Quarta, 8 de setembro de 2011
Da Agência Brasil
Alex Rodrigues - Repórter
Brasília - Após catalisar a insatisfação popular com a corrupção e a
impunidade e estimular milhares de pessoas a aproveitarem o Dia da
Independência para protestar, os idealizadores da Marcha Nacional Contra
a Corrupção garantem que, se depender deles, a pressão popular por
mudanças vai continuar.
“Nossa ideia agora é aproveitar a grande adesão e partir para
manifestações pontuais, tentando mudar aos poucos as leis atuais. A
marcha foi um evento genérico contra a corrupção. Agora, iremos atrás de
mudanças efetivas”, explicou Luciana Kalil, uma das organizadoras do
ato. Segundo ela, o grupo planeja colher assinaturas para apresentar
projetos de lei de iniciativa popular com o objetivo de, por exemplo,
extinguir o voto secreto na Câmara dos Deputados e no Senado.
Segundo José Jance Marques, que ajudou na divulgação da marcha, os
organizadores planejam esperar a reação dos políticos, “que devem ter
entendido o recado”, para então planejar os próximos protestos. “A
cobrança tem que continuar e, depois de ontem [7], não dá para deixar
passar em branco essa oportunidade. A ideia é sim fazer outros atos”,
disse Jance, lembrando que a página da marcha no site de relacionamentos Facebook continuará ativa.
Promovida em várias cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo
Horizonte, a marcha levou, somente em Brasília, entre 25 mil e 30 mil
pessoas à Esplanada dos Ministérios. Precisar o número exato de
participantes é quase impossível já que, na capital federal, muita gente
que assistia ao desfile oficial de 7 de Setembro aderiu ao protesto.
“O resultado foi positivo e nos surpreendeu demais. Com a adesão de
parte do público que estava na Esplanada para assistir ao desfile nós
conseguimos que o número de participantes fosse muito maior que as 25
mil confirmações que tínhamos no Facebook”, avaliou Luciana, destacando
que a marcha obteve inclusive a atenção da imprensa internacional, com
pedidos de entrevistas feitos por jornais da Alemanha, dos Estados
Unidos e da Argentina.
Para Luciana, a população está cansada e descrente das tradicionais
formas de organização política e, por isso, não cabia criticar alguém em
particular. “Fomos procurados por alguns partidos e políticos que
queriam que levantássemos bandeiras específicas, contra alguém em
particular, mas nunca aceitamos isso. Conseguimos realizar uma marcha
apartidária.”
O apartidarismo levou Luciana e outros organizadores a ouvirem
acusações de não terem “formação política”, o ela admite, e não vê como
algo ponto negativo. “Eu realmente não tenho muito conhecimento sobre os
partidos políticos e nunca havia participado de manifestações. Fizemos a
coisa toda de forma amadora e não sabíamos nem o que fazer quando vimos
tanta gente reunida. Só que, além da indignação, foi justamente o
caráter apartidário da marcha que motivou tanta gente a participar.
Ninguém ali queria empunhar a bandeira de qualquer partido, mas sim a do
Brasil.”
Para o cientista político Luciano Dias, o desafio dos organizadores da
marcha será transformar a manifestação apartidária de insatisfação
popular em algo capaz de promover transformações políticas reais. Para
ele, embora seja uma iniciativa importante, a crítica genérica à
corrupção é pouco eficaz.
“A marcha foi uma iniciativa importante. A questão agora é se essa
manifestação conseguirá se tornar um movimento político. E, para isso, é
preciso ter um objetivo claro, como a aprovação de uma nova legislação
anticorrupção”, destacou o especialista.
Sobre a diferença entre a marcha e outras iniciativas que não obtiveram
o mesmo respaldo popular, como a tentativa de partidos de oposição de
instalar uma comissão parlamentar de inquérito (CPI), o cientista
respondeu que a “a oposição não tem legitimidade para liderar um
movimento contra a corrupção, pois ela também tem problemas nesse
sentido”.
O apoio de entidades civis como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a
Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e a Associação
Brasileira de Imprensa (ABI), segundo Luciana, só se concretizou nos
últimos dias antes da marcha e foi mais de ordem institucional. Tanto
que, garante ela, foram os próprios manifestantes que contribuíram para a
confecção de cerca de 20 mil panfletos de divulgação do ato e para a
compra do tecido e da tinta usada para as faixas contra a corrupção.
“Durante todo o tempo nós destacamos muito a responsabilidade de cada
um e que qualquer mudança só será possível com a união do povo. Deu para
ver que está todo mundo insatisfeito e que há uma vontade de mudança
muito grande, afirmou a vendedora autônoma.
Diante do resultado da marcha e da atenção que vem recebendo da mídia,
Luciana diz que tem ouvido brincadeiras sobre a possibilidade de
disputar um cargo eletivo. Possibilidade que ela descarta. “Acho mais
fácil eu ajudar a conseguirmos um milhão de assinaturas [para um projeto
de lei de iniciativa popular] do que entrar ali [no Congresso Nacional]
e conseguir mudar a maioria dos deputados. É muito mais fácil
conseguirmos a mobilização do povo.”