Terça, 16 de dezembro de 2014
Adriano Benayon * - 15.12.2014
1. O Brasil vive batalha decisiva de sua História: a da
sobrevivência da Petrobrás como empresa nacional. E isso com qualquer
resultado, pois a eventual derrota poderá ser o marco, a partir do qual o povo
brasileiro resolva partir para o basta e reverter o lastimável processo dos
últimos 60 anos em que praticamente só acumula derrotas do ponto de vista
estrutural.
2. Principalmente desse ponto de vista, porque, mercê da
estrutura que se formou na Era Vargas, ainda foram colhidas - por muito tempo e
até os dias de hoje - grandes vitórias em termos de desenvolvimento de
tecnologia e capacidade produtiva no País.
3. O progresso estrutural do Brasil ocorreu, até 1954,
não apenas em função de investimentos do Estado, mas também por ter este agido
como promotor da indústria privada, tendo, antes daquele ano fatídico, surgido
firmas nacionais de ótima qualidade, algumas das quais já se tinham tornado
grandes.
4. Essas foram as primeiras e grandes vítimas do modelo
de dependência financeira e tecnológica adotado desde 1955 e no quinquênio de
JK, quando o Estado, foi usado como promotor da desnacionalização da indústria,
o que gradualmente levou à da dos demais setores da economia.
5. Os governos militares (1964-1984), embora se tenham submetido
às regras e imposições do sistema financeiro mundial - criaram estatais
importantes, como a EMBRAER, em 1969, possibilitada pela criação do Centro
Técnico Aeroespacial (CTA), em 1946, e do InstitutoTecnológico de Aeronáutica (ITA), em 1950.
6. A EMBRAER foi uma das inúmeras grandes estatais
criminosamente privatizadas pela avalanche de corrupção dos anos 90, que atingiu
também a TELEBRÁS, fundada em 1972, a qual igualmente gerara excelentes
resultados em produções realizadas com tecnologia nacional, e foi
totalmente esvaziada pelas concessões entreguistas do sistema de
telecomunicações.
7. Em 1990, Collor, o primeiro presidente eleito pelo
voto direto – de resto, mediante incríveis manipulações, negadoras
da essência da democracia – encaminhou a Lei de Desestatização,
juntamente com denso pacote de legislação antibrasileira, formulado em Washington
e meteoricamente aprovado pelo complacente Congresso.
8. Interessante que os governos militares – não só
haviam mantido as estatais da Era Vargas - mas criaram várias outras.
Entretanto, os indivíduos ideologicamente amestrados atribuem comunismo
ou esquerdismo aos que, em favor do desenvolvimento, reconhecem a
importância de empresas e de bancos estatais.
9. Se não estivessem mentalmente controlados pelo
sistema de poder mundial veriam que as estatais, além do que realizam
diretamente, são fundamentais para viabilizar, ao abrir concorrências,
encomendas e financiamento a empresas privadas nacionais, que, com isso, geram
empregos qualificados e elevam o padrão tecnológico do País.
10. Ademais, acabar com as estatais significa deixar à
mercê dos carteis e grandes grupos privados o grande espaço estratégico –
como é o caso da indústria do petróleo e derivados – inevitavelmente
ocupado por empresas de grande porte, nos quais a dimensão inviabiliza a
concorrência honesta entre empresas privadas.
11. Antes de explicar por que a corrupção não é inerente
à natureza das estatais – ao contrário do que imaginam os impressionados
pelos inegáveis escândalos de corrupção que têm assolado a Petrobrás –
convém lembrar a incoerência dos que se escandalizam com a brutal concentração
de renda, cada vez mais acentuada em todo o mundo, e propõem privatizações,
cujo efeito tem sido tornar a concentração econômica ainda mais aguda e
sociamente insuportável.
12. De fato, todos estão tendo acesso a informações de
que, neste mundo de sete bilhões de habitantes, pouco mais de cinquenta grupos
financeiros controlam praticamente todas as transnacionais em atividade no
Planeta. Fosse isso pouco, o analista da moda, Thomas Piketty, tem observado
que a concentração de riqueza tem sido grandemente subestimada,
mesmo nos países sedes da oligarquia financeira mundial.
13. E por que foi implantada a corrupção na Petrobrás?
Porque a estrutura de poder político já se tornara dominada pelos interessados
em desmoralizá-la e eventualmente privatizá-la e/ou liquidá-la. Amiúde, o
primeiro passo dos agentes imperiais é minar e desmoralizar a administração
estatal, para justificar a privatização.
14 De fato, a corrupção foi intensificada durante
governos aqui instalados (Collor e FHC) com o projeto de tornar definitivo e
irreversível o atraso do Brasil e sua submissão aos centros de poder mundial,
na vil posição de fornecedor de recursos naturais, presidindo a abertura de
buracos no lugar das estupendas reservas de minerais estratégicos e preciosos,
sem que isso sequer impedisse o crescimento vertiginoso dos déficits de
comércio exterior e do endividamento público.
15. A desnacionalização predadora não começou com os dois
que foram os primeiros eleitos sob o novo regime pretensamente
democrático. Mas eles fizeram profundas reformas na estrutura de mercado
– com o usual beneplácito do Congresso - para torná-la ainda
mais talhada de acordo com os interesses dos carteis
transnacionais. E o PT não fez reverter essa tendência.
16. Em relação à Petrobrás, FHC promoveu a aprovação da
Lei 9.478, de 06.08.1997, que eliminou, na prática, a norma
constitucional do monopólio da União na produção, refino e
transporte do petróleo, não formalmente revogada.
17. Essa lei permitiu, assim, a exploração de imensas
jazidas descobertas pela Petrobrás na plataforma continental, por carteis
transnacionais, liderados pelas gigantes empresas angloamericanas - que,
há mais de um século, têm preponderado no produto de maior expressão no
comércio mundial.
18. Ademais, dita Lei criou a
Agência Nacional do Petróleo (ANP) no esquema de esvaziar a administração do
Estado, terceirizando-a para agências ditas públicas, dotadas de
autonomia e postas sob a direção de executivos e técnicos ligados à oligarquia
financeira angloamericana.
19. Um desses, genro de FHC,
David Zylberstajn, foi nomeado diretor-geral da ANP. Como lembrou o engenheiro
Pedro Celestino Pereira, em excelente artigo, teve início, sob o comando de
Zylberstajn, ”o leilão das reservas de petróleo brasileiras, em
modelo que não se aplica no mundo desde o primeiro choque do petróleo,
permitindo à concessionária apossar-se do petróleo produzido, remunerando o
Governo com royalties, ao invés de receber por prestação de
serviços.”
20. As constatações de
corrupção nas encomendas da Petrobrás - em inquérito da Polícia Federal,
ainda não terminado - estão servindo de tema para a campanha de
desestabilização e impeachment da presidente da República, e também de
argumento favorável à privatização.
21. Nenhum desses objetivos sustenta-se
em bases justificadas, pois o autor da delação premiada tornou-se diretor da
Petrobrás no governo de FHC, mentor do partido que se pretende beneficiar com a
derrubada de Dilma Roussef ou sua transformação em títere completo do capital
estrangeiro, o qual tem no PSDB seus principais serventuários locais.
22. Ademais, o delator Paulo
Roberto Costa praticou, ele mesmo, os crimes que denuncia, em
prejuízo do patrimônio público e em ofensa à moralidade da Administração, como
também cometeram políticos de diversos partidos que têm exercido cargos
diretivos na Petrobrás.
23. Paulo Metri, conselheiro
do Clube de Engenharia, reafirma ser indispensável investigação profunda
na estatal. Ressalva, porém, que a exposição antecipada de fatos
investigados pode ter tido por meta somente derrubar as intenções
de votos pró-Dilma.
24. Assinala que a presidente
não tolheu as ações da Polícia Federal, nem tem um engavetador para sumir com
os processos. Nota: alusão ao PGR de FHC, conhecido como engavetador-geral
da República.
25. Metri considera imprescindível punir, com rigor, os
agentes públicos comprovadamente corruptos e também os esquecidos corruptores.
Até porque, mais que o desvio de dinheiro, a corrupção com a Petrobrás atinge a
auto-estima de que o País precisa para realizar seu projeto nacional.
26. Em relação à Petrobrás, é fundamental corrigir os
vícios nela implantados e viabilizar seus investimentos, cuja enorme
rentabilidade está assegurada em função das colossais descobertas que a estatal
obteve na plataforma continental e no pré-sal.
27. A Petrobras – aduz Metri - tem
vencido obstáculos, como extrair, de grandes profundidades e a distâncias
da costa cada vez maiores, petróleo escondido abaixo de camadas incomuns, mercê
de tecnologias especiais desenvolvidas por técnicos da estatal.
28. A qualidade destes depende da motivação e
de que não sejam preteridos por políticos em cargos de direção nem por
terceirizados.
29. Celestino e Metri lembram que FHC elevou
desmesuradamente o salário de gerentes e superintendentes, o que os fez, por
demais, temerosos de perder seus empregos, e omissos em resistir contra
decisões suspeitas, tal como ocorre com terceirizados. Ademais, FHC liberou
a Petrobrás de cumprir a Lei de Licitações, apoiado por decisão do
ministro Gilmar Mendes, no STF.
30. Não basta para reverter o descalabro, evitar que
Dilma seja substituída por alguém mais propenso a aceitar as imposições
imperiais. Há que dar passos na restauração da soberania nacional, ferida inclusive
pela alienação, quase graciosa, de 40% das ações preferenciais da Petrobrás,
após a promulgação da Lei 9.478/1997, e pelos leilões do petróleo da plataforma
continental e do pré-sal, nos governos do PT.
* - Adriano Benayon é doutor em economia
pela Universidade de Hamburgo e autor do livro Globalização versus
Desenvolvimento.
*Texto enviado pelo autor.
*Texto enviado pelo autor.
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