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(Millôr Fernandes)

domingo, 11 de janeiro de 2015

A falta de transparência e o “rombo” nas contas do Distrito Federal

Domingo, 11 de janeiro de 2015 
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Por Aldemario Araujo Castro
Mestre em Direito
Procurador da Fazenda Nacional
Professor da Universidade Católica de Brasília
Conselheiro Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (pela OAB/DF)
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O Governador Rodrigo Rollemberg anuncia, repetidamente, um “rombo” de quase 4 (quatro) bilhões de reais nas contas do Governo do Distrito Federal (GDF). O ex-Governador Agnelo Queiroz, antes da viagem para os Estados Unidos, refutou a “acusação” de Rollemberg. Esse “rombo” seria, na linguagem popular, o termo utilizado para expressar algo como a existência de dívidas por serem pagas sem as receitas correspondentes asseguradas.
Uma das últimas “reclamações” do atual governador foi assim noticiada pela imprensa local: “Rollemberg responsabiliza a administração Agnelo Queiroz (PT), que lhe passou o cargo em 1º de janeiro com um deficit histórico, pelos atrasos nos pagamentos. 'Lamentamos essa situação deixada pelo governo anterior. É importante ressaltar que estamos pagando o salário de dezembro. E recebemos o caixa do DF com R$ 64 mil. E com uma dívida já identificada de mais de R$ 3 bilhões', justificou Rollemberg” (http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2015/01/09/interna_cidadesdf,465418/pagamento-dos-salarios-pelo-gdf-saira-primeiro-para-a-a-saude.shtml).
As declarações do Governador Rollemberg, a exemplo dessa última, são deliberadamente genéricas. Qual a natureza dessas dívidas? Qual a composição/origem dessas dívidas? Quem são os credores? Quais desses compromissos estão vencidos? Não temos um dado, uma palavra sequer, para esclarecer ou detalhar a afirmação, repetida à exaustão, acerca da existência de um “rombo” bilionário.
O Governador Rollemberg protagoniza outra sintomática “cena” de esconde-esconde. Recentemente, divulgou que recebeu somente 64 (sessenta e quatro) mil reais do governo findo (http://www.correiobraziliense.com.br/app/noticia/cidades/2015/01/05/interna_cidadesdf,464748/conta-do-gdf-tem-apenas-r-64-mil-diz-governador-rollemberg.shtml). Ocorre que nos dois últimos meses do nefasto governo Agnelo quase 5 (cinco) bilhões de reais devem ter ingressado nos cofres do Distrito Federal (essa afirmação toma como referência os valores recebidos mensalmente conforme os registros dos relatórios de execução orçamentária do próprio GDF). Como esses recursos foram gastos? Quais pagamentos foram realizados? Quem recebeu esses valores? Agora, mais precisamente a partir de 1o de janeiro de 2015, o Governador Rollemberg tem acesso privilegiado a todas essas informações. Por que Rollemberg não divulga esses dados e ajuda a responsabilizar o ex-Governador (ao menos por improbidade administrativa)? A omissão do novo governador não teria relação direta com o perfil dos gastos realizados pelo ex-governador? O “novo” não pretende repetir o “velho” em termos de gastos públicos?
Nessa linha, e neste momento, somente um nível diferenciado de transparência, prometido pelo candidato Rollemberg, mas não cumprido pelo Governador Rollemberg, poderia esclarecer a real situação financeira do Distrito Federal. Seria preciso analisar com detalhes, de preferência a cada dia, desde novembro de 2014 até os dias atuais, os fluxos financeiros (operações envolvendo diretamente dinheiro) de receitas e pagamentos (quem recebe e quanto recebe) envolvendo as contas governamentais.
A ausência de transparência, as anunciadas auditorias parciais e seletivas na folha de pagamento e na área de transportes (para reduzir remunerações e aumentar tarifas?), a origem socioeconômica de boa parte do secretariado, a construção da maioria parlamentar da forma mais “tradicional” possível, o desprezo pelos direitos humanos (extinção da subsecretaria LGBT por pressão conservadora) já sinalizam a verdadeira natureza do Governo Rollemberg. Registre-se que o financiamento eleitoral e as alianças políticas durante a campanha já apontavam para a contradição do discurso supostamente preocupado com as questões sociais e a prática vinculada aos setores mais elitistas e retrógrados da sociedade local.
Creio que a conscientização, mobilização e participação popular no âmbito do Distrito Federal, para efetivar a realização com qualidade dos direitos sociais, passa também por um esforço organizado de acompanhamento criterioso das contas públicas. O descontrole financeiro, efetivo ou simulado, total ou parcial, por ineficiência ou por motivos escusos, são poderosos instrumentos políticos a serviço de certos interesses dentro e fora do governo.