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(Millôr Fernandes)

segunda-feira, 18 de julho de 2022

Atual política de preços da Petrobras só favorece importadores de combustível dos EUA

Segunda, 18 de julho de 2022

Coutinho: atual política de preços da Petrobras só favorece importadores de combustível dos EUA

Publicado em 18/07/2022

Escrito por Marina Lang*

O gás de cozinha e os combustíveis viraram uma dor de cabeça dos brasileiros desde que sucessivos reajustes nos preços desses insumos energéticos despontaram nas contas cotidianas.

Os aumentos dos preços precedem a operação militar especial da Rússia na Ucrânia, mas foram ampliados logo após o anúncio do presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, sobre sanções ao petróleo russo.

O cenário de tensão econômica suscita uma questão: o abandono de refinarias e a venda de ativos da Petrobras têm ligação direta com a atual crise? A Sputnik Brasil conversou com o especialista Felipe Coutinho, vice-presidente da AEPET, para interpretar a questão.

O que era para ser um grande polo de petróleo foi corroído ao longo dos últimos anos, sobretudo devido à Operação Lava Jato: o Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), em Itaboraí, teve o projeto inicial abandonado pela estatal.

A duras penas, a sociedade sino-brasileira Kerui Método Construção e Montagem tenta reconstruir o que restou do projeto original, segundo o jornal O Globo.

Outro grande projeto do qual a Petrobras decidiu abrir mão é a refinaria de Bacabeira, no Maranhão, que seria a maior da América Latina. À época, em fevereiro de 2015, a estatal atribuiu o abandono à falta de parceiros e à revisão das expectativas de crescimento do mercado de combustíveis.

Após o impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT), a estatal decidiu vender parte de seus ativos, deixando de lado o interesse pelo refino e pela distribuição para focar na exploração e na produção.

Outra medida inédita, adotada em 2016, foi a instituição do chamado preço de paridade internacional (PPI): pela primeira vez desde a fundação da Petrobras, em 1953, a maior empresa estatal do Brasil tomou a decisão de igualar os preços dos combustíveis aos do mercado internacional.

A política de preços — que é determinada pelo governo federal, acionista majoritário, e não pelos acionistas privados da empresa petrolífera nacional — foi mantida pelo atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), e pelo seu ministro da Economia, Paulo Guedes.

No campo da divergência está o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), atual líder das pesquisas que medem as intenções de voto para o Planalto nas eleições deste ano.

Isso porque, caso ganhe a corrida presidencial, Lula promete reposicionar a participação da Petrobras em seus próprios ativos, em uma tentativa de mitigar os preços do gás de cozinha e dos combustíveis.

Mas até que ponto esse retorno da Petrobras para sua própria rede de ativos e refinarias pode realmente ajudar a controlar esta e outras possíveis crises dos combustíveis?

Para o vice-presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobras (Aepet), Felipe Campos Cauby Coutinho, trata-se da "volta do que ainda não saiu".

"O plano era de privatizar a Petrobras. Duas refinarias foram privatizadas, mas elas podem ser reestatizadas em um próximo governo. Os custos de exploração da Petrobras são baixos, e é possível que ela abasteça todo o mercado nacional. A Petrobras não tem monopólio no Brasil, que foi retirado pela Lei do Petróleo durante o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1997. A questão é que as companhias privadas não se interessaram em refinar o petróleo", explicou Coutinho à Sputnik Brasil.

A partir daí, ele aponta que o grande problema é o PPI.

Segundo ele, essa política arbitra os preços nas refinarias da Petrobras como se os combustíveis tivessem sido importados. É feita uma estimativa do preço pago ao refinador estrangeiro — a maioria da bacia do golfo do México, nos EUA, lembra o engenheiro.

Em seguida, adiciona-se à conta o custo do transporte, as taxas portuárias, os seguros, a margem de risco, com os lucros de toda a cadeia de importação. Dessa forma, o PPI resulta no que é cobrado pelos combustíveis vendidos nas refinarias da estatal.

A política adotada atualmente, de acordo com ele, tornou um pequeno mercado relevante, que passa a ganhar muito dinheiro e inclusive fundou a Associação Brasileira dos Importadores de Combustíveis (Abicom), a fim de fazer lobby pelo setor de importadores.

"O PPI fez com que a Petrobras perdesse 30% do mercado nacional, que foi ocupado pelo combustível dos Estados Unidos. Nossas refinarias competem com as do golfo do México. A atual política de preços da Petrobras beneficia apenas a cadeia dos importadores de combustível", aponta.

Por consequência, argumenta, a ociosidade das refinarias aumenta também em até 30% — o que acarreta a redução do processamento de petróleo e da produção de combustíveis no Brasil.

"O livre mercado como solução dos preços é um paradoxo. Quando os preços são mais baixos, a Petrobras tem plena capacidade de abastecer o mercado interno por completo, e tendo alta lucratividade, o que é melhor, em termos econômicos e políticos, para o Brasil. Desde a fundação da Petrobras o PPI nunca tinha sido praticado. Caso seja necessária, a importação é residual, porque somos autossuficientes em produção de petróleo, diesel e gasolina. Não faz sentido algum praticar essa política de preços em um país cuja capacidade de refino está só com a Petrobras. Com a revogação do PPI, a tendência natural é que você recupere o parque de refino. A própria Comperj refinaria, já que os equipamentos necessários estão lá", finaliza o engenheiro.

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