Segunda, 1 de abril de 2013
Do TJDF
A limitação do conceito de família constante da Lei
Complementar 840/2011, conhecida como o Estatuto dos Servidores Públicos
Civis do Distrito Federal, "é inconstitucional, pois ofende a dignidade
humana, ao limitar que os genitores só podem ser considerados da
família se forem dependentes econômicos, para fins tributários". Com
esse entendimento, a 2ª Turma Recursal do TJDFT manteve sentença do 1º
Juizado da Fazenda Pública, que concedeu a uma servidora do GDF licença
remunerada para acompanhamento por motivo de doença em pessoa da
família, neste caso, seu pai.
A autora, que é servidora da Secretaria de Educação do Distrito
Federal, formulou pedido de licença para acompanhar tratamento de saúde
de seu pai, com 82 anos, acometido de neoplasia maligna. Sustenta que o
paciente sofre com os efeitos colaterais da quimioterapia, motivo pelo
qual se mostra imprescindível acompanhamento familiar constante,
devidamente demonstrado em laudo médico. Alega que sua situação é
particularmente delicada, pois o tratamento é realizado em Barretos/SP,
necessitando viajar para acompanhá-lo - situação que a impede de prestar
a devida assistência simultaneamente com o exercício do cargo. O
pedido, no entanto, foi negado, ao argumento de que a licença somente
seria possível se o paciente estivesse cadastrado no imposto de renda
como seu dependente, conforme previsão do art. 283 da Lei Complementar
840/2011.
Ao analisar o feito, o juiz originário anota que no âmbito da
legislação federal, a licença por motivo de doença em pessoa da família
encontra-se regulamentada no art. 83 da Lei 8.112/90, que prevê que ao
servidor será concedida licença por motivo de doença do cônjuge ou
companheiro, padrasto ou madrasta, ascendente, descendente, enteado e
colateral consanguíneo ou afim até o segundo grau civil, mediante
comprovação por junta médica oficial, se a assistência direta do
servidor for indispensável e não puder ser prestada simultaneamente com o
exercício do cargo. Já a legislação local, disciplina a referida
licença de forma semelhante, contudo restringe sua aplicação,
considerando membros da família do servidor: o cônjuge ou companheiro,
os filhos e, na forma da legislação federal sobre imposto de renda da
pessoa física, os que forem seus dependentes econômicos.
O magistrado registra que embora aplicável, no caso, a legislação
local, "não é admissível a recusa na concessão da licença ao argumento
de que o pai da autora não é seu dependente no imposto de renda. Com
efeito, tenho que é até razoável a limitação do conceito de família
trazido pelo art.283 da mencionada Lei Complementar para fins de
concessão de alguns benefícios que tenham repercussão direta e
permanente aos cofres públicos, tais como a pensão por morte.
Entretanto, para que o servidor se licencie para prestar assistência ao
ente acometido de doença grave e que exija seu acompanhamento contínuo,
como na espécie, não apenas é irrazoável e desproporcional, como também
desumano negar-lhe esse direito ao argumento da falta de designação do
parente como dependente econômico. Está o dispositivo, no ponto, em
flagrante desconformidade com o princípio da dignidade da pessoa humana,
pedra de toque do nosso ordenamento constitucional".
Ao julgar recurso interposto pelo DF, o Colegiado não apenas manteve a
sentença atacada, mas acrescentou que "a licença remunerada por motivo
de doença em pessoa da família não é nenhum privilégio, mas um
instrumento consentâneo com a política adequada em uma gestão de pessoas
no setor público, que deve ter como referência o dever de o Estado
assegurar integral assistência à saúde e proteção especial à família
(artigos 6º e 226 da CF)". E mais: "A questão da dependência econômica
não pode servir de esteio para a alteração do conceito de família, nem
para afastar a obrigação de amparo ao idoso prevista na Constituição da
República e no Estatuto do Idoso, que assegura a efetivação do direito à
vida e à saúde do idoso".
Com isso, a Turma Recursal afastou o dispositivo da Lei Complementar
que limita o conceito de família, e garantiu à servidora pública do DF o
direito de acompanhar seu pai doente, no prazo e condições previstos na
legislação de regência.