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(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 12 de janeiro de 2022

Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas exige providências contra apagão de dados do Ministério da Saúde; e aponta incompetência e negligência

Quarta, 12 de janeiro de 2022

Em nota pública divulgada nesta terça-feira (11.jan.2022), organizações do Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, do qual a Abraji faz parte, apontam “incompetência e negligência” do Ministério da Saúde na falha em restabelecer a coleta e a divulgação de dados sobre a vacinação, a pandemia de covid-19 e outras doenças respiratórias graves. Desde que a pasta afirmou ter sofrido um ataque cibernético, há um mês, as informações não são plenamente divulgadas. O ministério também não explicou o que houve e que sistemas de dados foram prejudicados.

As organizações exigem que o Ministério da Saúde esclareça quais foram os impactos do ataque digital e quais são as providências tomadas para evitar sua repetição, além de alertar para possíveis consequências: “sem o monitoramento e o fornecimento de dados oficiais, prejudica-se ou até mesmo inviabiliza-se o desenvolvimento de medidas e de políticas públicas necessárias para evitar a sobrecarga do sistema de saúde.”

O Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas encaminhará a demanda ao Tribunal de Contas da União (TCU) e à Procuradoria-Geral da República (PGR).

"O recente apagão de dados evidencia a precarização da segurança dos dados pessoais de saúde de milhões de brasileiros. Nos últimos meses, o Ministério da Saúde tem sido alvo de recorrentes ataques e vazamentos. O desafio da segurança é ainda mais urgente quanto aos dados da Rede Nacional de Dados e Saúde (RNDS), que centraliza dados sensíveis de toda a população brasileira, incluindo usuários de serviços privados", afirma o texto.

Confira abaixo a nota na íntegra:

Apagão de dados: país está à mercê da incompetência e da negligência do Ministério da Saúde

Nesta segunda-feira (10/01), completou-se um mês em que o país está sem acesso a informações fundamentais para a saúde pública e para responder de forma adequada à pandemia de Covid-19. Após o ataque aos sistemas do Ministério da Saúde classificado genericamente como “incidente de segurança cibernético”, a coleta e a divulgação de dados sobre a vacinação e a ocorrência de Covid-19 e de outras doenças respiratórias graves estão comprometidas.

O Ministério da Saúde - em consonância com a prática do atual governo federal de fornecer informações parciais - insiste que o e-SUS Notifica (utilizado para notificar casos de Covid) e o SI-PNI (Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunização) voltaram à normalidade. O chefe da pasta, Marcelo Queiroga, afirmou que o fato de os dados não estarem disponíveis publicamente não significa que não estejam sendo coletados.

Entretanto, relatos de profissionais da saúde e checagens jornalísticas mostram que as redes pública e privada não têm conseguido inserir seus registros de casos no e-SUS Notifica, nem os registros de doses de vacinas no SI-PNI. Ou seja, quaisquer que sejam os dados que o Ministério diz coletar no momento, eles não refletem a realidade.

Além de tentar desinformar a sociedade, o Ministério da Saúde omitiu a informação de que o “incidente de segurança cibernético” afetou a Rede Nacional de Dados em Saúde, ou RDNS (a plataforma que reúne todas as informações prestadas por estados por meio dos sistemas como o e-SUS Notifica, Sivep-Gripe e SI-PNI), fato revelado pela imprensa na última quinta-feira (06/01). Só admitiu a ocorrência grave após publicação de reportagem, e coincidentemente informou o retorno da Rede ao ar nesta segunda (10/01), mas sem previsão concreta sobre a normalização dos dados.

Sem a RDNS e com a instabilidade dos sistemas de registro, nem pesquisadores, nem especialistas conseguem ter uma visão geral da pandemia de Covid-19, da epidemia de gripe ou da vacinação. A Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz), por exemplo, está impossibilitada de produzir boletins em que avalia o crescimento ou a redução de casos de Covid-19 e outras doenças respiratórias graves. O próprio boletim epidemiológico do governo federal é prejudicado: a edição mais recente, divulgada em 01/01/2022, não apresenta o número de internados por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).

O apagão de dados oficiais mostra-se ainda mais crítico por coincidir com um aumento expressivo de casos positivos de Covid-19 e síndromes gripais no país, conforme apontam dados de farmácias, laboratórios, hospitais privados e secretarias municipais. Desde as vésperas das festas de fim de ano, registra-se uma alta desses casos, que se refletem no aumento da demanda por atendimento em prontos-socorros.

A reportagem aqui mencionada mostra que, no Rio de Janeiro, apenas nos primeiros cinco dias de 2022, o número de casos de Covid-19 na cidade correspondia a 80% do registrado ao longo de todo o mês de dezembro. Já em São Paulo, em duas semanas desde o final de dezembro, a quantidade de infecções por Covid-19 aumentou 53%, e a ocupação de leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) subiu de 21% para 38%.

Sem o monitoramento e o fornecimento de dados oficiais, prejudica-se ou até mesmo inviabiliza-se o desenvolvimento de medidas e de políticas públicas necessárias para evitar a sobrecarga do sistema de saúde e realizar o devido controle e tratamento dos casos registrados de Covid-19 e demais síndromes gripais no país.

É inaceitável que o país esteja à mercê de tamanha incompetência e negligência por parte do governo federal. Há evidências claras de que o Brasil esteja entrando em mais uma grave onda na crise de saúde pública que se instaurou no país, sem o mínimo de dados necessários para estimar seu tamanho, elaborar planos para mitigá-la e salvar vidas. Pior: enfrentando um cenário de evidente desmonte das políticas necessárias para o efetivo monitoramento da situação.

Vale acrescentar que o recente apagão de dados evidencia a precarização da segurança dos dados pessoais de saúde de milhões de brasileiros. Nos últimos meses, o Ministério da Saúde tem sido alvo de recorrentes ataques e vazamentos. O desafio da segurança é ainda mais urgente quanto aos dados da Rede Nacional de Dados e Saúde (RNDS), que centraliza dados sensíveis de toda a população brasileira, incluindo usuários de serviços privados. A gestão desses dados demanda alta responsabilidade e protocolos efetivos para que os direitos dos titulares dos dados sejam preservados, em cumprimento à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), e que vulnerabilidades como essas não voltem a afetar os cidadãos brasileiros.

As organizações que compõem o Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, coalizão dedicada à defesa da Lei de Acesso à Informação e da transparência pública, e organizações parceiras exigem que o Ministério da Saúde esclareça de forma detalhada quais foram os impactos do ataque digital e quais são as providências para evitar que se repita, e acelere as providências para restabelecer os sistemas de coleta, consolidação e divulgação de dados sobre a saúde pública brasileira.


Transparência Brasil

Fiquem Sabendo

ARTIGO 19 Brasil e América do Sul

Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji)

Open Knowledge Brasil

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Fonte: Abraji