Quinta, 16 de fevereiro de 2012
Do "Balaio do Kotscho"
Caros leitores e colegas jornalistas,
trabalhei durante muitos anos com um jornalista excepcional: Lúcio
Flávio Pinto, um paraense de notável coragem, que dedicou toda sua vida
pessoal e profissional a divulgar e defender a sua terra e a sua gente. É
o maior especialista em Amazônia do jornalismo brasileiro.
Lúcio é, acima de tudo, um estudioso, um trabalhador incansável, que
não se conforma com as injustiças e as bandalheiras de que são vítimas a
floresta e o povo que nela habita. Por isso, foi perseguido a vida toda
pelos que ameaçam a sobrevivência desta região transformando as
riquezas naturais em fortunas privadas.
Agora quem está ameaçado é o próprio Lúcio Flávio, na sua luta
solitária contra dezenas de processos movidos pelos poderosos na Justiça
para impedí-lo de continuar denunciando os assassinos da floresta.
Quem sempre esteve ao seu lado foi Raul Martins Bastos, nosso chefe
no "Estadão", que me enviou na noite de segunda-feira a mensagem
transcrita abaixo. É um libelo não só em defesa do grande jornalista,
mas da nossa profissão permanentemente ameaçada nos tribunais.
Onde estão nesta hora as poderosas entidades patronais da mídia, como
a ANJ e o nstituto Millenium, e seus arautos sempre tão preocupados na
defesa da liberdade de imprensa e de expressão?
Lúcio está fora da grande imprensa há muitos anos, sobrevivendo com o
seu "Jornal Pessoal", um quinzenário que produz sozinho. Talvez por
isso não mereceça a atenção dos editorialistas dos jornalões e das
entidades que costumam se manifestar nestas horas, como a OAB e a CNBB.
Cabe, portanto, a nós, jornalistas, sair em sua defesa como propõe o mestre Raul Bastos e sermos todos Lúcio Flávio nesta hora.
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"A indignidade que estão fazendo contra o jornalista Lúcio Flávio Pinto" é o título do texto-apelo de Raul Bastos:
"Peço que você não deixe de ler esta nota. É a história de uma injustiça. Uma indignidade.
Lúcio Flavio Pinto é um jornalista de Belém do Pará que há quase
vinte anos edita uma publicação chamada Jornal Pessoal. É um
profissional excepcional e fonte obrigatória quando for ser escrita a
verdadeira história da região dos anos 70 para cá. Trabalhou, entre
outros lugares, na Realidade, no Correio da Manhã e, por longos anos, no
O Estado de S.Paulo como principal repórter da região e coordenador
geral da cobertura dos correspondentes da Amazônia. Nesse período teve
vida acadêmica e deu cursos sobre a Amazônia em universidades dos
Estados Unidos e da Europa.
O Jornal Pessoal ele faz sozinho, da apuração à edição. Não tem
publicidade. Evidentemente, o jornal luta para se manter. Mas esse é o
menor problema da vida do Lúcio Flávio.
O grande problema é a pressão sistemática que ele sofre dos poderosos
da região por publicar matérias que denunciam indignidades e incomodam
justamente os poderosos da região. Tentam calá-lo de várias maneiras, da
intimidação à agressão, e ele tem resistido bravamente.
Tentam sufocá-lo e calá-lo com 33 processos. Um deles está para ser concluído e tudo indica que poderá ser desfavorável.
Qual o "crime" do Lúcio Flávio Pinto?
O Lúcio publicou denúncias comprovadas de que estava ocorrendo uma
enorme grilagem de terras na região. Com isso impediu que o empreiteiro
CR Almeida fizesse na Amazônia a maior grilagem da história do Brasil.
Em represália, foi processado por CR Almeida sob a alegação de ter sido
chamado de pirata numa das matérias do Lúcio Flávio, o que julgou
ofensivo.
Foi indo, foi indo e, agora, anos depois e por incrível que pareça, o caso está terminando assim:
Com o CR Almeida não aconteceu nada.
Com o Lúcio, se avizinha uma condenação. Com essa condenação, a perda
da primariedade, uma porta aberta para a intimidação absoluta.
Os amigos do Lúcio Flávio,entre os quais com muito orgulho me incluo, decidiram que ele não pode e nem vai ficar sozinho.
Vamos batalhar para tentar esgotar todas as possibilidades jurídicas do caso.
Vamos batalhar para que o caso ganhe espaço na imprensa e nas redes
sociais. Vamos chamar a atenção da imprensa especializada e
internacional para o caso.
Vamos batalhar, se por acaso ocorrer o pior, para que ele tenha recursos para enfrentar a situação.
O objetivo deste email é dar conhecimento do que está acontecendo e da nossa disposição de não deixar continuar acontecendo.
O objetivo deste email é pedir a sua ajuda. Primeiro, divulgando o
que está acontecendo no seu veículo de comunicação, na sua coluna, nos
sites, redes sociais. Depois, nos ajudando nas ações nas áreas da
comunicações e mobilização que tomaremos diante de cada circunstância.
Para quem quiser mais informações do que aconteceu e do que está acontecendo ler o texto abaixo do próprio Lúcio.
Contando com você, muito obrigado e um abraço do Raul Bastos".
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O texto de Lúcio Flávio Pinto:
O Grileiro vencerá?
Em 1999 escrevi uma matéria no meu Jornal Pessoal denunciando a
grilagem de terras praticada pelo empresário Cecílio do Rego Almeida,
dono da Construtora C. R. Almeida, uma das maiores empreiteiras do país,
com sede em Curitiba, no Paraná.
Sem qualquer inibição, ele recorreu a vários ardis para se apropriar
de quase cinco milhões de hectares de terras no rico vale do rio Xingu,
no Pará, onde ainda subsiste a maior floresta nativa do Estado, na
margem direita do rio Amazonas, além de minérios e outros recursos
naturais. Onde também está sendo construída a hidrelétrica de Belo
Monte, para ser a maior do país e a terceira do mundo.