Terça, 23 de agosto de 2011
Da Pública Agência de Reportagem e Jornalismo Investigativo
Paramilitares
mandam e desmandam em cidades da costa pacífica, cobrando taxas a quem
quiser comercializar de bananas a ovos e frango
Por La Silla Vacía
Virou privilégio comer um Patacón Pisao, um bolinho típico
colombiano feito com bananas da terra, na cidade de Boaventura, ou em
qualquer uma das praias do Pacífico do Vale de Cauca, no este da
Colômbia.
Nas praias de Juanchaco ou de Ladrilleros – que hoje estão lotadas de
turistas por conta da visita de baleias -, esse quitute é praticamente
impossível de encontrar.
Quando um turista insiste, os proprietários dos hoteis e restaurantes
oferecem outro tipo de banana, uma especie costeira que no interior é
chamada de popocho e que nunca se havia comida nesta região.
A razão para a escassez desse produto de primeira necessidade para os
moradores da região é o preço. Nos mercados e nas lojas de Boaventura, a
banana da terra, ou plátano, está muito cara. E os que causaram tal
aumento de preço são os integrantes do chamado “cartel do plátano”.
Cada vez que um caminhão de alimentos chega a Boaventura, um grupo de homens armados faz o controle da entrada.
Não se trata apenas do plátano, mas eles restringem também a entrada de leite, ovos, queijo, frango, e às vezes até de carne.
Nem todos os produtos podem entrar até o porto, e nem todos os
comerciantes têm acesso às mercadorias que chegam. Os “selecionados” têm
que pagar um imposto ilegal para poder receber os produtos.
Pior: depois que as mercadorias passam pelo primeiro estabelecimento,
chegam aos mercados, ou às lojas de bairros, onde os vendedores têm que
pagar uma segunda sobretaxa.
Os donos dos negócios têm que pagar para poder vender e pela “segurança” que os membros do cartel “oferecem”.
Para escapar dos impostos e também das sobretaxas dos grupos
criminosos, alguns caminhoneiros preferem evitar ir até o porto, e
vendem sacos frango antes de entrar na area urbana, a preços mais
baixos.
Um distribuidor varejista contatado pelo Silla Vacía, parceiro da
Pública, usa uma forma ainda mais rudimentar de fugir da cobrança.
Cada vez que chega um pedido de plátano, ele os divide em pequenos
pacotes, que envolve em trapos e toalhas brancas, camuflando-os junto
com o resto da mercadoria como se fossem pacotes de farinha.
É a única forma que ele achou para que o plátano chegue aos mercados com um preço acessível.
Só que esse tipo de subterfúgio tem que ser feito absolutamente às
escondidas, ou então os comerciantes poderiam receber algum tipo de
retaliação ou até serem assassinados.
O Silla Vacía visitou quatro mercados na cidade de Biaventura:
Bellavista, Juan XIII, Matía Mulumba e Pueblo Nuevo. Em nenhum deles
encontrou um preço bom de plátano. No principal, de Pueblo Nuevo, apenas
dois vendedores tinham plátano da região chamada Eje Cafetero (na
região norte da Colômbia). E o que havia era pouco e de má qualidade.
“Aqui nesta região, que supostamente é a região natural do plátano
nãp podemos nem sentir o cheiro”, diz o dono de um restaurante em La
Bocarra, resignado a comer apenas a espécie costeira.
O que o povo comenta é que só pode comercializar essa banana por
ordem de “Los Urbaneños”, um bando de criminosos que chegou ao local há
alguns meses, vindo do norte do país.
A presença dos “Urbaneños” no vale confirma um relatório da Procuradoria de Justiça,
que alertou as autoridades sobre a entrada do bando para disputar as
rotas de tráfico de drogas com o grupo paramilitar Rastrojos.
Aparentemente, o grupo surgiu pelas mãos do narcotraficante Victor Patiño Fómeque, que foi libertado há pouco tempo da prisão nos Estados Unidos, aonde havia sido extraditado em dezembro de 2002.
Já está livre e, segundo informes oficiais, ele voltou à ao Valle Del Cauca para recuperar as rotas de tráfico no Pacífico.
Esta notícia ainda não foi confirmada oficialmente. Mas o que La
Silla Vacía apurou é que os paramilitares antes viviam do dinheiro do
narcotráfico estão vivendo dos “impostos” que impõem aos alimentos.
Mais que sobretaxas, terror
Um investigador da Defensoria em Boaventura contou à SillaVacía que a
cobrança de sobretaxas nos alimentos da cesta familiar não é uma
novidade no porto e por isso as pessoas a vêem como algo natural, ainda
que não assumam em voz alta.