Terça, 2 de abril de 2013
Fábio Medina Osório
Há muitos anos, ainda na condição de Diretor da Associação Brasileira
do Ministério Público do Meio Ambiente – ABRAMPA e de Promotor de
Justiça na Promotoria Especializada na Defesa do Meio Ambiente em Porto
Alegre/RS, defendi a tese da chamada “improbidade ambiental”, que veio a
ser sufragada no Ministério Público brasileiro e utilizada com enorme
frequência para fins de combate à má gestão pública na área ambiental.
Não se trata apenas de combater graves desonestidades em matérias de
licenciamentos ou fiscalizações ambientais, mas também de enfrentar o
crônico problema da ineficiência endêmica nesse setor, à luz da Lei
8.429/92, que contempla, para além do ressarcimento de danos materiais e
morais, a suspensão de direitos políticos e outras sanções aos agentes
públicos e particulares. Um dos instrumentos propostos, em trabalho que
publiquei, foi a previsão de responsabilidades pessoais de agentes
públicos nos termos de ajustamento de conduta, para assegurar sua
efetiva implementação.
Passados mais de dez anos do período em que exerci como Promotor de
Justiça na área ambiental, e hoje na condição de advogado, vejo que a
jurisprudência, especialmente do STJ, acatou a tese da improbidade
ambiental e é necessário que os gestores públicos adotem cautelas cada
vez maiores, no campo da prevenção, para evitar incidência da Lei
8.429/92, Lei de Improbidade Administrativa, em decorrência de ações ou
omissões irregulares na área do meio ambiente natural ou urbano.
O rigor das autoridades e instituições fiscalizadoras na área da
defesa do meio ambiente é cada vez maior, e não falo apenas do
Ministério Público, mas dos Tribunais de Contas e de outros órgãos,
incluindo organizações não governamentais, o que é positivo à sociedade
brasileira.
PÓLO PASSIVO
Observe-se, por exemplo, que as entidades de direito público – de
qualquer esfera – podem ser trazidas ao pólo passivo de uma ação civil
pública de improbidade, ao lado de agentes públicos e privados, quando
da instituição de loteamentos irregulares em áreas ambientalmente
protegidas ou de proteção aos mananciais, seja por ação, quando a
Prefeitura expede alvará de autorização do loteamento sem antes obter
autorização dos órgãos competentes de proteção ambiental, ou por omissão
na fiscalização e vigilância quanto à implantação dos loteamentos.
Esse tipo de paradigma se aplica ao campo dos licenciamentos
ambientais em geral. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é
orientada no sentido de reconhecer a legitimidade passiva de pessoa
jurídica de direito público para figurar em ação que pretende a
responsabilização por danos causados ao meio ambiente em decorrência de
sua conduta omissiva quanto ao dever de fiscalizar.
Igualmente, tal forma de responsabilização coaduna-se com o texto
constitucional, que contempla, em seu art. 23, VI, a competência comum
para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios no que se refere à
proteção do meio ambiente e combate à poluição em qualquer de suas
formas, o que reforça o rigor do sistema normativo sancionador. E,
ainda, forçoso lembrar do art. 225, caput, também da CF, que prevê o
direito de todos a um meio ambiente ecologicamente equilibrado e impõe
ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo
para as presentes e futuras gerações, aumentando a cobrança das
instituições fiscalizadoras.
“INTERESSE LOCAL”
A competência do Município, em matéria ambiental, como em tudo mais,
fica limitada às atividades e obras de “interesse local” e cujos
impactos na biota sejam também estritamente locais. A autoridade
municipal que avoca a si o poder de licenciar, com exclusividade, aquilo
que, pelo texto constitucional, é obrigação também do Estado e até da
União, atrai contra si a responsabilidade civil, penal, bem como por
improbidade administrativa pelos excessos que pratica, observadas as
regras relativas às atribuições dos agentes públicos.
É verdade que uma ação civil de improbidade ambiental pode ensejar
posterior desclassificação dos fatos, remanescendo apenas (mas não é
pouco) a responsabilidade por ressarcimento dos danos, cujo regime
jurídico tampouco pode ser objetivo, em se tratando de responsabilidade
pessoal de agentes públicos ou particulares, em matéria de direito
administrativo sancionador.
O STJ definiu que, admitida a ação civil pública por ato de
improbidade administrativa, o posterior reconhecimento da prescrição da
ação quanto ao pedido condenatório não impede o prosseguimento da
demanda quanto ao pedido de reparação de danos. A discussão que se impõe
é se a reparação dos danos submete-se a um regime sancionatório ou de
mera responsabilidade civil.
O certo é que os novos gestores públicos devem ficar atentos em
relação às questões ambientais, pois é possível herdar passivos e
assumir responsabilidades de terceiros. Novos paradigmas, com maior
complexidade, de juridicidade, além de um emaranhado legislativo,
denotam a necessidade de alta preparação técnica para enfrentamento dos
desafios que emergem na área do meio ambiente.
Fábio Medina Osório, advogado, doutor em direito administrativo pela Universidade Complutense de Madri