Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

quarta-feira, 27 de novembro de 2024

NENHUMA ÁRVORE A MENOS


Quarta, 27 de novembro de 2024

NENHUMA ÁRVORE A MENOS

Bosque comunitário cultivado ao longo de 50 anos está ameaçado de desmatamento pelo GDF

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Por Juan Ricthelly Vieira da Silva

Na manhã do dia 20 de Novembro uma movimentação incomum podia ser observada por quem passasse próximo ao bosque localizado na Quadra 2 da SHIS NORTE, um grupo numeroso que ultrapassava uma centena de pessoas, composto por crianças, idosos e moradores da quadra e de outras partes do Gama, se reunia ali debaixo das árvores para discutir sobre a ameaça que começou a pairar sobre as mesmas.

Um dia antes, uma equipe foi vista e filmada piquetando o local, com o propósito de determinar o terreno que seria destinado à construção do CAPS III no Gama, uma pauta histórica da nossa comunidade que finalmente encontra um desfecho, algo que deveria ser motivo de comemoração.

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Ou seja, o Gama ganha o tão sonhado, urgente e necessário CAPS, mas ao custo do desmatamento e destruição de um bosque/pomar cultivado pela comunidade ao longo de 50 anos. Uma notícia boa, umbilicalmente entrelaçada em outra ruim, que está gerando uma reação negativa da comunidade.

E aqui nesse ponto, é importante deixar muito claro, que não se trata de um movimento de resistência comunitária contrário à instalação de um CAPS em nossa cidade, o problema reside no modo em que essa situação está acontecendo.

Também é fundamental ressaltar e não ignorar de forma alguma os vínculos e laços comunitários legítimos, que existem entre um lugar e as pessoas que vivenciam esse lugar, pois somente compreendendo esse sentimento de pertencimento, é possível entender como o corte de uma simples árvore ou de um conjunto delas afeta as pessoas que a viram crescer, ganhar forma, fazer uma sombra frondosa, abrigar pássaros e se converter em um ente querido de sua rua ou quadra.

Quem não vive ou viveu algo assim, possui dificuldade de compreender essa relação, o que para alguns é só um amontoado de árvores, para outros é um bem comum, que oferece serviços ambientais e proporciona qualidade de vida, seja por meio do efeito estético que uma árvore naturalmente causa, da sensação gostosa que é estar à sua sombra, do oxigênio e limpeza do ar que ela faz gratuitamente, da capacidade de amenizar a sensação de calor nos períodos de seca, da orquestra que as aves abrigadas em seus galhos promovem todas as manhã anunciando um novo dia, então não, não é só uma árvore, é um ente daquela comunidade e do sentimento de pertencimento que ali existe.

Então quando o Poder Público promove de forma arbitrária e sem qualquer diálogo com aquela comunidade, algo como o corte de uma árvore, não é nenhum exagero dizer que algumas pessoas se sentirão agredidas, pois aquelas árvores plantadas por aquelas pessoas, que cuidaram delas até serem grandes e fortes os suficientes para se cuidarem sozinhas, presenteando-as com seus frutos, são como parte da família daquelas pessoas.

E diante de tais fatos, obviamente haverá uma resistência da comunidade em defesa do que ela mesma construiu sem qualquer apoio do Poder Público, que agora chega com a proposta de destruir um bem comum ecológico comunitário.

A Constituição Federal estabelece em seu Art. 225 que “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”

Também é importante mencionar os benefícios inegáveis promovidos pela arborização urbana, cabendo destacá-los:

  • Melhoria da qualidade do ar: As árvores captam poluentes e produzem oxigênio;

  • Redução do calor: As árvores resfriam o ambiente por meio da evapotranspiração e proporcionam sombra;

  • Absorção de ruídos: As copas das árvores proporcionam isolamento acústico;
  • Incentivo à atividade física: As áreas verdes proporcionam locais para caminhadas, corridas e outras atividades ao ar livre;
  • Proteção do solo e dos corpos d'água: As árvores ajudam a proteger o solo e os corpos d'água;
  • Conservação da flora nativa: A arborização urbana contribui para a conservação genética da flora nativa;

Há ainda uma conexão amplamente documentada sobre o contato com a Natureza e os seus benefícios para a saúde mental das pessoas, sendo alguns deles:

Redução de sintomas de ansiedade e depressão;

Melhora do humor e da satisfação com a vida;

Aumento da sensação de bem-estar;

Melhora da memória;

Redução de sentimentos de solidão;

Aumento da energia e da concentração;

Melhora dos relacionamentos interpessoais.


Diante desse cenário, é até contraditória a construção de um equipamento público de saúde, destruindo um espaço público de uso comum que a promove, ao custo do bem-estar e da qualidade de vida, causando sofrimento inclusive psíquico em parte da nossa comunidade, ou seja, caso essa medida seja levada adiante, ignorando todo o contexto, o CAPS já nascerá aumentando parte da demanda que ele mesmo atenderá.


Nós queremos um CAPS no Gama! Mas não de qualquer jeito! O que mais tem é área pública bem localizada na nossa cidade que poderia atender muito bem a essa finalidade. Não precisamos desmatar um bosque para isso.