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(Millôr Fernandes)

sábado, 30 de julho de 2022

É tímida ação dos partidos para garantir mulher negra na política, diz pesquisadora

Sábado, 30 de julho de 2022

Co-diretora do Instituto Alziras, Roberta Eugênio participou de estudo realizado em parceria com a Oxfam Brasil sobre desigualdade de gênero e raça na política - Foto: Arquivo

Roberta Eugênio destaca avanços e dificuldades para mudar desigualdade de gênero e raça

Ana Carolina Caldas
Brasil de Fato | Curitiba (PR) | 30 de Julho de 2022

Apesar de aumento no número de mulheres eleitas recentemente, o avanço é pequeno com candidatas negras. As mulheres negras, que representam mais de 25% da população brasileira, estão em apenas 4% das prefeituras e 6,3% dos cargos de vereador.

Para pensar o cenário atual, que de um lado tem avanço no debate antirrascista e, de outro, traz o aumento da violência política, o Brasil de Fato Paraná conversou com a co-diretora do Instituto Alziras, Roberta Eugênio, que é pesquisadora e, recentemente, participou de estudo realizado em parceria com a Oxfam Brasil sobre desigualdade de gênero e raça na política brasileira.

Advogada, mestre em Direito, Roberta foi assessora parlamentar da vereadora Marielle Franco até o seu assassinato.

Confira a entrevista:

Brasil de Fato Paraná: Quais são os principais entraves para as mulheres negras chegarem a cargos políticos, seja no legislativo ou executivo?

Roberta Eugênio: Importante entender que esse quadro da sub-representação política é explicado por um acúmulo histórico das desigualdades estruturais que a gente pode entender através do menor acesso à renda, das maiores desvantagens relacionadas a acesso a emprego, ao tipo de emprego e a forma como são vistas na sociedade.

Mas, de modo objetivo, podemos citar que começa dentro do papel dos partidos políticos na seleção ou não dessas candidaturas. Conforme o último estudo realizado pelo Instituto Oxfam Brasil e o Instituto Alziras sobre desigualdade de gênero e raça na política brasileira, foi possível identificar, por exemplo, que os homens brancos eleitos na ultima eleição foram o único grupo em que a parcela de eleitos foi maior que a proporção de candidaturas. Fica evidente que as decisões partidárias de quem serão os indicados paras as disputas impactam na presença das mulheres negras na política.

É preciso destacar, porém, que tivemos avanço nas leis do TSE que já valeram nas eleições de 2020, garantindo distribuição de recursos proporcional às candidaturas negras no partido. Isso é fruto de uma consulta feita pela deputada federal Benedita Silva (PT), já indicado a importância de um mandato de uma mulher negra, pois são elas que vêm provocando essas estruturas para que tomem medidas para mudar o quadro de sub-representação política.


BdF-PR: De 2016 para 2020, o Relatório do Instituto Alzira e Oxfam aponta um crescimento de candidatas negras eleitas. Para esta eleição, neste momento de crise, violência política, qual expectativa?

Esse é um ano desafiador no Brasil, não apenas porque é um período eleitoral, mas porque nos encontramos em uma grave crise social e econômica, com níveis devastadores em relação à fome e desemprego. Sabemos que essa crise atinge de forma mais aguda os grupos historicamente excluídos do poder, como a população negra, mulheres, mulheres negras. E, claro, se revela em uma manutenção do quadro da sub-representação dessas maiorias sociais que são minoras no poder.

Em relação ao cargo de presidente, por exemplo, temos apenas uma mulher candidata. Para governos estaduais, temos no Brasil todo, apenas três mulheres candidatas e apenas uma negra, que é a atual governadora do Piauí, Regina Sousa*.

E, para assembleias e congresso, teremos desafios já impostos em outras eleições, além da violência política que vem crescendo. Existem pesquisas que apontam que as mulheres negras são as mais atacadas na internet, esse espaço importante, por exemplo, para as campanhas políticas.


BdF-PR: Como você analisa as políticas partidárias no respeito às candidaturas negras?

Atualmente, temos uma legislação que trata de políticas de incentivo à participação das mulheres de modo amplo, outra voltada para a reserva de candidaturas de no mínimo 30% por gênero e também outra nova lei que determina que ocorra distribuição proporcional dos recursos partidários com o número de candidaturas negras dentro do partido.

Contudo, não saberia dizer o que vem sendo feito dentro de cada um dos partidos para estimular e viabilizar as candidaturas negras. O que a gente acompanha é que a sociedade civil, sobretudo de organizações de mulheres negras, vem se mobilizando diante deste cenário de sub-representação e pressionando não apenas os partidos, mas também levando a sociedade à reflexão sobre uma democracia que não tem em seus parlamentos a representação das suas maiorias.

Importante destacar que os partidos são importantes para o fortalecimento da democracia e devem ser convidados a estimular as candidaturas negras. Espero que os partidos se juntem às organizações, se envolvam mais e convoquem ações para mudar o cenário da representação política.

*A atual governadora do Piauí, Regina Sousa (PT), não está na disputa eleitoral neste ano. O candidato confirmado para concorrer ao governo do estado pelo PT é Rafael Fonteles.


Edição: Frédi Vasconcelos e Lia Bianchini