Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados."

(Millôr Fernandes)

terça-feira, 15 de maio de 2018

A verdade do Plano "B"

Terça, 15 de maio de 2018
Por
Fernando Tolentino
Propor um Plano “B” é simplesmente burrice ou fazer o jogo dos golpistas?
É claro que não estou falando do cidadão comum, aquele que está angustiado com a aproximação da eleição e gostaria de ter logo um quadro definindo. E estou incluindo no conceito de “cidadão comum” o que se interessa por política e a acompanha pela grande mídia.
Essa grande quantidade de brasileiros gostaria de votar em Lula, vê no seu nome a esperança de superar a terrível situação a que chegou o Brasil, mas acredita no que lhe diz a grande mídia: “Lula não pode ser mais candidato”.
Renomados juristas brasileiros afirmam que Lula poderá obter o direito de ser candidato a presidente da República neste ano, jogando por terra todo o esforço de diferentes instâncias judiciais para que ele esteja fora da disputa.
Aliás, a participação de presos em disputas eleitorais não é novidade no Brasil. O caso mais citado é o do prefeito de Unaí, o fazendeiro Antério Mânica (PSDB), acusado de ser o mandante do assassinato de quatro funcionários do Ministério do Trabalho (2004) que faziam uma fiscalização de rotina em fazendas da região. Pois Mânica saiu da prisão para o mandato conquistado em eleição de que participou. Mas, desde o ano 2000, pelo menos oito vereadores e prefeitos foram eleitos quando estavam presos.
No caso de Lula, a proposta de um Plano “B” é uma tática política de seus adversários, impotentes diante da incrível resistência do seu nome.
Há alguns anos, Lula não tem acesso a um mísero segundo de horário de TV em que possa fazer o contraditório, defender-se das acusações derramadas diariamente como verdades inquestionáveis em programas de TV, de rádio, noticiários e artigos veiculados em jornais, revistas e portais de internet mantidos pela grande mídia. Aliás, nem mesmo os seus aliados têm a oportunidade de questionar tais acusações.
Realizações de seus dois governos – e mesmo de sua sucessora Dilma Rousself – não são lembrados na grande mídia. Até os programas de partidos em rádio e TV, onde isso poderia ser feito ao menos pelo PT, não ocorrem mais.
E daí? Pesquisas de opinião pública se sucedem e Lula continua dando um banho em todos os adversários. Nem adiantou colocarem Lula entre quatro grossas paredes da fria Curitiba, cidade com maioria antipática ao seu nome. Na recém-anunciada pesquisa da CNT/MDA, volta a dar uma surra em todos outros pretendentes. Nas simulações de possíveis nomes que disputariam com ele o segundo turno, o nome mais próximo seria derrotado por uma margem de 19,8%. 
A pesquisa vai além e mostra que, sem o seu nome, entre 13,8% a 16,5% deixariam de votar, elevando a abstenção para alarmantes 45,7%!
Vocês já imaginaram se fosse concedidos a Lula (ou seus aliados) ao menos 1/10 do tempo utilizado na mídia para atacá-lo?
Alguém pode avaliar que são justamente esses ataques que mantêm Lula no topo das pesquisas. Seria uma espécie de reação popular ao seu espancamento pela mídia. Mas é óbvia a dedução de que os ataques se repetem para que não se reduza a rejeição à sua candidatura, abrindo-se o espaço para que chegasse efetivamente a representar a alternativa para muito além da metade da população.
O nome de Lula está atravessado na garganta dos golpistas e, por isso, eles consideram indispensável que ele seja afastado, sendo substituído por quem não tenha a mesma imagem carismática.
Mas há algo além disso. Lula conseguiu uma proeza que jamais seria imaginável neste momento pela direita brasileira. Não se dizia tanto que “a esquerda brasileira só se une na cadeia”? 
É verdade que isso foi desmentido pelo segundo turno da eleição presidencial de 1989. Mas ali a realidade era absolutamente diferente. Afinal, não havia eleição parlamentar para problematizar a unidade e, sendo segundo turno, havia uma polarização clara entre a esquerda e a direita. Todo o campo do centro até a esquerda migrou com os seus votos para Lula, enquanto a direita se concentrou em torno de Collor.
Não é possível deixar de considerar que Lula funciona hoje como uma espécie de “blindagem” para os demais nomes da esquerda. Mantém-se como o foco do combate midiático e, assim, os demais candidatos da esquerda deixam de ser os objetos de perseguição pela mídia conservadora.
Mas o principal, do ponto de vista tático, é que Lula, no período que antecedeu a sua prisão, trabalhou caprichosamente com os demais partidos do espectro da esquerda uma unidade que está assegurada por dois tipos de argamassa: a existência da candidatura dele e o fato de estar preso.
Explico. Por enquanto, ele é visto como uma espécie de concorrente sem que seja competidor por PSOL e PCdoB, que também já lançaram Guilherme Boulos e Manuela d’Ávila como candidatos.
Os dois partidos têm a clareza que a eleição poderá exigir deles e do PT a concentração em torno de uma só candidatura ou pelo menos uma unidade programática para os três. 
Mantido o seu nome, os índices de preferência ficam com o próprio Lula, mas isso assegura que permanece no campo da esquerda. Não se esvaem para quem tente se colocar como alternativa. Leia-se: Joaquim Barbosa, que acaba de desistir, e Marina Silva. O outro, ocasionalmente insinuando-se na situação de possível herdeiro é Ciro Gomes.
Caso Lula consiga reverter as expectativas da direita e disputar efetivamente a eleição, esses votos serão seus. Em caso contrário, chegaremos às vésperas da eleição com os votos consolidados como da esquerda e ele poderá indicar o sentido da migração. Como se deu em 1989. Para Boulos? Para Manuela? Para um nome alternativo do PT? Talvez um nome que congregue todas essas forças.
A única certeza é que, caso Lula fizesse agora a indicação de seu herdeiro, a unidade da esquerda estaria fadada à desagregação, mantidos vários candidatos que concorreriam entre si. Tudo o que pode interessar a uma direita que não consegue produzir um nome minimamente viável. 
Por isso, não é Lula que insiste em manter-se candidato, mas a direita que insiste em afastá-lo da disputa e destruir essa unidade indispensavelmente estratégica da esquerda.
Fernando Tolentino
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