Quinta, 7 de janeiro de 2021
Elogio ao bom senso
Ao amanhecer de um dia nos fins de 1985, as rádios colombianas informaram:
A cidade de Armero sumiu do mapa.
O vulcão vizinho matou a cidade. Ninguém conseguiu correr mais rápido que a avalancha de lodo fervente: uma onda grande como o céu e quente como o inferno atropelou a cidade, jorrando vapor e rugindo fúrias de animal ruim, e engoliu trinta mil pessoas e todo o resto.
O vulcão vinha avisando há um ano. Um ano inteiro ficou jorrando fogo, e quando não podia esperar mais, descarregou sobre a cidade um bombardeio de trovões e uma chuva de cinzas, para que os surdos escutassem e os cegos enxergassem tanta advertência. Mas o prefeito dizia que o Governo Superior dizia que não havia motivos para alarme, e o padre dizia que o bispo dizia que Deus estava cuidando do assunto, e os geólogos e os vulcanólogos diziam que tudo estava sob controle e fora de perigo.
A cidade de Armero morreu de civilização. Não tinha nem cumprido um século de vida. Não tinha hino nem escudo.
Eduardo Galeano em 'O Livro dos Abraços',
2ª Edição, 2014, L&PM Editores, página 130.