o incensavam e o colocavam como “o maior
“presidente “da História”. Por que não hão de valer apenas os elogios, e as
criticas hão de ser punidas com degredo, confinamento, prisão, uma série enorme
de violências? Nenhum presidente, por melhor que seja, recebe apenas elogios;
nenhum presidente, por pior que se mostre, acumula apenas criticas e reações
desfavoráveis.
É tolice e mais do
que isso, é má fé evidente e declarada, pensar que um presidente da República
pode se furtar ao julgamento da História. Principalmente um homem que chegou à
“presidência” inesperadamente no bojo de uma revolução contra o Poder
constitucional e legalmente organizado. E o julgamento da posteridade começa
antes da morte, não pode respeitar a morte, é mais importante que a própria
morte.
*
Amanhã publicaremos a segunda parte do artigo.