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(Millôr Fernandes)

domingo, 13 de agosto de 2017

"Nunca vivemos uma crise tão forte", diz Maria da Conceição Tavares

Domingo, 13 de agosto de 2017
“As atitudes deste governo têm servido para agravar a situação do país. Aliás, não se trata de um governo, mas sim de um desgoverno”

Do Jornal da Unicamp

Economista, que está sendo homenageada pelo IE [Instituto de Economia], se diz pessimista com a situação do país

Texto: Manuel Alves Filho. Foto: Antônio Scarpinetti
Edição de imagens: Luís Paulo Silva

A economista Maria da Conceição Tavares, 87 anos, ex-professora do Instituto de Economia (IE) da Unicamp, está aposentada, mas continua uma observadora arguta dos acontecimentos da política e da economia do Brasil. Justamente por estar alerta, ela se diz extremamente preocupada com a situação do país. “Estou muito pessimista porque as condições estão péssimas. Faz dois anos que estamos estagnados. Nunca vivemos uma crise tão forte. Isso não aconteceu nem mesmo nos anos 1930”, analisa, em referência à chamada Grande Depressão.

Conceição Tavares está sendo homenageada ao longo do mês de agosto pelo IE, sua casa, por meio do evento “Economia e Pensadores II”. Até o dia 30, serão realizadas diversas palestras e debates em torno da obra da economista, que ofereceu contribuições importantes para a compreensão de diferentes temas, entre eles o subdesenvolvimento. Em entrevista por telefone ao Jornal da Unicamp, desde o Rio de Janeiro, onde reside, ela se disse envaidecida com a homenagem. “Enviei um agradecimento aos organizadores do evento, mas acho que a iniciativa foi um pouco excessiva”, diz.
Foto: Antonio Scarpinetti

A economista Maria da Conceição Tavares: “Para começo de conversa, eu espero que haja eleição no ano que vem. Tenho dúvida quanto a isso. Afinal, já não tivemos um golpe branco? Então, podemos ter outro”
A economista afirma ter muita estima pela Unicamp, onde ajudou a formar a primeira geração de economistas da Universidade. “Vários deles continuam atuando na Unicamp e em outras instituições”, lembra. Instigada a falar sobre o atual momento do Brasil, Conceição Tavares não poupa o verbo, uma das suas características mais marcantes. Sobre o governo do presidente Michel Temer, a intelectual não faz qualquer concessão. “As atitudes deste governo têm servido para agravar a situação do país. Aliás, não se trata de um governo, mas sim de um desgoverno”, define.
A recém-aprovada reforma trabalhista, na opinião da economista, é um exemplo dos retrocessos impostos pela atual política de Temer e seus apoiadores. “Essa medida tem o claro objetivo de acabar com a CLT [Consolidação das Leis do Trabalho], que vem da era Vargas. Isso vai trazer repercussões graves, como o aprofundamento da precarização do trabalho”, aponta. E continua: “Agora, estão discutindo a reforma da Previdência. Este governo não tem qualquer legitimidade para conduzir essa matéria. É um governo ilegítimo que está caindo aos pedaços. Não tem moral para fazer nada; só faz besteiras”.
Questionada se não vê as eleições de 2018 como uma oportunidade de recolocar o país nos eixos, Conceição Tavares mais uma vez demonstra extrema desconfiança. “Meu filho, para começo de conversa, eu espero que haja eleição no ano que vem. Tenho dúvida quanto a isso. Afinal, já não tivemos um golpe branco? Então, podemos ter outro. Além do mais, não tem candidato que preste. Do lado deles não tem ninguém. Do nosso lado tem o Lula, mas estão fazendo o possível e o impossível para neutralizá-lo. Está tudo muito obscuro”, finaliza.
Foto: Antonio Scarpinetti
O evento “Economia e Pensadores II”, que
acontecerá ao longo do mês de agosto,
homenageia Maria da Conceição Tavares
O evento “Economia e Pensadores II” é organizado pela equipe do Centro de Documentação do IE e tem como coordenador o professor Giuliano Contento de Oliveira. Na primeira edição, o homenageado foi Celso Furtado. A homenagem a Conceição Tavares, conforme o docente, vem da importância da vasta contribuição da economista para a economia em geral e para o IE em particular. “Para a economia, a professora contribuiu de forma exemplar para a compreensão do fenômeno do subdesenvolvimento e dos desafios colocados para a economia brasileira romper com essa condição. Para o IE/Unicamp, a professora não apenas foi uma das fundadoras do primeiro curso de pós-graduação em economia da Unicamp, em 1973, como foi uma das responsáveis pela introdução do método histórico-estrutural na “Escola do IE/Unicamp” para a compreensão dos fenômenos econômicos, juntamente com os demais discípulos de Raul Prebisch e/ou Celso Furtado”, assinala, em entrevista ao site do IE.